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1808 Words
PARTE DOIS - Nosso inadequado Professor É aflitivo, parece que consigo sentir em mim. Estico a mão até o nariz dele para identificar se está respirando. Com o peso do ar atingindo a minha pele, logo afasto a mão. ____∞____ Na cama desde sexta-feira com tosse, nariz escorrendo e dor de cabeça. Durante esses dias fiquei pensando em planos e diversas ideias para mim e para Angus se não houvesse Hector no caminho. Provavelmente teríamos uma bela casa à beira do lago com varanda e balanço, além de um carro Toyota RAV4, igual o da minha mãe, e um ótimo emprego. Será que conseguimos entrar em uma boa faculdade ou pelo menos em alguma? Se não, eu trabalharia o dobro para pagar os estudos de Angus e futuramente pagarei os meus. Pensando assim, não parece tão difícil a vida fora daqui. Nos finais de semana sairemos para lugares que sempre tive vontade de ir e lugares que não vou desde criança. Como esquiar na neve, ir ao Tim Hortons, ir aos museus, comer no shopping, entre outras coisas. Kira acompanharia a gente em qualquer lugar, disso eu sei. Não consigo imaginar uma realidade que não tenha ela me corrigindo. Na verdade, não consigo imaginar uma realidade que não tenha ela, nem Angus e nem Walter. É tão estranho pensar estar fora daqui algum dia depois de se passar dez anos. Mas todos esses pensamentos só seriam possíveis se Hector deixasse de existir. Tenho que pensar em alguma forma de acabar com ele mesmo que ele só seja afastado do internato. Talvez poderia dar um jeito de empurrar e fazer o estado da perna piorar ou arranjar uma forma de descobrirem que ele seduz os alunos. Algo assim poderia dar fim em qualquer que seja o relacionamento que eles tenham. Bem, por outro lado, eu realmente não sei se Angus o ama tanto ao ponto de sofrer se algo acontecesse, ainda assim estou disposto a tentar algo. — Que p***a é essa, j**k? — Walter entra no quarto olhando fixamente para o meu lado do quarto. — Você destruiu o quarto com seus desenhos estranhos. Ergo a cabeça do travesseiro, baba escorre pelo canto da boca e a luz do corredor penetra meus olhos. — Dei uma cor para este quarto, tava pior antes. — Pior está agora. Olha esse desenho estranho! E este quarto está fedendo e bagunçado! — Eu vou arru… — Quando? Desde a semana passada você está falando isso. — Amanhã — passo a mão pelos cabelos e volto a deitar. Walter vai tomar banho e pouco tempo depois Kira chuta a porta e reclama do fedor sem se atrever a entrar no quarto. — j**k! — ela grita. — Vamos sair um pouco desse quarto? Sei lá, tomar um banho, dar uma caminhada. Sabe? — Vou pensar. — Ok, prometo tentar falar com Angus caso você levante, mas também precisa tomar um banho. — Walter tá no banho. — Ok, eu espero. Kira conseguiu fazer eu tomar banho e sair do quarto para correr ao redor da arquibancada em um frio de congelar o catarro do nariz. A neblina está tão intensa que m*l dá para ver a pista de corrida. — Papai ligou esta semana e convidou a gente para passar o fim do ano com ele e Kate — Kira desacelera os passos para respirar. — Disse também que parou de beber. Está em tratamento. Apenas dou um longo suspiro. Não consigo me importar com ele já há bastante tempo. Quando ele trocou a gente pela amante e jogou a gente aqui, ele deixou claro o quanto se importava com a pouca família que o restava. — Eu não me importo. Eu não quero saber nem dele e nem da amante dele. Fiz essa promessa para mamãe depois que ela morreu. — Eu sei, j**k. Em breve sairemos daqui e teremos que ser legais com eles. Não temos onde ficar e tanto a empresa quanto a casa são mais nossas do que deles — Kira desacelera os passos por um breve momento. — Se agirmos como autossuficientes e ficar demonstrando que não queremos nada vai ser exatamente o que eles irão querer. As palavras de Kira começam a parecer mais claras conforme diminuímos os passos pela pista de corrida. — Discordo, temos que agir assim. Mamãe deixou a herança para a gente e não para ele e muito menos para essa mulher. Vamos tirar tudo dele igual ele fez com a gente. — j**k! — Kira para repentinamente e sou obrigado a dar meia volta. — Se chegarmos ano que vem com esse pensamento só será mais complicado para a gente tomar o nosso lugar na casa e na empresa. O melhor é chegarmos amigáveis, sem necessariamente ser falsos, e sem ficar falando do passado. Ok? — Ok — voltamos a correr. — Calgary é uma cidade cheia de oportunidades, amigos e nossos parentes estarão lá. Então quando chegarmos não vamos estar completamente perdidos e sem apoio. Na quarta volta, avistamos Ezra e Alice se aproximando justamente na nossa direção. Ela com os cabelos vermelhos presos em um elástico, usando uma calça leg cinza e uma blusa rosa que o zíper chega até próximo dos lábios. Já Ezra de calça preta, uma camiseta azul clara e os cabelos pretos cacheados bem bagunçados. — Oi, Kira e oi, j**k — Alice abre um estonteante sorriso. — Bom dia, Alice — Kira tenta imitar o