O relógio marcava exatamente 08h12 quando Lana entrou na sala reservada do setor financeiro com Henry. A pasta nos braços estava pesada — não só pelos documentos, mas pela responsabilidade que agora ela carregava. A auditoria interna da empresa havia começado oficialmente.
Henry já estava à mesa, os óculos sobre o nariz, a caneta marcando linhas de contratos antigos.
— Bom dia, Lana. Dormiu bem?
— Mais ou menos. Acho que a cabeça já estava aqui desde ontem — respondeu com um leve sorriso, enquanto se sentava.
O ambiente estava silencioso, e pela primeira vez, ela sentiu o peso do que representava: fiscalizar um departamento de uma empresa gigantesca, em parceria com alguém exigente, e ainda sendo a mulher que agora todos sabiam que estava envolvida com o CEO.
— Vamos começar pelo segundo trimestre do ano passado. Alguns contratos de logística tiveram aumentos que não foram justificados. Quero cruzar esses dados com as planilhas de pagamento — disse Henry, passando uma pasta a ela.
Lana abriu os documentos e começou a ler. A análise era detalhada. Por um tempo, o foco dominou a sala. Nenhum dos dois falou mais do que o necessário.
Até que algo chamou a atenção de Henry.
— Estranho. Aqui consta um pagamento duplicado em março. O mesmo serviço, a mesma nota, dois lançamentos diferentes em datas muito próximas.
— Pode ter sido erro? — sugeriu ela, abrindo o sistema no computador.
— Pode. Mas tem cheiro de algo mais.
Lana franziu a testa. Procurou pela nota digitalizada. Nada.
— O arquivo digital da segunda nota não está aqui. Nem no drive, nem no servidor interno.
Henry ergueu uma sobrancelha.
— Isso é bem incomum. Documentos como esse são arquivados por padrão. Vamos deixar esse marcado. Quando o padrão começa a falhar, é porque alguém tentou encobrir algo.
Do lado de fora da sala, Shirley, secretária do Patrick, observava discretamente o entra e sai de funcionários com olhos treinados. Não era de hoje que ela percebia um certo desconforto vindo de Marcelo, o chefe do setor financeiro. Ele não gostava de ver a Lana circulando ali com pastas, muito menos de saber que ela agora tinha acesso a áreas que antes ficavam restritas a “gente grande”.
Ela se aproximou da Clara, secretária do jurídico, e cochichou:
— Já percebeu que o Marcelo está evitando passar por aqui desde cedo?
Clara assentiu, séria.
— E ontem à noite ele ficou aqui até tarde. Disse que era trabalho acumulado. Mas foi no sistema de arquivos internos... o mesmo que eles estão auditando hoje.
Shirley apertou os olhos.
— Vamos ficar de olho. A Lana não é só assistente do Patrick. Ela tá representando a integridade da empresa. E se mexerem com ela, vão mexer com a gente também.
Na sala, Henry fechou uma pasta e encarou Lana.
— Você ainda quer continuar com isso?
Ela levantou os olhos.
— Agora mais do que nunca.
Ele sorriu de canto.
— Boa respostas.
A manhã foi passando com mais lentidão do que Lana imaginava. A cada nova planilha, um novo ponto de alerta surgia. Mas não era só o conteúdo que a incomodava — era a forma como os olhares ao redor pareciam cada vez mais... cuidadosos.
— Eles estão com medo — disse Henry, enquanto digitava uma nota na planilha.
— Medo de quê?
— De você. — Ele olhou pra ela por cima dos óculos. — Medo de quem se recusa a baixar a cabeça. Medo de quem veio de baixo e agora mexe onde ninguém quer ser tocado.
Lana engoliu em seco.
— Isso não vai me parar.
Henry assentiu.
— Nem deve.
No corredor, Lena passou com uma pasta e esbarrou em Louis, que vinha em direção contrária.
— Oi, prima. Como tá a missão da sua irmã?
— Tá começando a esquentar. E a minha também. Os acessos ao sistema foram remanejados de madrugada. Recebi notificação no TI.
Louis franziu a testa.
— O que você quer dizer?
— Que alguém com permissão alta fez alteração na madrugada de domingo pra segunda. Deletaram algumas planilhas. E fizeram isso como se ninguém fosse notar.
— Isso é coisa do Marcelo. Só pode ser. Ele e o tal do Davi... aquele diretor que vive colado no Hamilton. — Louis passou a mão pelos cabelos. — Vou puxar meu próprio acesso aos logs. Não vão mexer com minha família assim.
Lena sorriu. Era engraçado ouvir “minha família” sair da boca dele. Mas ela não disse nada. O olhar de Louis era sério. Protetor. E... genuinamente irritado.
Do outro lado da empresa, Patrick saía de uma reunião com o setor de desenvolvimento quando recebeu uma mensagem de Shirley:
“Começou. Henry encontrou discrepância. E Marcelo tá agitado. Clary confirmou movimentação ontem à noite no sistema.”
Patrick apenas digitou:
“Não deixem nada sumir. Protejam a Lana.”
A guerra silenciosa estava só começando.
E quem achou que ela não estava preparada... ia descobrir que subestimar Lana Alves foi o primeiro erro fatal.