Capítulo I-Isabel Silva

1308 Words
Eu demorei meses a aceitar a volta da minha irmã, tinha tanta mágoa, tudo que eu passei com a sua ida, tornou-se ódio, para mim não havia essa coisa de empatia, mas não era diferente da minha, a vida dela, diferente de mim, acredito que Zaya nunca me olhou com julgamentos. Pelo menos, isso não parecia ter aprendido lá no Rio de Janeiro, diferente da nossa irmã n**a, que sempre fazia questão de jogar na minha cara que moro na casa de pai e mãe, além de viver do dinheiro deles, dou prejuízo ao governo. Neco também não era diferente, o que me enchia de ódio, era lembrar que eu cuidei deles, depois que Zaya foi embora. Mas a medida que cresceram, ao invés de gratidão e respeito por mim, o nome de p**a, tornou-se comum, porque sempre usei o meu batom, e de fato, queria ser como as mulheres das revistas, da televisão, não importava o meio, acreditava eu, na verdade eu sonhava com a chegada da grande reporter Gloria Maria aparecendo de repente na nossa roça e me descobrindo como uma estrela de novela. Uma grande ilusão, mas o que seria de mim, sem os meus sonhos? Nada, eu não era nada. Mas na minha mente, eu era tudo, cantava como a Angelica, me apresentava como a Xuxa e atuava como a Vera Fischer, na minha ilusória mente, não havia grandes diferenças de como ser e agir. Por isso, sempre falei alto, ria alto, e além disso, roupas chamativas por onde fosse com o real intuito de chamar atenção, nunca saberemos quando a suposta a oportunidade poderia surgir, essa oportunidade nunca veio. Com a chegada de Zaya, também não houve grande mudança, a minha vida continuou a mesma, exceto, por a cada descoberta, se tornar um barraco, para quem chegou bonita, de cabelo vermelho, casada bem pomposa, foram poucos meses para se tornar uma separada, com dois filhos, que havia se envolvido com traficante, mas isso não era o pior, para mim, havia um certo consolo, já que não era a única da família que não deu certo na vida. Pouco tempo depois, explodiu a bomba de que nosso irmão mais velho, aquele que mãe dizia que ia ser padre, era gay, tornando um abalo total. Três filhos de Maria de Cosme não prestava, aos poucos fomos nos unidos por não prestar, ser apontado sozinha é dolorido, mas em trio de certa maneira tornou-se prazeroso. Era uma quarta-feira, meio marota, quando Zaya chegou cansada da escola, deixando a bolsa de lado no sofá, soltou um suspiro pesado. — Ahh, eu tô cansada disso, sabia? — Me virei no outro sofá, olhei pra ela. — De quê maninha? — Perguntei, a casa era dela, mas era como se fosse minha. — Disso Bel, esse povinho, não tem nada nas mãos, um tostão no cu pra ter uma vida melhor, mas se acha no direito de julgar a vida dos outros, sabe. — Eu ri, mas senti medo por dentro. — Relaxa, depois... — Mas ela nem deixou eu falar. — Relaxa uma ova, eu não quero mais isso, não tô reclamando, mas eu m*l peguei o salário do mês e já foi todo, ninguém paga uma conta pra mim, mas falam da minha vida, tu não cansa disso não? — Eu já tava me ajeitando no sofá dela. — Oh Zaya, tu não me inventa de ir embora de novo daqui não. — Porque não? — Ela ia em direção a cozinha, quando voltou quase dando um tropeço nos próprios pés, a gente se encarou por um tempo, ela esperava eu dizer o porque não, e eu tive medo de contar. — Anda Bell, diz, porque não? Não aguento mais esse povo me fazendo queixa dos meus filhos, dizendo que sou vagabunda, que isso que aquilo, não. — Os meus olhos já estava cheio de lágrimas, eu tive medo, tudo voltava a minha