A Fazenda

Parte 5 - O acidente

Hannah era um mistério para mim, eu como advogado, sempre procurava descobrir a verdade, pesquisa tudo que podia sobre meus clientes, tudo para não houvesse nenhum imprevisto nas audiências, mas ela, boa parte de mim não queria permitir que eu pesquisasse sobre ela. Estava tão preso ao sorriso dela, ao seu olhar brilhante e alegre, sua companhia era tão confortável.

Por alguma razão, sentia que se fosse descobrir por conta própria estaria invadindo o espaço dela. m*l sabia o porque estava sendo tão gentil com ela já que quando nos conhecemos só faltou pisar em mim. A chuva não passava e nem cessava, a casa era iluminada apenas pela lareira, quando estava para subir ouvi alguns resmungos, era ela.

- Não - Hannah gritou e eu voltei correndo para sala, ela suava frio e se debatia. - Não - gritou novamente e eu segurei seus braços.

- Hannah é só um pesadelo - falei a sacudindo e ela acordou assustada. Se encolheu no sofá.

- Desculpa - sussurrou.

- Sem problema, todos temos pesadelo - sorri. - Não consegue dormir? - ela negou com a cabeça.

- Posso dormir com você? - a encarei um tanto incrédulo. - Não assim, colocamos uns travesseiros ou cobertores entre nós dois - acabei rindo em silêncio.

- Tudo bem, vamos. Já está tarde - sorri e ela retribuiu.

Subimos e ela fez exatamente o que disse que faria, fez um muro de travesseiros no meio da cama e deitou encolhida na cama, peguei mais uma coberta para ela e outra pra mim, me deitei.

- Não consegue dormir? - perguntei quando senti ela se revirar pela décima vez na cama.

- Não - resmungou. - Odeio chuva.

- Algum motivo específico? - ela ficou em silêncio e tomei como resposta. - Você e Avalon são ótimos juntos.

- Sim, ele é tudo que me restou - falou quase num sussurro. - Obrigado Tyler.

- Pelo que? - sorri mesmo sabendo que ela não veria. Era estranho que conversávamos e eu apenas encarava o teto.

- Por ser tão legal comigo. Boa noite Tyler.

- Boa noite Hannah.

O silêncio pairou sobre o ambiente, ouvíamos apenas o som da chuva lá fora, o vento forte batendo nas paredes da casa com a madeira rangendo. Por algum motivo senti uma tranquilidade, como se tudo estivesse bem e certo.

Acordei com a janela batendo, ainda chovia mas não tão forte, então levantei correndo e a fechei. Achei que Hannah não estava mais lá, caminhei para ver o lado dela e percebi que quase todos travesseiros tinham caído sobre ela e acabou a escondendo. Tomei banho e vesti uma calça jeans preta, uma blusa xadrez vermelha, calcei uma bota e coloquei um casaco, desci e minha mãe já estava fazendo café.

- Bom dia - falei sorrindo.

- Bom dia querido, e Hannah? Foi ela quem gritou ontem a noite? - sentei na mesa para tomar café.

- Sim, acho que teve um pesadelo. O que sabe sobre ela mãe? - ela me encarou curiosa e riu.

- Até ontem não tinha interesse em nem conhecer ela - eu ri e bebi o café.

- Estou curioso apenas. - ela negou com a cabeça e sorriu.

- Bom dia - Hannah estava na porta da cozinha, sorriu para nós.

- Bom dia querida - respondeu minha mãe toda alegre.

- Bom dia Hannah - respondi e terminei meu café.

- Venha tomar café - disse minha mãe e Hannah sentou-se na mesa, colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha.

- Irei ver os cavalos - falei e minha mãe apenas assentiu.

Fui para os estábulos e todos estavam bem, Avalon continuava com os machucados, mas não eram tão sérios, para descargo de consciência chamei um veterinário. A chuva já tinha parado e abriu um sol, mas continuava bastante frio.

Estava empilhando as palhas secas quando Hannah veio até o estábulo e foi ver Avalon, seus olhos brilhavam e ficaram vermelhos, como se fosse chorar.

- Acho que ele está bem, veterinário está vindo ver ele já - ela me encarou.

- O que? Não precisava ter feito isso - ela saiu da cela. Avalon aproximou da porta da cela para ficar próximo dela.

- Não gostaria de ver esse belo cavalo doente - sorri e ela assentiu.

- Tenho ele desde quando nasceu, foi primeiro cavalo que montei - ela sorriu.

- Sua avô que te ensinou? - ela negou e suspirou.

