}}}}}A PREPARACÃO

1356 Words
O apartamento estava cheio de vida naquela manhã. O som suave dos filhotes miando ecoava pela sala, misturando-se ao tilintar das tigelas de porcelana que Melina arrumava sobre o balcão. O aroma do café fresco se espalhava pelo ar, enlouquecendo os sentidos, enquanto o leve perfume de lavanda que ela usava aromatiza elegantemente o ambiente. Blade observava de longe, encostado na parede. Aquele quadro doméstico — tão simples, tão diferente de tudo o que ele conhecia — o desarmava completamente. Por um instante, ele esqueceu quem era: o herdeiro, o empresário e o playboy. Ali, diante dela, ele era apenas um homem tentando reaprender a viver. — Blade — chamou Melina, quebrando o silêncio com a suavidade de uma brisa. — Vem aqui. Você precisa aprender a cuidar deles também.Ele se aproximou, curioso. O som dos pequenos arranhando o cobertor os fez rir juntos, compartilhando uma alegria genuína.— Tem que limpar o pinheirinho, trocar a areia e colocar ração e água — explicou ela pacientemente, gesticulando com as mãos enquanto falava, como se cada movimento fosse uma dança delicada. A forma como ela se dedicava aos filhotes era uma expressão de amor que ele ainda estava começando a entender. — Limpar a caquinha? — perguntou, fazendo uma careta exagerada que arrancou uma risada dela, um som musical que parecia iluminar a sala ainda mais. Melina soltou uma risada que o fez estremecer. — Sim, senhor Schneider. É parte da paternidade. E a verdade é que, no fundo, é um trabalho gratificante, uma oportunidade de dar e receber amor em troca. — Então está bem — respondeu, rendido à ideia. — À noite eu cuido. Você de dia, eu à noite.— Perfeito. Assim é um lar. — Ela sorriu ao ajeitar o filhote cinza que se aninhava em sua mão, e Blade pôde ver em seu olhar uma visão de um futuro que nunca havia imaginado. Por um instante, o olhar de Blade se deteve nos gestos delicados de Melina. Como podia uma mulher tão jovem ter tanto equilíbrio? Ela não era só beleza — era calma, era propósito. A maneira como se dedicava a cada pequeno ser que envolvia em seu amor fazia com que as muralhas ao redor de seu coração começassem a ruir lentamente. — E quanto às plantas, também vou precisar cuidar? — perguntou, apenas para prolongar o momento, desejando saborear essa nova leveza que sentia ao seu lado. Melina assentiu, ainda concentrada em seu pequeno mundo de arrumações. — Sim, e no fim de semana, vou te ensinar a regar tudo. Quero montar uma horta lá na varanda, perto da piscina. Imagine poder colher nossas próprias verduras e temperos e até mesmo compartilhar isso com nossos amigos durante um jantar. — Uma horta? — ele repetiu, surpreso, a ideia parecendo um gosto novo que ele estaria experimentando pela primeira vez.— Sim, quero que o nosso lar tenha vida. Mesmo sendo um apartamento, pode ter alma. E ter uma horta seria um passo em direção a isso, transformando cada dia em um novo cuidado, uma nova dedicação. É uma forma de criar raízes, mesmo em meio à cidade.A sinceridade da resposta o atingiu como um raio silencioso. Ele se deu conta de que, pela primeira vez em anos, sentia v*****e de ficar — e não apenas de possuir. Era uma estranha sensação, como se a vida estivesse oferecendo uma nova lousa, uma nova chance para reescrever sua história. Mais tarde, no carro a caminho da clínica, o silêncio entre eles era espesso, mas não frio. Era o tipo de silêncio que se faz antes de um novo começo, uma consciência compartilhada de que a vida estava prestes a mudar para ambos. Melina olhava pela janela, o olhar distante e sonhador. — Você já pensou que daqui a um ano poderemos ter uma criança correndo pela casa? A energia dela preenchendo cada canto, o riso e o choro misturados com a música das nossas vidas? Blade a observou de soslaio, e pela primeira vez, o pensamento o assustou e o enterneceu ao mesmo tempo. — Eu nunca pensei em ser pai, Melina, — ele