cabeça. Pelo abrir do portão, a gente nem perguntou quem era. — É Mário! — Zaya disse, estando no corredor. — E eee que cara é essa? — Ele chegou perguntando pra ela, olhei para ele, que olhava para ela, eles sempre foram mais unidos, são os mais velhos, me lembro deles dois juntos, o doutor prudencia e dona cautela, desde que nasci, onde um tava o outro tava junto, e isso não parecia ser só com eles, Neco e n**a também são bem parecidos, pensam igual, agem também, são os mais novos, eu que sempre fui sozinha. — Esse povo Mario! m*l cheguei a dona Carminha veio me dizer pra ter cuidado com Dadai. — O que Dadai fez? — Ele perguntou, eu ainda ruminava a minha solidão de vida, Mário veio pra meu lado, quase jogando. — Eu não fiz nada. — O meu sobrinho apareceu no corredor atrás da mãe, pela cara dele, qualquer um diria que não, e talvez fosse. — Não sei, mas mesmo se não fizer, eles vão dizer, eu tô de saco cheio disso, cada dia é uma coisa, tô cansada dessa vida, desse povinho falador. — Berrou angustiada, passando pelo corredor, Adailton, a seguiu. — Mãe, calma, a senhora tá com fome? Mário se levantou pra segui-los, eu o segurei, já chorando. — Não deixa...não deixa ela ir embora. — Pedi no meio do choro, era doloroso, lembrar, imaginar ela partindo. — Oxe, Bell, porque tu tá chorando? Zaya...— Mas meu irmão se mandou atrás dela, eu não fui, era amargurante para mim pensar. Uma mulher solteira com três filhos, um namorico aqui, outro ali qualquer um queria, mas assumir, ninguém iria. Com eles dois, eu tinha apoio, como tenho agora, mamãe morreu, e meus irmãos mais novos nos expulsaram de casa, estou aqui desde então, eu m*l conseguia pensar, enquanto eles levaram uma cara na cozinha, ajeitei os meus filhos na cama, arrumei o meu canto para dormir, mas só deitei, rolei a noite inteira. Se Zaya fosse embora, o que seria de mim e Mario? Esse, apesar de ter um emprego, um come quieto, tinha seu canto, eu nem isso, eu precisava dar um jeito na minha vida. Levantei cedo, fiz o café, Adailton, meu sobrinho mais velho, se mostrava mais maduro que eu, pois ainda escovava os dentes, quando arrumou a mesa, carinhoso, eu queria que os meus fossem assim, mas meu mais velho sendo filho de quem é, isso é impossivel, pensei coando o café. — Bom dia, Bom dia! Filho, Bell. — Zaya passou para o banheiro, tomou um banho, já saiu de lá vestida. Mario também acordou, depois de se jogar no sofá, jogou água na cara, e se juntou a nós, a mesa tava silenciosa. — E ai mudou de ideia, mana? — Perguntei, o sorriso na boca, era disfarce puro, eu tremia por dentro. — Mudou de ideia de quê, Bell? — Zaya me pergunta deixando a garrafa de lado, após encher a xícara de café, ela estuda e trabalha, os olhos arroxeados não dizia, gritava, Cansaço. — De quê Bell? De vender o terreno da gente? — Mário se meteu no meio, engoli em seco, abri os olhos. — Vender? Como assim vender o terreno? É tudo que a gente tem. — Mas Zaya deu de ombro. — A gente não vai poder plantar, e se plantar não colhe com aqueles dois lá, o que tu prefere? Eu e Mário vamos vender a nossa, se tu quiser continua...— Mas seria idiotice demais para mim querer algo diferente deles, se meus irmãos quissesse ir pra o inferno, eu ia também. Mario conhecia gente interessada, mas como sempre isso também deu briga, até dentro do cartório, foi com luta que vendemos as terras, eu pensei em comprar uma casa, não ia ser como a de Zaya, mas a ideia de ter uma casa, pela primeira vez surgia.
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