Kevin
A água bate na areia enquanto deslizo o pincel sobre a tela, deixando uma marca rápida e despretensiosa. Sorrio ao observar a linha meio torta e decido adicionar um pouco mais de cor, tentando dar mais vida à cena.
Definitivamente, isso não é o meu estilo habitual de pintura. Normalmente, me concentro em paisagens urbanas, algo mais abstrato, carregado de emoção e energia. Não costumo me interessar por essas cenas impressionistas de natureza, mas preciso admitir que há algo relaxante nisso.
Os outros caras ainda estão dormindo. A casa está um pouco bagunçada depois da festa de ontem à noite, mas estou bem. Não exagerei na bebida, até porque não estava exatamente interessado em terminar a noite com alguém.
Entendo por que Julian quis organizar essa competiçãozinha entre nós. Ele não consegue passar tanto tempo com os amigos quanto gostaria. Mesmo sendo podre de rico agora, o cara trabalha duro e raramente tira uma folga. Está sempre ocupado, seja negociando criptomoedas ou ajudando uma das instituições de caridade que fundou nos últimos meses.
Ele está tentando reviver um pouco dos dias de glória. Eu, por outro lado, não sinto necessidade de resgatar nada. Tento viver o momento o máximo possível, sem arrependimentos.
Exceto talvez por ontem à noite.
Eu não deveria ter me afastado de Hyle. Ela é a pessoa mais interessante que conheci em muito tempo. Uma pena que seja irmã do Julian, embora eles m*l se conheçam. Ele é superprotetor com ela, mas acho que é mais por obrigação do que por laços reais. Julian tem essa visão antiquada sobre o que significa ser um homem e um irmão, o que às vezes pode ser irritante, mas, no fundo, ele tem boas intenções.
Olho para a casa e vejo algo se movendo. A porta dos fundos desliza suavemente, e Hyle sai. O vento balança seus cabelos loiros, e ela os coloca atrás da orelha enquanto caminha em minha direção. Usa um short estampado floral e uma blusa branca com decote em V, simples, mas que nela parece algo especial.
Ela se aproxima com um pequeno sorriso, e eu sei exatamente o que está pensando. Consigo ver pelo brilho nos olhos. Isso me enlouquece, porque sei que todos os caras querem exatamente o mesmo que eu. Nenhum deles admitiu ainda, mas está na cara. Só que, ao contrário deles, eu não sou do tipo que finge não querer algo quando quer. Eu sempre corro atrás. Hyle não é exceção.
— Ei — ela diz.
— Ei, você. — Inclino a cabeça e sorrio.
— Isso está muito bom. — Ela morde o lábio e cruza os braços, analisando minha pintura.
Dou uma olhada na tela. — Está mais ou menos — digo. — Só estou brincando um pouco.
— É incrível — ela insiste. — Digo, ser capaz de criar algo assim…
Dou de ombros e abaixo o pincel. Penduro a paleta no cavalete e me sento na areia.
Hyle senta-se ao meu lado.
— Alguém já acordou? — pergunto.
— Ainda não. — Ela faz uma pausa e solta um risinho. — Acho que aquela garota dormiu com meu irmão.
— Ah, é? — Rio um pouco. — Bom para ele.
— Mas os outros ainda estão apagados.
— Estão de férias. — Dou de ombros e me inclino um pouco mais para perto dela. Ela não recua.
— Você também está — ela ressalta.
— Ah, eu sou de acordar cedo.
Ela faz uma careta brincalhona.
— Achei que artistas passassem a madrugada criando e usando drogas, dormindo o dia inteiro como vampiros criativos.
Rio disso.
— Esse é o clichê, né? Mas essa não é minha vibe.
— Você quer ser diferente — ela diz.
— Talvez. — Encaro o mar. — Só funciono melhor de manhã.
Ela sorri.
— Eu também, na verdade.
— Por isso está acordada? Trabalhando em algo?
— Na verdade, nunca durmo bem em camas estranhas.
— Nem mesmo nesta casa absurdamente chique?
Ela ri.
— Nem aqui. Sempre fui assim, desde criança.
— Imagino que você não tenha ido a muitas festas do pijama.
— Não, sempre arrumava uma desculpa.
— Eu também não.
— Sério? Por quê?
Olho para a água, vendo o sol subindo devagar.
— Minha família se mudou muito quando eu era mais novo, por causa do trabalho do meu pai — digo. — Ele era um consultor de tecnologia ou algo assim. Mas, de qualquer forma, nunca fiquei tempo suficiente para fazer muitos amigos.
— Nossa… — ela murmura. — Isso deve ter sido difícil.
— Foi. Estudei em seis escolas diferentes no ensino médio.
— Seis?
— E oito no fundamental. Melhorou um pouco conforme eu crescia.
Ela balança a cabeça, parecendo realmente sentir por mim. — Isso é horrível.
