Lua narrando.
Depois de ouvir Carlos Eduardo, subi para o meu quarto e uma raiva se apoderou de mim, mas não foi só raiva, foi tristeza também. Ouvi Carlos bater na porta e gritar pedindo para entrar, respondi-o com a voz trêmula pela vontade de chorar, mas ele não desistiu e voltou a bater e eu apenas ignorei.
Depois de alguns segundos a raiva precisava ser liberada então peguei no meu abajur e o joguei no chão, provocando um barulho alto. Respirei fundo. Eu estava com raiva pelo que Carlos Eduardo disse. Mas eu sabia que estava triste também, e eu não estava brava ou triste pelo que ele me disse - a final, eu sabia que não era a normalidade em pessoa -, eu estava assim por quem me disse isso.
Carlos era meu irmão, ele sabia que eu era assim, e como irmão ele deveria aceitar. Mas eu não iria forçá-lo, não diria: "Guarde sua opinião e me aceite do jeito que sou". Aceitar-me era o que ele podia fazer. Mas se não quisesse ... Paciência. Eu ia perder uma das únicas pessoas que eu confiava e que realmente eu amava.
Ele podia estar certo, e estava, eu não queria ter amigos, e também não tinha por ser estranha, mas ele dizer isso, assim ... Como se o que eu fizesse fosse um crime... Decepcionou-me. E pela primeira vez eu chorei por causa de uma das nossas brigas.
Então, resolvi tirar um cochilo e tentar organizar meus pensamentos.
~•~
8:12 p.m
Acordei com alguém me chamando. E eu estava tão sonolenta, que nos primeiros segundos nem havia dado atenção. Até que me liguei que a porta estava trancada e alguém teria de ter aberto a mesma para estar aqui. Sentei-me e abri os olhos por completo. Dei de cara com Carlos Eduardo.
- Lua.
E assim toda a lembrança voltou a minha mente. Assim como uma vontade de chorar tomou conta de meu corpo. Logo minha visão se embaçou, provavelmente meus olhos estavam tomados pelas lágrimas, mas eu as impediria.
- Não, Carlos.
- Lua, me ...
- Eu não quero conversar.
- Lua.
- Eu não quero conversar, não agora Carlos.
- Por favor.
- Não dá.
- Lua, precisamos conversar.
- Eu não tenho nada pra falar.
- Mas eu tenho.
- Olha, eu te entendo.
- O que ?
- Eu te entendo Carlos. Um dia você ia se cansar. Ia se cansar de ouvir seus amigos e não poder concordar, ia se cansar de mim, ia se cansar do meu jeito. Eu sabia que isso ia acontecer, eu apenas não me preparei. Eu entendo e depois conversaremos.
- Lua, n...
- Não, Carlos! Depois, ok ? Depois nós conversamos.
- Não faz isso.
- Eu já estou fazendo.
Levantei-me rápido e peguei uma bolsa, onde enfiei o celular e um pouco de dinheiro que eu vinha guardando. Fiz isso em questão de segundos.
- Lua, por favor.- ele se exaltou.
Calcei meu chinelo.
- Não! Não agora, Carlos, me dá um tempo.
Eu precisava de um tempo, um tempo só meu.
Desci as escadas rapidamente e vi Kile jogado no sofá.
- Lua, c...
Não o ouvi e sai de casa rapidamente. Comecei a correr e quando me vi longe de casa diminui o ritmo. Eu precisava respirar ar puro. Eu me sentei num banquinho e senti o vento passar pelos meus braços e pernas, provocando que todos os meus pelos se arrepiassem, e provocando um arrependimento em mim - por ter saído de shorts.
Longas horas se passaram e eu apenas pensava.
10:43 p.m
Eu estava sentada no mesmo banquinho e ouvi um som da minha barriga, o que significava que eu estava com fome. Frio e fome. Resolvi começar a andar e voltar pra casa, mas na verdade eu não fazia ideia de onde estava. Comecei a andar rápido por ser tarde e eu estar na rua, mas acabei por tropeçar nos meus próprios pés e caí no chão.
Ótimo!
Olhei meu joelho e vi que o mesmo sangrava. Ele não doía muito, mas eu sentia certa ardência.
Frio, fome e machucada.
Realmente ... Não tinha como piorar.
Me levantei e voltei a andar. Ouvi um som estrondoso e percebi que vinha do céu, era um relâmpago. Ainda não chovia, então poderia dar tempo.
Trooom Trooom
Novamente ouvi o relâmpago, e depois algumas gotas já caiam no meu rosto.
Droga!
Quando eu dizia que não podia piorar, eu estava errada.
- Hey! - ouvi me chamarem.
Olhei para trás e vi um garoto, na verdade eu não o conhecia.
Ele tinha pele clara, cabelos negros arrepiados, não era possível enxergar seus olhos e estava vestido com uma calça jeans, blusa social dobrada até o cotovelo e um all star, e também segurava um guarda chuva .
- Eu te conheço? - falei quando ele se aproximou.
Meu corpo já estava encharcado e a minha roupa já grudava na minha pele, o menino veio até mim e me cobriu com o guarda chuva.
- Não, eu te vi sentada e até achei que era drogada, mas resolvi arriscar. Mikael.- ele disse com a mão estendida.
Ignorei sua mão e o olhei.
- Por que achou que eu era drogada?
- Sei lá, estava sentada ali por tanto tempo e depois levantou andando rápido e depois caiu...
Neguei com a cabeça.
- Não sou drogada, eu não sei onde estou, não sei como voltar e esqueci a m***a do guarda chuva.
- Olha, eu estou sem carro, mas posso te acompanhar.
- Espera, como sabe que eu estava aqui a faz tempo? Estava me espionando?
- Não... Quer dizer, eu estava num estabelecimento aqui perto, e de lá eu te observei.
- Isso é espionar.
- Ok! Talvez eu estivesse te espionando.
- Estou com a cabeça cheia agora, então você vai se safar de um sermão agora.
Ele deu de ombros.
- Vou aceitar sua companhia.- continuei.
E assim fomos andando, para tentar encontrar minha casa, a chuva ainda caia. Fomos conversando e descobri que Mikael tinha 18 anos, estava atrasado na escola e estudava perto da minha escola.
Biii Biii
Ouvi uma buzina e vi Kile dentro do seu carro.
Ele abriu o vidro.
- Estou te procurando há horas, entendeu ? Horas! Onde você se meteu? Quem é esse?
Olhei pra Mikael.
- Ele é um amigo do meu irmão, vou voltar com ele, quer carona?
E pareceu que todo meu lado frio havia ido embora, eu sabia que ele voltaria porque eu apenas estava sendo calma com alguém que havia me ajudado.
- Não, mas valeu. - ele tirou um bloquinho do bolso e uma caneta. - toma, depois me liga.
- Ta bom. Tchau Mikael.- estendia minha mão, mas ele me puxou e beijou o meu rosto.
Ele me deixou sem entender nada com aquela atitude íntima.