Abri a boca e um som frágil, quase um ruído sem dono, escapou de mim. Como eu poderia começar a explicar? Não era problema dele. Mas Damon Ubeli arqueou a sobrancelha escura de um jeito que parecia arrancar a verdade de dentro de mim.
— Bem… eu meio que me demiti — confessei, murchando.
— Meio que se demitiu? — ele rebateu, direto. — Você fez ou não?
Soltei um suspiro rápido, derrotado.
— Eu me demiti. Mas ainda preciso voltar, pegar meu último salário e minhas coisas.
A cena se pintou na minha mente: eu, voltando ao lugar onde tinha sido apenas mais uma, para recolher cada centavo suado das últimas seis semanas, minha mochila cheia de roupas baratas, tudo que trouxe do Kansas.
— Eu vou pegar suas coisas. — A voz dele veio firme, como se já tivesse decidido. — Você pode ficar aqui até estar melhor novamente.
— O quê? — endireitei as costas, rígida. — Não!
Droga. Outra vez soando grossa, quando esse homem só havia sido gentil comigo. Engoli em seco, tentei ajeitar a fala.
— Não, quero dizer… obrigada. É muito simpático. Mas estou bem. Vou ficar bem. Eu mesma vou pegar minhas coisas e ir para a casa da minha amiga.
Mentira. Uma amiga hipotética. Meu telefone tinha sumido — aquele cara nojento da noite anterior tinha levado — e eu não tinha memorizado os números de Europa ou Helena.
Mas os Donahues pagavam bem. Quando recebessem a metade do salário desse mês, eu teria quase mil e quinhentos dólares. Dinheiro suficiente para talvez pegar um ônibus, procurar um lugar mais barato, esconderijo contra minha mãe. A cidade grande era perfeita para isso, mas custava caro.
— Parece que você já tem tudo arrumado — disse Damon. Puxou o celular do bolso com uma fluidez quase elegante. — Vou pedir ao meu motorista que a leve aonde quiser. Sharo? Traga o carro. Você estará acompanhando a senhorita…
Ele parou, os olhos escuros fixos em mim.
— Vestian. Rose Vestian — murmurei.
— …a senhorita Vestian, onde quer que ela vá. — Ele desligou, guardando o telefone no paletó com um gesto limpo. — São nove da noite. Ficarei feliz se você descansar mais uma noite aqui e deixar as responsabilidades para o dia. O que você realmente pode resolver agora?
Apertei o tecido do vestido contra meu estômago, desconfortável.
— Oh, tudo bem. Eu sou uma coruja da noite. Meus amigos também.
Mentira. Mais uma. Eu sempre estava na cama antes mesmo do noticiário. Se ele percebeu, não apontou. Apenas inclinou a cabeça, cortês, e estendeu a mão em direção à porta.
— Sharo estará esperando quando chegar ao saguão. Posso acompanhá-la?
Pisquei, surpresa. Depois assenti. Eu nunca conheci alguém tão… cortês. Sim, essa era a palavra. Cortês como os cavaleiros dos livros que minha mãe me deixava ler, e pelos quais eu desmaiava na adolescência.
Ele ofereceu o braço. Recolhi discretamente a barra do vestido sujo para trás, agradecendo mentalmente por ter colocado ao menos a calcinha e o sutiã limpos, e aceitei. O toque dele acendeu faíscas pelo meu corpo. Uma eletricidade quente, vibrante.
A força que emanava dele era… uau. Apenas uau. Tão perto dele, fiquei quase tonta. Ele me guiou suavemente pela sala da cobertura, até o elevador. Eu nunca quis tanto que um elevador chegasse rápido… e ao mesmo tempo nunca desejei tanto que demorasse.
— Então… — arrisquei, a voz falhando num chiado ridículo. Parecia uma menininha perto dele. — O que você faz? Tipo… de emprego?
Levantei os olhos para o rosto dele. Péssima ideia. Realmente péssima ideia.
Na penumbra, vi detalhes que antes não percebi: ossos do rosto elegantes, a linha firme da mandíbula. E então, o sorriso. Escuro, triste, mas com um traço divertido. Meu fôlego travou. Literalmente esqueci como respirar.
O sorriso dele se aprofundou, revelando uma covinha, e eu recuei como se tivesse levado um choque.
— Eu possuo muitas propriedades e investimentos. — Ele estreitou os olhos. — Você está bem?
Os cílios longos e pretos dele pareciam ironia do destino. Perfeitos.
— Rose?
— Sim. Sim. Sim — respondi rápido, uma tola. Outro sorriso. Dessa vez não parecia flecha de Cupido. Parecia um soco no estômago, me esvaziando e preenchendo ao mesmo tempo com um brilho dourado.
Isso era só carência de companhia masculina? Primeira vez que chegava tão perto de um homem? Não. Não era isso. Eu não senti nada além de repulsa quando Paul tentou me beijar. Isso era Damon. Só Damon.
Ele não se mexeu. Apenas me olhou, e a intensidade me prendeu como borboleta numa placa. Quando o elevador apitou, quase pulei da pele.
O canto da boca dele subiu. Ele soltou meu braço.
— Depois de você.
Me senti uma i****a ao entrar. Esperei que ele me deixasse ali, mas não. Ele entrou também. O espaço encolheu, o ar ficou denso. Eu, dura, braços colados ao corpo, enquanto ele preenchia tudo com sua altura e largura.
O paletó dele roçou em meu braço e minha pele se arrepiou inteira. Era o mesmo tecido que me envolveu na noite passada. Nunca estive tão consciente de alguém. A eletricidade não passou; ficou zumbindo, constante, até o elevador abrir no saguão.
— Obrigada novamente — falei, tentando soar firme. — Você não tem ideia do quanto eu agradeço pelo que fez por mim. Quero dizer… — balancei a cabeça, um arrepio subindo pela espinha — não consigo imaginar o que teria acontecido se não fosse por…
Respirei fundo, cortei minha enxurrada de palavras, e apenas olhei nos olhos dele. O olhar dele me derretia por dentro, mas eu continuei:
— Apenas… obrigada.
— Tudo bem, Rose — ele murmurou.
Meu rosto queimou ao ouvir meu nome em seus lábios.
— Se precisar de alguma coisa, me procure, sim? Eu cuidarei de você.