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2379 Words
- Oi, Maddie - largo do meu monólogo interior para recepcionar minha irmã com um largo sorriso do tipo não-se-preocupe-a-maninha-está-bem. Ela pareceu não notar os cortes cobertos por curativos. - Oi. E aí, você está melhor? - A voz dela estava um tanto sem emoção. Parece que quanto mais eu tento melhorar as coisas, pior fica. - É, eu estou bem. Não estou sentindo mais nada, então... - É sério, alguém precisa me fazer parar de mentir desse jeito. É mais um para minha coleção de vícios. - Tem certeza? Você está meio pálida. Correção: ela tinha notado meus braços, sim. Ela estava apenas evitando olhar para aquela parte do cenário. Eu já devia ter imaginado. -Eu sempre fui branca, então acho que é normal. -Ahã. - É tudo o que diz. Ela passa um bom tempo calada e começo a contar quanto tempo ela vai demorar para puxar assunto comigo de novo e afastar aquele silêncio insuportável. Ela se afasta da cama e se dirige à janela, de costas para mim e de braços cruzados. Olhando de longe, ela até que se parecia comigo, muito mais do que antigamente (o que era estranho, já que ela é a cara do pai dela - no caso, meu padrasto). Apesar do problema na coluna, dava para ver que ela tinha tantas curvas quanto eu e era exatamente assim que eu ficava quando estava inquieta. Ela volta para perto de mim e começa a vomitar as palavras. Parecia que ela estava resolvendo se falava aquilo ou não. - Wilmer está indignado com você. Passou pela gente com a pior cara do mundo, dizendo que você era impossível e que parece que nunca aprende com as besteiras que você faz etc. - O silêncio de três minutos parecia ser muito mais agradável agora. - Papai quis voar no pescoço dele, mas mamãe disse para deixar para lá, que Wilmer estava falando aquilo da boca pra fora e que no fundo estava tão preocupado com você quanto o resto da família, e que não tinha culpa se ele com o tempo aprendeu a ser uma Queen D que nem você. – Pisquei confusa. - Queen of Drama, Drama Queen, interprete como quiser. Ela quis descontrair, sabe. Pena que não deu muito certo, o pai continuou fulo da vida com seu namorado. Mas claro, quem ele pensa que é para sair por aí dizendo essas coisas com você? Sinceramente, tem horas que ele é um completo ridículo. - Pelo menos dessa vez ele tem razão. - Ela arregalou os olhos depois de eu ter pensado alto. Alto demais. -VOCÊ FICOU LOUCA? - Desde quando é permitido gritar com os pacientes? Não se tem mais respeito por acamado em hospital. - A bipolaridade tá afetando sua autoestima, é? Você por acaso ouviu o que eu disse que ele falou? Demi, olha, não sei você, mas eu acho que o Wilmer ficou meio fora do juízo depois de ter te visto no banheiro naquele estado e agora aqui. E é por isso que eu acho que você não deveria levar a sério as coisas que ele anda resmungando pelos corredores do hospital. -Mas Maddie... Ai, deixa pra lá. Não vou perder meu tempo nem minha saliva com uma garota de 13 anos que pensa que tem moral comigo a ponto de berrar dentro de um hospital, dizendo que meu namorado ficou doido quando na verdade ele só está perturbado. - Minha irmã abriu a boca para replicar, mas eu mudei de assunto. Parecia meio infantil brigar com ela a essa altura do campeonato por causa de alguém que me chamou de impossível. - Espera. Ele ainda está aqui? -Está, e se quer saber, acho que ele vai acabar convencendo o resto da família de que vai ficar para dormir aqui. Eu não queria estragar a imagem de badboy que ele está exibindo pra lá e pra cá, mas acho que ele não tem coragem de te deixar aqui, não. Agora se você me der licença, irmãzinha - vamos combinar que esse vocativo foi um tanto irônico; tinha esquecido o quanto ela consegue ser irritante quando quer -, eu preciso comer, porque essa confusão toda me deu fome. - Mais um que sai sem nem me dar tchau ou um abraço ou "fique bem". Maravilhosa família, essa minha. Eu poderia ter gritado com Maddie ou qualquer coisa parecida para fazê-la voltar para o quarto e perceber que eu ainda precisava dela ali, nem que fosse para trocar olhares comigo em meio àquele silêncio interrompido apenas pelo pingar do soro, mas tudo o que fiz foi fechar meus olhos, vencida pelo cansaço. x Eu devo ter conseguido dormir de verdade depois daquela "conversa" com