— Nós nunca nem chegávamos a desempacotar as coisas completamente. Meu pai fazia o trabalho dele e íamos para a próxima cidade. Ele ganhava bem e cuidava de nós, mas… foi complicado.
— Seus pais gostavam dessa vida?
Balanço a cabeça.
— Não sei. Acho que sim, senão por que fariam isso?
— Você perguntou a eles?
Suspiro.
— Os dois já faleceram. Minha mãe primeiro, depois meu pai.
— Sinto muito…
— Tudo bem. Talvez seja por isso que p***o. Criar algo estável. Na tela, posso fazer um lugar que nunca muda. Algo que posso chamar de lar.
Ela me observa com atenção, inclinando a cabeça.
— Essa é uma forma linda de ver a arte.
Nossos olhares se cruzam, e, por um momento, sou capturado pela cor dos olhos dela — uma mistura de verde e castanho, como se as duas cores estivessem entrelaçadas. Sem pensar, passo os dedos por seus cabelos. Ela não recua. Pelo contrário, se inclina para mim.
E então, sem hesitar, beijo-a.
O mundo some ao nosso redor. O gosto dela é quente, doce. Já beijei muitas garotas antes, mas há algo diferente em Hyle. Como se sua essência fosse pura e vibrante, uma cor ainda não misturada, ainda intocada.
Eu deveria parar. Julian me mataria. Ele é a última pessoa que eu quero machucar. Mas não consigo.
E quando finalmente nos afastamos, ela sorri, com as bochechas coradas.
— Isso foi inesperado — ela diz.
— Foi mesmo? — provoco. — Não acho que tenha sido.
— Quer dizer, eu só...
— Está tudo bem — digo, interrompendo. — Você não precisa fingir que não está interessada.
Ela pisca para mim, surpresa.
— Ok — diz.
Eu me levanto e limpo minhas mãos.
— Vou entrar e pegar um café. Quer um pouco?
— Sim — ela diz. — Isso seria bom.
Concordo e vou embora rapidamente, com o coração batendo rápido.
Não sei o que diabos aconteceu naquele momento. Ela claramente está a fim, e eu deveria ter continuado a beijá-la, mas não consegui. Acho que é o pensamento de Julian, o medo de ser pego. Corro de volta para dentro, fechando a porta de correr atrás de mim.
Kyle está de pé na cozinha, fazendo café.
— Bom dia — ele me diz.
— Kyle — digo. — Ei.
Ele sorri.
— Eu vi — ele diz antes que eu possa mencionar.
Solto um suspiro.
— Merda.
— Está tudo bem, cara. Não vou contar para o Julian. — Ele sorri um pouco. — Contanto que você não se importe quando eu a beijar.
Levanto uma sobrancelha.
— Sério?
— Eu não estava brincando ontem à noite, e acho que você também não.
Balanço a cabeça.
— Vá em frente. Se ela quiser, eu não vou atrapalhar.
Ele assente pensativamente e me serve duas canecas. Tomo um gole da minha enquanto ele prepara uma xícara para si.
Ele se vira para mim.
— Uma coisa, no entanto.
— Sim?
— E se ela quiser nos beijar?
Hesito.
— Não sei — admito. — Ao mesmo tempo?
Ele ri disso.
— p***a, não, não ao mesmo tempo. Mas em uma noite, ou um dia? Talvez.
— Não seria tão r**m assim — admito. — Tem algo nela, não tem?
— Definitivamente — ele diz. — Você sabe que nenhum dos caras ficou com ninguém ontem à noite, exceto Julian.
— Merda, essa é a primeira vez — digo, genuinamente surpreso.
— Não posso dizer com certeza, mas acho que todos estão de olho nela.
— De jeito nenhum — digo. — Quer dizer, eu sei que Chris estava observando ela… — Paro, tentando pensar.
— Matt e Dennis também — diz Kyle. — Já falei com Matt. Ele disse que está tentando ficar com ela assim que tiver uma chance.
— p***a — digo. — São cinco caras indo atrás dela. É muita competição.
— Divertido, né? — Ele sorri para mim. — Estou mais animado do que nunca. Uma pequena competição amigável nunca fez m*l a ninguém.
— Acho que não — digo, pegando as duas canecas. — Embora pareça que estou ganhando até agora.
Kyle ri e corre para me vencer até a porta.
— Boa sorte — ele diz, saindo na minha frente e fechando a porta na minha cara.
— i****a — digo, tentando desajeitadamente abrir a porta com duas canecas quentes de café.
Ainda assim, quando saio e vejo Kyle rindo com Hyle, não me sinto chateado. Se alguma coisa, me sinto feliz. Somos amigos o suficiente para que uma garota não fique entre nós, mesmo uma garota como Hyle. Só espero que Julian não fique chateado com isso, ou que possamos esconder isso dele, pelo menos. Não quero machucá-lo, mas também não consigo me impedir de ter o que preciso.
Volto para eles, com a mente acelerada, mas me sentindo bem pela primeira vez em muito tempo.