- Meu pai, eu tinha apenas 4 anos, minha mãe ficava louca com ele por querer me ensinar a montar tão cedo - ela riu. Parecia estar revivendo alguma memória. - Mas foi minha mãe quem me ensinou Trick riding e hipismo, ela era muito boa, já meu pai me ensinou a cuidar e me conectar com cavalos.

- Você é boa em Trick riding - ela me encarou e sorriu.

- Tyler me desculpa por aquele dia na loja, recém tinha voltado para cá e aconteceram muitas coisas - ela suspirou e sentou ao meu lado.

- Sem problemas moça - ela riu e eu assenti.

- Aliás, sinto muito pelo seu pai - apenas forcei um sorriso. - Bom, acho que vou para casa e volto aqui mais tarde para pegar Avalon, tudo bem?

- Pode ser, se cuida Hannah.

Ela sorriu e saiu. Pelo visto ela realmente era uma garota doce e gentil, terminei minhas coisas até o veterinário chegar. Ele examinou Avalon e deu um remédio que ajudaria a curar as feridas.

Almocei com minha mãe qual não parava de falar da Hannah, que era muito querida e muitas outras coisas que não me dei ao luxo de prestar atenção. Aproveitei para soltar o gado e as galinhas, que saíram igual bando louco correndo, Avalon já parecia estar melhor, coloquei uma corda e o levei para caminhar, parecia realmente melhor.

- Espero que não esteja pensando em roubar meu cavalo - me virei e Hannah estava subindo o pequeno morro, estava com uma calça colada, botas de montaria, um casaco grosso e usava chapéu.

- Não faria tal coisa. Seria crueldade separar vocês dois - ela sorriu e se aproximou do cavalo acariciando. - Veterinário disse que ficará bem, deu um remédio para ajudar na cura dos ferimentos.

- Obrigado, de verdade.

Ela me encarou e sorriu, seus olhos pareciam uma luz na escuridão, nos prendemos ao olhar. O vento que batia em seu rosto jogavam seus cabelos para trás, o sorriso dela era tão viciante e contagiante.

- Não precisa agradecer Hannah - sorri e ela fez Avalon caminhar em círculos.

- Ele já caminha bem.

- Vai participar da competição esse ano? De hipismo - perguntei enquanto me sentava em baixo de uma árvore.

- Não sei, quase não tenho mais praticado e … - ela parou de falar e eu encarei.

- O que foi Hannah? - ela sentou ao meu lado.

- É uma história longa e bem complicada, não é fácil pensar nisto - ela suspirou.

- Tenho tempo, mas se não quiser falar não há problema - ela me encarou e sorriu.

- Matt e eu morávamos com nossos pais em Paris, toda sexta saiamos para jantar fora juntos, era tradição. Na última sexta que os vi, enquanto voltávamos do restaurante meu pai perdeu controle do carro na estrada e colidimos com uma barreira, lembro da chuva naquele dia, só cheiro de terra molhada e da grama cortada, do vento gelado, da estranha molhada. Meus pais morreram na hora naquele dia, eu e Matt saímos ilesos, foi por isso que viemos morar com nossa avó. - ela secou as lágrimas. - Eles eram os melhores pais que podíamos ter, fomos para Paris só porque recebi a proposta de emprego, eu penso muito, e se não tivéssemos ido? Nada disso teria acontecido.

- Eu sinto muito Hannah - falei quase num sussurro. - Isso não é sua culpa, você não tem culpa de nada. Coisas acontecem porque tem que acontecer.

- É por isso que tenho pesadelos, eu fico agindo assim, como se tudo estivesse bem por causa do meu irmão, ele ficou muito m*l e se sentiu culpado pela morte dos nossos pais - ela secou as lágrimas que escorreram. - Mas isso já passou, preciso me concentrar em outra coisa e Avalon tem me ajudado, ele me faz lembrar dos melhores momentos que tinha com meus pais e isso me trás uma certa paz.

- Eu, eu nem sei oque dizer Hannah - gaguejei e ela sorriu. Levantou e foi até Avalon.

- Não precisa dizer nada, preciso ir para casa - ela riu em silêncio. Avalon de encolheu no chão e Hannah subiu, segurou suas crinas levemente, foi uma das coisas mais linda que já vi.

- Tome cuidado - sorri e ela retribuiu.

- Você também cowboy - rimos.

Ela saiu cavalgando de pressa para o lado da fazenda da sua avó. Era incrível o equilíbrio que tinha sobre o cavalo, o modo como conduzia e não havia desequilibrado em momento algum.

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