Maddie, porque a próxima coisa que eu vi após ter reaberto meus olhos era o médico. E meu Deus, ele era lindo.Mais que um deus grego, uma espécie de rei Sol, que atrai os olhos de qualquer um quando chega. O resultado: fiquei horas (ou seriam segundos? Para mim, isso não importava no momento) admirando a beleza do cara. Não me entendam m*l, eu amo meu namorado e não o trocaria nem pelo homem mais belo de todo o Universo (isso, é claro, se eu não estiver morrendo de amores pelo homem mais belo de todo o Universo), mas eu gosto de admirar pessoas bonitas. A beleza delas traz uma espécie de alegria para o resto do seu dia, diante de tanta coisa feia e triste que a gente vê nesse mundo - por exemplo, uma mulher jovem e saudável em observação em um hospital por causa das asnices que ela faz quando está sozinha com uma lâmina ou qualquer objeto cortante em mãos e com um monte de pensamentos suicidas passando em sua cabeça. Eu estava muito bem me perguntando aos céus e ao inferno como uma pessoa poderia ser tão bonita até ajustando o soro de uma paciente definitivamente louca. Mas isso foi até Dallas chegar no quarto e fazer seu showzinho de flerte com o médico. Só eu duvido que essa mulher seja realmente minha irmã? Quer dizer, não que eu seja totalmente introspectiva, mas também não sou tão extrovertida assim. Não me admira que o doutor tenha se mostrado um tanto assustado com ela. -Dallas, deixa o médico em paz, pelo amor de Deus. Você tem namorado! - Podem me chamar de pior irmã do mundo, X9, estraga-prazeres, mas era tudo que eu podia fazer para impedir de ver aquele cara desistir da vida e saltar pela janela. Ele era lindo demais para morrer. Pude até notar que ele olhou para mim com um ar de alívio misturado com agradecimento depois de ter ouvido minha súplica. Dallas, é claro, não se satisfez apenas em olhar para mim para certificar que eu tinha acordado. Ela praticamente voou em minha direção e começou a balbuciar coisas do tipo "pensei que você não fosse acordar nunca mais" e "você dormiu por mais de 12h". Nossa, eu realmente dormi de verdade. Mesmo. -Como assim eu dormi 12h? - perguntei, ainda incrédula. -Eu vim aqui ontem, mas você já estava dormindo. Parabéns, Bela Adormecida. Você quase mata todo mundo de susto com esse seu sono interminável. - Dei uma rápida olhada para onde estava o tal médico, mas ele não estava mais lá. Essa criatura espanta qualquer um, incrível. - Você devia ter visto o Eddie, ele quase ficou louco quando soube. Mamãe teve uma crise de choro, todo mundo pensou que você não tivesse aguentado de tanta fraqueza, mas olha só! É claro que eu não fui nessa onda. Sabia que você não ia se deixar vencer, você não é disso. É dura na queda. Puxou a mim, óbvio. - Eu devia ter continuado dormindo. Agora ela não para mais de falar. Parece que engoliu um papagaio, cruzes. Queria deixar bem claro que isso foi só o começo do falatório dela. Foi quase um sacrifício fazê-la parar de falar coisas que eu não queria saber, para perguntar o que realmente me importava depois de ela ter falado sobre como Deus e o mundo reagiram quando eu fiquei mais de 10 horas dormindo. -Dallas, me deixa falar, que merda! - De repente, ela ficou muda. Não sabia que minha voz ia soar tão alto (e tão irritada) assim. Pelo menos deu certo. - Como ele está? Ele ainda está com raiva de mim? -Ele? Ele quem? - Lancei um olhar de reprovação e cruzei os braços. Sério mesmo? Sério que ela perguntou isso? - Ah, sim, sim. Quer dizer, não, Wilmer não está com raiva de você, claro que não. De onde você tirou essa, menina? 5 Histórias 49 Seguidores -Bem, Maddie falou que depois que ele saiu daqui ele ficou dizendo coisas e... -Nossa, mas aquela menina é uma fofoqueira de primeira. Não sei a quem puxou, porque à mamãe é que não foi. Tá na hora de eu dar umas aulas a ela de como e o que contar para as pessoas. Quer dizer, não vamos esconder, mas também você não precisa saber de tudo que se passa nesse hospital, né? -DALLAS! -Tá, desculpa, saí um pouco do foco. - Um pouco. Ahã. - Na verdade, verdade mesmo, eu não posso deixar de admitir que ele ficou um pouco irritado depois da visita dele. Mas pode ficar tranquila, ele só saiu daqui para comer e para comprar umas coisas pra você. Você sabe, aquela viadagem de flores, chocolate e outras besteiras