Maris estava sentada ao lado da mãe, os olhos serenos e o espírito em harmonia. Pela primeira vez em muitos anos, ela sentia paz. Uma paz doce e acolhedora que fazia com que tudo o que tinha vivido na Terra parecesse distante… como um sonho antigo.
Ela virou o rosto para a mãe, ainda com a voz embargada de emoção.
— Mamãe... quando eu voltar... se eu voltar… eu vou lembrar de tudo isso? Das nossas conversas, do que eu estou aprendendo aqui?
A mãe sorriu com ternura, afagando os cabelos dela com carinho de quem amava com a alma.
— Minha filha... lembrar, da forma como está vivenciando agora, não. Mas tudo o que está sendo aprendido aqui não se perde. Fica gravado no seu perispírito e se manifesta aos poucos como intuição, mudança de pensamento, vontade de melhorar, de fazer diferente.
Maris abaixou os olhos, refletindo.
— Então... eu vou me sentir diferente?
— Vai. Mais leve, mais sensível. Vai sentir necessidade de mudar certas posturas, de rever escolhas. Pode não entender o porquê... mas sentirá gratidão profunda por coisas que antes não valorizava. Sentirá saudades de algo que não sabe de onde vem... mas é daqui.
Maris inspirou devagar, absorvendo as palavras. Depois, com certa hesitação, perguntou:
— E... como eu vou saber distinguir o que é meu e o que é dos outros? Porque eu... eu tenho sentido vibrações aqui. Às vezes, são suaves, como preces. Outras vezes, são como sombras pesadas. Como eu posso sentir isso da Terra?
A mãe olhou nos olhos dela, firme, amorosa.
— Porque o espírito não está limitado ao corpo, minha filha. Você está em coma, mas ainda está ligada ao seu corpo físico por um cordão fluídico. E através dele, você ainda capta as vibrações emitidas por aqueles que pensam em você. Lá embaixo, há pessoas que te amam... que oram por ti. Elas estão te ajudando a seguir esse caminho de cura. Mas também existem aqueles que ainda vibram mágoa, raiva ou inveja.
Maris arregalou os olhos.
— Eu posso sentir os dois?
— Pode. E é por isso que você precisa aprender a escolher em qual frequência vai se sintonizar. Jesus já disse: “Orai e vigiai”. Porque os pensamentos e sentimentos são correntes vivas, minha filha. E quando você voltar, mesmo que não se lembre do que vivemos aqui, sentirá o chamado interior para se alinhar ao bem. O seu coração vai te dizer onde está a paz.
A jovem mulher suspirou, emocionada. Então sussurrou:
— Eu quero me sintonizar com o amor... com a gratidão... com o perdão.
A mãe apertou sua mão com doçura e disse:
— Então você já está começando a se lembrar... mesmo antes de partir.
Maris ainda sentia os olhos marejados. Pela primeira vez em toda sua existência, ela sabia exatamente o que queria.
— Eu quero me sintonizar com o amor... com a gratidão... com o perdão — murmurou com convicção.
A mãe sorriu com ternura e respondeu, erguendo-se com leveza.
— Então vamos continuar os nossos estudos, minha filha. E você seguirá assistindo às palestras para edificar e educar o seu espírito. Esse é o caminho da cura verdadeira.
Ela estendeu a mão e, com um simples gesto de vontade, plasmar o Livro dos Espíritos, que surgiu luminoso, com energia suave e pulsante. Maris o recebeu com reverência, tocando-o como quem tocava um tesouro.
— Capítulo 11 — ela disse, abrindo o livro na seção certa, como se já soubesse.
Ela leu a próxima pergunta de Allan Kardec em voz alta, com o tom de quem realmente queria compreender:
— “Deus quis tornar o conhecimento da sua existência intuitivo para todos; por que não fez com que essa existência fosse evidente?”
Fez uma pausa, franzindo o cenho.
— Mamãe, pode me explicar?
A mãe assentiu, serena.
— Claro, meu bem. O Espírito da Verdade respondeu assim a essa pergunta:
"O homem deve conquistar a ciência do infinito. Cada coisa a seu tempo. A evidência destruiria o livre-arbítrio. Seria como obrigar o homem a crer sem exame, e sem discussão; o mérito da fé está na liberdade da escolha."
Ela fez uma breve pausa, depois explicou com carinho:
— Veja, Maris... se a existência de Deus fosse evidente a todos os olhos materiais, não haveria mérito em buscá-lo. Não haveria escolha. Seria como uma imposição. Mas Deus, em sua sabedoria, nos permite descobri-Lo com o coração, com a razão, com o livre-arbítrio. E essa descoberta tem um valor imensurável para o nosso espírito, porque ela nasce da experiência, do amadurecimento, da consciência desperta.
Maris olhou para o livro, depois para a mãe.
— Então é por isso que tantas pessoas não acreditam?
— Sim, minha filha. Uns ainda não despertaram. Outros estão buscando. E muitos têm fé cega, sem reflexão, sem entendimento. Mas os que procuram com humildade e com amor no coração… esses encontram. Deus não se impõe. Ele se revela — com paciência, com doçura, com justiça.
— E quando eu voltar… eu vou lembrar disso também?
A mãe sorriu.
