Início de um sonho

2076 Words
Quando Joaquim me disse que haveria uma pequena possibilidade de eu ter que trabalhar na mesma equipe que o Tristán, eu torci demais para que só ficasse nisso mesmo, em uma suposição, e quando os dias foram se passando e eu não tive mais informação nenhuma sobre isso, um lado meu ficou levemente aliviado. Eu sei que isso pode soar um pouco estranho, principalmente se for levar em consideração que estamos falando de um grande sonho meu, mas é que a ideia de ter que trabalhar na mesma equipe que o Tristán é pior do que qualquer coisa para mim. Eu sei que sou uma excelente profissional e que uma hora, ou outra, alguma equipe grande vai se interessar por mim. Sei que terei outras oportunidades, que não envolvem o Tristán. No fim, foi até melhor eu não ter tido mais notícias sobre isso, já que seria extremamente difícil recusar uma proposta tão incrível quanto essa. Mas teria sido muito pior ter que me submeter a um emprego onde eu teria que ficar próxima ao Tristán a todo momento. Eu tinha acabado de pisar no meu apartamento, estava me sentindo muito contente por ter passado algumas horas com a minha família, mas também me sentia exausta. Os últimos dias tinham sido uma verdadeira loucura e eu precisei me esforçar muito para convencer a todos de que estava bem para competir na minha próxima corrida, o que foi bem desgastante para mim. Já que todos ao meu redor pareciam convencidos de que eu precisaria de um tempo para descansar, mas quem disse que eu queria um tempo? Quando eu estou pilotando, eu nem sinto como se estivesse trabalhando, para mim, dirigir é como uma terapia. Me sento no meu sofá e solto um grande suspiro, jogando a minha cabeça para trás e fechando os olhos. Daqui dois dias eu teria que viajar para correr pela minha classificatória, e depois, teria a corrida em si. Eu estava animada, mas também me sentia levemente tensa. O r**m de sofrer um acidente é que depois que ele passa, a nossa mente fica com receio que aquilo se repita, sinto como se o meu corpo estivesse em alerta, apenas por pensar que eu teria que correr com o Tristán novamente. Argh! Como eu odeio aquele homem, eu já tive tantos sonhos em que eu simplesmente agarrava o seu pescoço com toda a força e via ele sofrendo, chegava a ser bizarro o quão feliz eu acordava com algo assim. Por deus, eu definitivamente não era esse tipo de pessoa, o tipo que deseja o m*l dos outros, o tipo que deseja a morte de alguém, mas para ser sincera, o Tristán é a pessoa que me fez começar a ter esse tipo de pensamento e tudo começou há um ano, quando eu ainda acreditava que as pessoas poderiam ser receptivas comigo. Flashback. Eu estava animada, estava sentindo que o meu sonho estava pronto para se tornar realidade, uma equipe tinha me notado, depois de tanto trabalho, eu finalmente tinha sido vista por alguém e agora, tinha o meu próprio carro, a minha roupa, eu tinha uma chance de crescer. Estava me sentindo tão feliz, como se mais nada pudesse me a****r. Estava pronta para ter a minha corrida de estreia, ajeitando o meu macacão, enquanto olhava admirada para cada canto, observando as equipes trabalhando nos carros, ajeitando os últimos detalhes. Eu não era a única novata, sabia que haviam outros pilotos que tinham sido recém contratados e confesso que eu estava levemente animada para conhecê-los e talvez, quem sabe, fazer amizades novas, poder compartilhar algumas vivências em comum. Já que as pessoas mais próximas a mim, não vivem nessa mesma realidade, não sabem como é a sensação de dirigir um carro em alta velocidade. Ia ser muito interessante! Um dos pilotos novatos surge e algo na postura dele, não me deixa tranquila, algo ali me passa uma sensação estranha, uma sensação muito r**m. Ele está olhando para todos os lados e parece verdadeiramente animado com o que está vendo, assim como eu estava, mas aí, seus olhos batem em mim e eu vejo um enorme desdém em seu semblante. Ah, eu conheço esse olhar! Ele começa a andar em minha direção e cada passo que ele da em minha direção, maior o sorriso em seu rosto vai ficando e em questão de segundos, ele está parado diante do meu corpo. - Não sabia que as namoradas podiam usar os macacões. – ele comenta como quem não quer nada e eu estreito os meus olhos. - Namoradas? Não entendi o que você quis dizer. – me faço de desentendida. Eu sabia muito bem o que ele estava querendo dizer, mas resolvi pelo o meu próprio bem estar, de que iria ignorar isso, vai que ele resolve ser um pouco mais sensato. - Uma garota bonita como você, vestida dessa maneira, só pode estar aqui com alguém. Só pode estar aqui com alguém? Essa foi terrível! Eu solto uma risada baixa e n**o com a cabeça. - Se você está tentando me dar uma cantada, essa foi terrível! E não, não estou aqui como namorada de ninguém, estou aqui como uma pilota. Eu vejo a sua feição se contorcer em divertimento, seus braços se cruzam e ele estala a língua no céu da boca. - Espera, eu