que ele te presenteia quando quer pedir desculpa. Acontece que ele ficou plantado aqui o resto do dia e você nem para mexer o dedinho. Aí ele ficou um poço de preocupação que meu Deus, eu não aguentava mais aquele homem perto de mim. Vem cá, como que você aguenta? Pra ele, tudo é oito ou oitenta. Mudou da água para o vinho. Acho que ele tá aprendendo isso com a namorada, viu. Nunca vi alguém desse jeito antes, se fosse eu... Tá, desculpa de novo. De qualquer forma, ele acabou convencendo a gente a ir para casa e passou a noite aqui. Quando eu cheguei hoje de manhã, ele me contou tudo e também não poupou o resto da família. Mas quer saber, foi bom ele ter contado isso só hoje, e não ontem de noite, tipo, por ligação ou sei lá. Até porque, isso teria tirado o sono da mãe e de Eddie, até da Maddie, talvez. - Ela fez uma pausa. Talvez tenha sido para respirar, coisa que eu acho que não dá tempo de fazer quando ela abre a matraca. Ou talvez tenha sido para eu absorver tudo, porque vinha mais por aí. Mas o que mais poderia ter acontecido? Ela puxou a única cadeira que tinha no leito para perto de mim, e foi a primeira vez que eu a vi sentada desde o momento que abri meus olhos. Ela pegou minha mão e ficou observando os curativos que começavam envolvendo o meu punho e percorriam um pouco do meu braço. Imagino que ela deve estar se lembrando de todas as vezes que ela me encontrava perambulando pela casa, com os punhos escondidos pelas pulseiras. Aproveitei que ela estava em uma espécie de transe e analisei seu rosto. Preocupada. E com olheiras. Parece que não sou só eu que gosta de mentir por aqui. Talvez isso seja mais um m*l de família. -Na verdade, Demi, acho que nem ele conseguiu dormir ontem. Juro que vi umas olheiras em volta dos olhos dele quando o encontrei. - Então era isso. Eu estou acostumada a ficar noites e noites sem dormir, mas com minha família isso é diferente. Isso não é normal para nenhum deles. Talvez essa confusão toda me alerte na próxima vez que eu pensar em me machucar. Eu já deveria saber. Não respondi nada. Dallas devia estar esperando algum comentário a respeito de tudo isso, mas tudo o que fiz foi mudar de assunto. -Mais alguém veio aqui? -Ah, você vai adorar essa. Marissa e Matt, você já sabe, eles estavam aqui quando você acordou. Nick ligou, ele disse que não vai poder vir aqui te visitar, a agenda dele com a turnê tá transbordando de cheia, mas pediu pra eu ligar quando você acordasse. Joe vem aqui amanhã. Ele disse que vai trazer a sobrinha dele para você ver. Eu até pensei que o pai dela não fosse permitir, porque trazer uma criança para um hospital é quase pedir pra ela contrair infecção hospitalar, e eu até o alertei sobre isso, mas ele disse que Kevin deixou na boa, que ele queria muito que você a conhecesse. Sinceramente, eu ainda tenho minhas dúvidas, mas quem sou eu para julgar né? Não sou mãe dela mesmo. Mas bem que eu queria, porque ela é muito fofa. Joe me mandou uma foto dela ontem, você sabe. Claro que foi pelo seu celular, já que eu não tenho o número dele no meu. Eu até te mostraria, mas não quero cortar a surpresa e, além do mais, seu celular descarregou. -Dallas, você está fazendo de novo. -É verdade. Desculpa, mas é que... Ai, a quem eu estou querendo enganar? Você sabe tão bem quanto eu que eu fico tagarela assim quando estou preocupada. Eu sei que você está bem agora e tal, mas Demi, para onde você acha que vai depois daqui? Para casa é que não. Eu nem devia te contar isso, Eddie pediu segredo e tudo, mas é que... eu só queria aproveitar o máximo de tempo que eu ainda tenho com você, entende? Antes de você voltar para lá. Você sabe, aquele lugar. A Clínica. Deu para perceber o tom de voz que ela usou ao falar. Dallas não se sentiu bem me vendo passar três meses ali na primeira vez, e não vai ser agora que ela se sentiria melhor. Todos pareciam ter pegado algum trauma dali, inclusive eu. Parecia que saber que eu estava doente a ponto de ter minha liberdade limitada por uma porção de médicos compensava o fato de que aquilo era para meu próprio bem. Não vou mentir: nem eu me sinto bem sabendo que vou ter que voltar ali de novo. Mas eu já esperava por isso, então recebi a notícia de braços abertos - pelo menos naquele momento.
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