ELEGÂNCIA DO SILÊNCIO ANTES DA TEMPESTADE

1039 Words
Lana acordou antes do despertador tocar. Ainda estava escuro lá fora, mas seu coração batia em ritmo próprio, como se soubesse que aquele dia não seria apenas mais uma segunda-feira qualquer. Levantou-se devagar, tentando não acordar Lena, que murmurava algo em sonho do outro lado do quarto. No silêncio da casa, caminhou até o banheiro e tomou um banho demorado, deixando a água quente relaxar seus músculos e aquecer os pensamentos ainda em turbilhão. Quando voltou ao quarto, já com a toalha presa no corpo, o céu começava a clarear, e uma leve brisa entrava pela janela entreaberta. Ela abriu o guarda-roupa e tirou cuidadosamente o conjunto que havia separado no sábado, quando decidiu que era hora de vestir não só roupas mais sóbrias, mas também uma nova versão de si mesma. Vestiu a saia lápis em tom masala, de corte impecável, e combinou com a blusa branca de tecido leve, o blazer do mesmo tom da saia, bem estruturado. Prendeu os cabelos em um coque elegante e firme, deixando apenas um fio solto que caía suavemente sobre a lateral do rosto. Finalizou o visual com sapatos e bolsa pretos, brincos discretos de pérola e uma maquiagem leve, apenas um batom com brilho rosado, rímel e uma sombra suave cor de champanhe. Ao se olhar no espelho, suspirou. — É hoje — murmurou para si mesma, com a sensação de que algo estava prestes a mudar. Desceu para a cozinha e encontrou a mãe preparando café. Francisco já estava sentado, lendo as notícias no celular, enquanto Nisse e Lena ainda não haviam acordado. — Bom dia, filha — disse Tereza com um sorriso, ao notar o look sofisticado. — Hoje tem reunião de diretoria? — Não... mas é uma segunda-feira importante — respondeu, servindo-se de uma xícara de café. Francisco levantou os olhos e observou a filha por um instante. — Está linda, minha menina. Estou orgulhoso de você, Lana. Ela sorriu com os olhos marejando e foi até ele, depositando um beijo em sua cabeça. — Obrigada, pai. Por tudo. Pouco depois, ela pegou o carro e saiu. O trânsito de Boston começava a se formar, mas ela foi ouvindo música leve e repetindo para si mesma que tudo ficaria bem. Na cobertura, Patrick já estava acordado havia horas. Havia malhado na academia do prédio antes do amanhecer e tomado um banho frio. Seu terno azul-marinho estava pronto sobre a cama, e o relógio marcava pouco depois das sete quando ele desceu para o carro. — Para onde, senhor MacAllister? — perguntou o motorista. — Para a sede. E depois para o setor de manutenção. Preciso conversar com o senhor Francisco — respondeu, olhando pela janela. Enquanto o carro cruzava a cidade, Patrick revisava mentalmente o que precisava fazer: falar com o pai da Lana, reunir os acionistas e diretores para um comunicado formal, e encontrar a forma mais ética e correta de lidar com o envolvimento que, agora, já não era mais apenas uma tensão — era um compromisso nascendo. --- Lana chegou na empresa pouco antes das oito. Passou pela portaria cumprimentando os colegas e subiu para o seu andar com passos firmes. Notou alguns olhares, como sempre acontecia desde que seu estilo mais elegante começara a chamar atenção, mas não deu importância. Ao chegar à sala de Patrick, foi surpreendida com uma pequena caixa sobre a mesa dela. Um laço discreto envolvia o pacote preto com detalhes dourados. Havia um bilhete escrito à mão: “Para um novo começo. – P” Ela abriu e encontrou uma caneta-tinteiro luxuosa, com o nome “Lana G. Alves” gravado discretamente na lateral. Ao lado, um pequeno frasco de tinta azul-marinho e um lenço de seda delicadamente dobrado. Ela levou a mão ao peito, tocada. — Bom dia — disse Patrick ao entrar na sala alguns minutos depois, vestindo um terno impecável e com a expressão serena. Lana se virou para ele, ainda segurando a caneta. — Isso é... é maravilhoso. Mas você não precisava... — Precisei, sim. Eu quis. E você merece. — Ele se aproximou, sem invadir seu espaço. — Eu vou resolver tudo da forma correta, como te prometi. Só preciso que confie em mim. Ela assentiu, com os olhos brilhando. — Eu confio. — Ótimo. Eu tenho uma conversa com o seu pai antes da reunião do conselho. Depois disso, se você quiser... saímos para jantar. — Eu vou querer — respondeu, com um sorriso contido. Ele sorriu de volta, e por um segundo, ambos ficaram ali, apenas se olhando, como se o resto do mundo tivesse deixado de existir. No setor de manutenção, Francisco ajeitava as ferramentas na bancada quando ouviu passos atrás de si. Virou-se e deu de cara com Patrick, impecável em seu terno, mas com um olhar respeitoso. — Bom dia, senhor Francisco. — Patrick. — O tom foi cordial, mas com a firmeza de um pai atento. — Posso falar com o senhor por alguns minutos? Francisco indicou uma sala de apoio, e os dois entraram. Patrick esperou que estivessem a sós antes de falar. — Vim até aqui como homem. Não como presidente da empresa. E como pai, imagino que o senhor me entenda. Francisco cruzou os braços. — Continue. — Eu me apaixonei pela sua filha, senhor Francisco. E não quero esconder isso. Nem colocar ela em posição delicada. Vou comunicar ao conselho da empresa hoje mesmo que estou me afastando temporariamente da supervisão direta dela. E quero pedir sua bênção para convidá-la a sair... oficialmente. O silêncio durou longos segundos. Francisco analisou o jovem à sua frente, buscando qualquer traço de jogo ou falsidade. Não encontrou. — Você sabe que a Lana é minha vida. Eu confiei essa menina a essa empresa antes mesmo dela andar. E se ela sair magoada, Patrick, quem vai ter que enfrentar um homem com sangue nordestino e honra de pai... é você. Patrick assentiu com firmeza. — Eu não a faria sofrer. Nunca. Não intencionalmente. E se um dia falhar... estarei aqui para me responsabilizar. Mas, com a sua permissão, quero tentar fazê-la feliz. Francisco respirou fundo. E então, com um leve aceno de cabeça, respondeu: — Então vá. Mas vá direito. Patrick sorriu, aliviado. — Obrigado, senhor Francisco.
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