O sino da igreja ecoou pela manhã como uma condenação disfarçada de ritual. O som cortava o ar frio e atingia as casas como um aviso sussurrado por Deus ou por seus intérpretes. Madison, envolta em seu manto escuro, observava da janela enquanto Aradita enrolava fios dourados entre os dedos, tentando ignorar o mundo que rugia lá fora.
Haviam falado de uma nova acusação.
Uma garota, vista dançando sob a luz da lua, havia sido arrastada para as masmorras, seus gritos abafados pelas preces dos puritanos. O medo se espalhava como uma febre, e em sua febre vinha a raiva contra as mulheres que ousavam existir fora do molde, que curavam sem permissão, que amavam sem bênçãos.
—Estão mais perto do que antes— sussurrou Aradita, sua voz m*l atravessando o espaço entre elas.
Madison se aproximou, segurando seu rosto com mãos de terra e sabedoria.
— Então, vamos recuar. Deixar que pensem que somos apenas sombra, fumaça... até que não possam mais nos tocar.
Naquela noite, enterraram ervas na terra ao redor da casa, cada raiz uma promessa de proteção. Desenharam símbolos nas tapeçarias, entrelaçados com os contos do velho mundo, mitos de deusas que sangravam para dar vida, de amantes que desafiavam deuses e homens.
Enquanto o fogo de acusações crescia do outro lado da vila, ali, entre gestos e feitiços ancestrais, elas se tornavam mais do que mulheres. Eram eco de uma força antiga que jamais seria apagada.
E embora soubessem que a escuridão se aproximava, o que pulsava entre suas mãos era luz. Fraca, talvez. Mas real. E isso, naquele tempo, era milagre.