— Vai lembrar com o coração. E o seu coração será sua bússola. Você será tocada pelas pequenas evidências do amor de Deus, que estão em todo lugar. E cada vez que praticar um ato de bem, cada vez que perdoar, cada vez que escolher amar… você estará reencontrando Deus dentro de você.
Maris fechou os olhos. Uma lágrima de luz escorreu por sua face.
— Eu quero ser merecedora desse reencontro.
— Então continue firme. O estudo, a prece e o serviço ao próximo são os instrumentos que despertam a alma.
Pergunta 12
Maris, com a mente ainda processando as respostas da mãe, pegou novamente o Livro dos Espíritos, ávida por mais conhecimento.
Ela olhou para a mãe com determinação e leu em voz alta:
— “Qual é o objetivo da reencarnação?”
A mãe sorriu suavemente, como quem sabia que essa seria uma questão central na jornada de Maris.
— O objetivo da reencarnação, minha filha, é o aprendizado e a evolução do espírito. Cada vida é uma oportunidade de crescer. Quando reencarnamos, temos o chance de corrigir erros do passado, de aprender virtudes e de nos aproximarmos de Deus.
Maris franziu o cenho e, com um suspiro, respondeu com um toque de dúvida na voz:
— Mãe, eu entendo isso, mas eu quero mais... quero entender mais profundamente. Se a reencarnação é sobre aprendizado e evolução, qual é o verdadeiro propósito disso tudo? Por que não é imediato? Por que precisamos passar por tantas encarnações? Eu quero compreender como tudo isso se encaixa na nossa existência.
A mãe de Maris a olhou com carinho, como se entendesse o impulso da filha em querer entender a verdade universal de forma mais profunda. Então, com um sorriso sereno, ela explicou:
— Deus nos criou simples e ignorantes, mas com um objetivo grandioso: nos tornarmos como Ele. No entanto, isso não acontece de forma instantânea. A reencarnação é uma forma de exercício espiritual. Quando você reencarna, sua alma é testada, você tem a chance de viver experiências que exigem de você escolhas, escolhas essas que moldam seu caráter e sua evolução.
Maris escutou atentamente, ainda com a expressão concentrada, e então perguntou:
— Então, mãe... cada vida é uma chance de aprender, corrigir, melhorar... mas por que tantas encarnações? Por que não podemos aprender isso mais rápido?
A mãe respirou fundo e, com uma voz suave e profunda, respondeu:
— O tempo é um conceito que não se aplica à alma da mesma forma que se aplica à matéria. Para o espírito, o tempo não é contado em anos ou décadas, mas sim em experiências vividas. Cada reencarnação é um passo no caminho da perfeição, mas a alma, assim como uma criança, precisa de tempo para aprender e amadurecer. O aprendizado é contínuo, e cada experiência tem seu papel na construção de um espírito mais evoluído.
Maris refletiu por um momento, depois pediu:
— Mãe, me explique melhor: quando nós erramos, quando falhamos, como isso nos ajuda a crescer espiritualmente? Como o erro se encaixa no processo de evolução da alma?
A mãe de Maris colocou uma mão sobre a dela, transmitindo a tranquilidade do momento, e começou a explicar com mais profundidade:
— O erro faz parte do processo de aprendizado, minha filha. A cada falha, o espírito reflete sobre suas ações e, através dessa reflexão, começa a compreender o que é certo e o que é errado. O erro, muitas vezes, nos ensina mais do que o acerto, porque ele nos força a olhar para dentro de nós mesmos e perceber onde precisamos mudar. É no erro que encontramos a oportunidade de crescer. Lembre-se, Maris, que o espírito que nunca erra não evolui.
Maris fechou os olhos por um momento, absorvendo as palavras da mãe. Ela sentia como se uma luz suave estivesse acendendo dentro dela, à medida que compreendia cada resposta que sua mãe lhe dava.
— Então, mãe... mesmo os nossos erros têm um propósito? Eles são parte do plano divino?
— Sim, querida. O erro, a dor, o sofrimento, tudo isso é parte da experiência humana, e, por isso, não devemos fugir dessas vivências, mas aproveitá-las. Deus não cria o sofrimento, mas Ele permite que passemos por ele para que possamos superar as dificuldades, amadurecer, e nos aproximar mais d'Ele. Cada vida, cada erro, cada superação, nos aproxima da perfeição divina, pouco a pouco, reencarnação após reencarnação.
Maris suspirou e disse:
— Agora, eu entendo. Então, o sofrimento não é uma punição, é uma oportunidade.
— Exatamente. E o mais importante, minha filha, é que tudo o que passamos e vivemos nos ensina algo. Cada experiência é uma oportunidade de crescimento. Não importa se o caminho é longo ou curto. O que importa é como você vive esse caminho e como escolhe aprender com ele.
Maris ficou em silêncio por um momento, permitindo que as palavras de sua mãe se aprofundassem em seu coração.
Depois, com um sorriso sereno, ela olhou para a mãe e disse:
— Eu vou aproveitar as oportunidades que me foram dadas, mãe. Vou aprender, crescer e corrigir meus erros. E, quando eu voltar para a Terra, vou buscar a evolução com humildade, aceitando cada experiência, cada erro e cada acerto.
A mãe sorriu, orgulhosa.
— Eu sei que você será uma grande trabalhadora, minha filha. Um espírito de luz.