engoliu em seco, pesando as palavras com cuidado — talvez seja isso que me faltava para aprender o que é responsabilidade. Para descobrir o que realmente importa. Ela sorriu, olhando para fora. — Ou talvez o destino esteja te dando uma nova chance. Uma chance de vivenciar todo o amor e a vulnerabilidade que vem com isso. É uma jornada que pode ser cheia de desafios, mas também de momentos inesquecíveis. Quando chegaram à clínica, o ambiente exalava um cheiro discreto de antisséptico e flores. O som dos passos ecoava no piso de mármore, e o ar-condicionado deixava o clima artificialmente frio — uma ironia, considerando que ali nasciam sonhos quentes e humanos, um novo começo brotando em meio à aparente frieza da realidade clínica, pronta para se transformar em algo extraordinário. Após os exames, o médico explicou calmamente:— A senhora precisará iniciar o tratamento hormonal. E o senhor, suplementar a alimentação e o descanso. Daqui a quinze dias, poderemos prosseguir com a fecundação. Melina assentiu em silêncio, mas seu olhar brilhava com uma determinação silenciosa. Blade manteve o olhar fixo nela, percebendo o quanto era corajosa. Quando saíram, ele respirou fundo e confessou:— É estranho pensar que o nosso primeiro filho virá assim... tão controlado, tão científico. O que é irônico, considerando o quanto a vida às vezes se revela de formas inesperadas. — O amor não precisa de manual, Blade — respondeu ela com serenidade. — Ele só precisa de intenção. Com amor e comprometimento, a capacidade de criar um lar real e acolhedor vai além do método que escolhemos. No estacionamento, o vento frio balançou uma mecha dos cabelos de Melina. Ela ajeitou a bolsa e voltou para ele, como se estivesse à beira de uma nova ousadia.— Você quer que eu te leve em casa? — perguntou Blade, abrindo a porta do carro com um gesto gentil. — Não, obrigada. Pedi que o motorista viesse me buscar. Estou protelando o inevitável, mas ainda preciso de tempo para processar tudo isso. Ele arqueou uma sobrancelha. — Você sabe que não deve andar sozinha sem segurança, Melina. É uma cidade cheia de surpresas, boas e ruins. Cuide de si mesma, sempre. Ela sorriu, delicada, mas firme. — Eu sei me cuidar. E o motorista é de confiança. Já estivemos juntos em situações desafiadoras, e isso me ajuda a manter a calma. Blade decidiu esperar, observando o trânsito, inquieto. Quando o carro preto estacionou, ele se adiantou, abriu a porta e olhou para ela com um misto de apreensão e carinho. — Então, até mais tarde — disse, sorrindo, mesmo que seu coração estivesse pesado com a incerteza. — Cuide bem dos nossos filhos. Ela riu, uma música suave para seus ouvidos. — Pode deixar. A Tigresa e os filhotes estarão em boas mãos, enquanto for necessário. — E o jantar? — perguntou, antes que ela entrasse, com a esperança de prolongar o momento que se desenrolava entre eles. — Hoje vamos nos alimentar à la française. Uma pequena mostra do que será nossa vida, algo que eu mesma preparei com tanto carinho. Ele piscou, divertido. — Você sabe cozinhar mesmo? — Melhor do que você imagina — respondeu, confiante, como se todo o seu ser estivesse transbordando de entusiasmo. Blade soltou um riso rouco. — Então estou em boas mãos, madame Schneider. Resta saber se o seu talento vai se traduzir em algo mais além de um prato bonito. — Está mesmo. — Ela sorriu, entrou no carro e completou: — Vá trabalhar. E não se atrase. Assim poderei ser impressionante com o nosso jantar. O carro partiu, levando consigo o perfume suave de baunilha que ela deixou no ar, um rastro que se misturava à brisa fresca e ao eco de risos e promessas. Blade ficou ali, parado, com um nó no peito que misturava d****o, respeito e uma certeza silenciosa:Daquele dia em diante, nada seria igual. Uma nova jornada estava apenas começando, repleta de cor, vida e uma esperança resplandecente.
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