mesmo sorriso, mas eu só fico calado sem qualquer expressão. — Vocês estão na aula da Romy também? — Ezra faz um aceno com a cabeça em direção da quadra de esportes onde Romy grita alguma coisa. — Não, não estamos. Só viemos correr porque há dias j**k não saia do quarto. — Isso tem a ver com a discussão que você teve com Angus? — Alice olha diretamente dentro dos meus olhos. — Não é da sua conta — Alice fica levemente surpresa pela minha resposta. Ezra esfrega com a palma da mão a própria bochecha e tenta mudar de assunto perguntando sobre os dias de prova para Kira. — Desculpa, j**k, não foi minha intenção. Porém, naquele dia que conversamos, você e Angus pareciam… hum… Como posso dizer? — Alice leva o polegar até o lábio inferior. — Irritados. — Estávamos só com dificuldade nas atividades e… agora estamos tentando não ser ameaçados por você, quer dizer, estamos seguindo seus conselhos. Tanto Kira quanto Ezra trocam olhares sem entender nada. — Ok, vamos continuar correndo — Kira agarra meu braço e me faz se movimentar rápido o bastante até estarmos bem afastado deles. — Eu não entendo qual é da Alice. — Eu entendo. Hector está comendo Angus e ela está muito irritada sobre isso. — O que?! — os olhos de Kira saltam. — Espero que você esteja inventando isso. — Quem dera. Alice ameaçou Angus semana passada se ele não parasse de se envolver com Hector. — Eu realmente não acredito que isso esteja verdadeiramente acontecendo. É muito absurdo. E ninguém foi falar com a direção? — Não. Óbvio. Angus e Alice protegem Hector acreditando que ele os ama, mas não é verdade. — Claro que não é verdade, j**k. Ele só está usando eles. Enfim… — Kira abre a garrafa e bebe alguns goles. — Foi bom você ter me contado isso, talvez eu possa fazer alguma coisa que ajude a dar fim nisso. Kira deu mais uma volta comigo pela pista e foi embora estudar para a prova de francês que a estava perturbando há semanas pela oportunidade de poder estudar administração de negócios na Universidade de Montreal. Claro que ela é a única entre nós que pensa em se formar em alguma universidade. Sento-me na grama, um pouco afastado da pista e com os olhos voltados para a entrada do prédio do internato. Tudo está com cheiro de grama e barro molhado, além disso, está ventando tanto que não duvido de voltar chover. Ainda observando a entrada do prédio, vejo Angus sair. Levanto de imediato, mas ao ver Hector se aproximando dele volto a me sentar. Hector chega perto o bastante de Angus ao ponto de quase beijá-lo, isso faz eu fechar a mão em punho. Por um breve momento eles parecem sussurrar, no entanto, Hector agarra o braço de Angus e começa a quase a gritar com rosto extremamente próximo. A cena toda é tão rápida que eles se afastam de imediato quando alguém chega próximo. No fim, cada um seguiu para o lado oposto do campus. ____∞____ Era o dia do enterro da mãe de j**k e Kira, Layane Tanner, herdeira de uma das famílias mais ricas da província de Alberta e uma das poucas a ainda ter uma empresa de extração de petróleo próspera na província. A morte dela abalou até mesmo os acionistas que já sabiam da possibilidade. Jack chorou em cima do corpo dela até que a viessem recolher na madrugada do dia seguinte. O câncer tinha sido tão veloz e devastador que Layane parecia apenas estar dormindo, sem sinal algum de que tivesse uma doença maligna. Nos poucos dias que se seguiram após a morte, Kira gritou que odiava seu pai sempre que lembrava. A voz suave e infantil dela percorria os corredores da mansão ao ponto de se tornar assustador. “Irei me casar no final do mês,” Sardel Tanner anunciou no café da manhã da família na segunda semana após a morte de Layane. Kira e j**k apenas se mantiveram completamente quietos, ignorando a existência do pai. Entretanto ele se adiantou para falar sobre qual seria o futuro deles daqui por diante. “Colocarei vocês em um internato em Saskatchewan. A educação é boa e vocês voltarão bem mais educados e controlados. A mãe de vocês gostaria disso.” “Mamãe jamais apoiaria isso!” gritou Kira dando tapas na mesa. Jack cobriu os olhos com as mãos sentindo as lágrimas chegando. A empregada veio consolá-lo esfregando levemente a palma da mão em suas costas. “Cala a boca v********a! Você é igual a sua mãe” Sardel deu um t**a no rosto de Kira fazendo a bochecha dela avermelhar de imediato. Dessa vez as lágrimas encheram seu rosto e caíram sobre o omelete. A empregada largou j**k de lado e foi consolar Kira. Jack secou as lágrimas com a toalha de mesa e quando Sardel voltou a xingar ele e Kira. j**k agarrou o copo pesado de vidro e lançou em direção a cabeça de seu pai. O copo se estilhaçou ao atingir o nariz dele. Fragmentos de vidro chegou a cair no omelete de Kira junto as lágrimas dela. Sardel caiu no chão com o rosto escorrendo sangue e suco de laranja. Kira parou de chorar e apenas observou o pai caído ao instante que a empregada gritava por socorro desesperadamente.
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