estou ouvindo direito? Você está aqui para pilotar, um daqueles carros? – ele aponta para um dos carros e eu concordo. - Um desses, ou qualquer outro que você tenha para mim. Ele n**a em total descrença e morde o lábio levemente. - Eu poderia verbalizar todos os pensamentos que estão passando na minha mente agora, mas acho melhor dizer isso depois que eu te fazer ficar para trás, naquela pista. – aponta em direção a pista e eu sorrio. - Acho bacana você ter tanta fé no que está dizendo, porque a única coisa que eu tenho para te dizer é, isso que vamos ver. – lanço uma piscadela para ele e giro os meus calcanhares, me afastando do Sr. Arrogância em questão de segundos. - Eu não vou perder para uma mulher. – ele grita e eu me dou o trabalho de erguer o dedo do meio para ele. - Meu nome é Sophie Hill, grave ele, porque você o verá muito ainda! - grito de volta, sem sequer me virar para olhar em seu rosto. Flashback off. Spoiler: ele perdeu a corrida para mim. Eu fiquei mais de cinco posições acima dele nessa corrida e foi extremamente satisfatório poder olhar para a cara dele depois e dizer um: eu te avisei! Depois desse dia, nossos problemas apenas aumentaram, porque o olhar de desdém do Tristán foi ficando cada vez pior, junto com a sua tentativa de me ganhar sempre. E depois disso, foi ladeira abaixo, ao ponto de ser insuportável ficar no mesmo lugar que ele. Eu odiava o Tristán com toda a minha força! Ele era a definição perfeita de tudo que eu mais repudiava nessa profissão machista, a definição de todos os problemas que eu tenho por ter escolhido ser uma pilota. E mesmo depois de ter provado para ele a minha capacidade, eu ainda tenho que ouvir que sou mulher, que nunca vou ser boa o bastante para essa profissão, que ele é melhor do que eu e todo essa balela. A verdade é que ele se sente intimidado por mim, intimidado com a minha capacidade de ser um piloto 1000x vezes melhor do que ele. Sem contar que tudo o que ele “conquistou” tinha sido muito fácil. Ele veio de uma família rica, que sempre investiu financeiramente para que ele fosse bom, Tristán nunca precisou se sacrificar para estar aqui, ele teve a oportunidade na sua mão e essa, é a parte que mais me irrita. Saio dos meus devaneios quando o celular ao meu lado começa a tocar. Abro os meus olhos e agarro o aparelho, vendo o nome do Ramon, surgindo na minha tela, Ramon era a pessoa responsável por cuidar da minha carreira, ele fazia todas as negociações em meu nome. - Oi, Ramon. – digo, assim que aproximo o aparelho da minha orelha. - Oi, Sophie. Como você está? - Estou melhor! - Ótimo! Quis te deixar mais quietinha nesses últimos dias, para que pudesse se recuperar do seu acidente. Mas acho que está na hora de tratarmos de negócios. Solto um suspiro e me ajeito no sofá prontamente, porque sinto que algo importante está por vir. Ramon era o tipo de pessoa que tinha um timbre de voz muito forte e marcante, quando ele estava tratando de um assunto mais sério, sua voz ficava ainda mais grave que o normal, dando uma pontinha de tensão em quem a ouvia – talvez esse efeito dê apenas em mim. - Jogue a bomba. – falo rapidamente e ouço a sua risada do outro da linha. - Não tem bomba alguma, Sophie. Estou ligando para dar boas notícias! - Ok... – deixo a palavra se arrastar na minha boca, na medida que me mecho no estofado macio, começando a ficar ansiosa pelo que ele tem a me dizer, mesmo que uma parte minha, já saiba do que se trata. - Recebi uma ligação de um representante da Voxx Racing, parece que eles estavam observando a sua última temporada e gostaram muito do que viram. Chamaram a gente para uma reunião. Eu coloco uma das mãos sobre a minha boca e arregalo os meus olhos. Joaquim tinha me dito que havia uma grande equipe de olho em mim, mas jamais se passou na minha mente que poderia ser a Voxx, por motivos muito óbvios, os caras tinham muito renome e trabalhavam com os melhores pilotos. Não que eu não acredite que possa me encaixar nisso, mas sou uma pessoa consciente ao ponto de saber que ainda não estou nesse nível. - Espera, uma reunião? Com o pessoal da Voxx? – pergunto, depois de algum tempo em silêncio. Ramon já me conhecia o bastante para respeitar o meu silêncio de choque, todas as vezes que eu me calava, ele esperava pacientemente até a minha consciência voltar e eu conseguir formular alguma pergunta sobre o que foi dito, ou até mesmo uma reação. - Sim, Sophie. Mas ainda não temos motivos para uma comemoração, é uma reunião totalmente informal e sem promessa alguma. - Tá, então não é uma reunião, é tipo uma conversa. Ramon ri baixo. - Tipo isso. De repente, eu sou atingida pela informação que me deixou receosa com essa ligação durante os últimos dias, engulo seco na mesma hora. d***a! Preferia não ter me lembrado desse pequeno detalhe. - Ramon, você tem alguma informação sobre eles estarem de olho em outro piloto? - Não tenho essa informação, Sophie. Mas não é uma opção descartável, as equipes sempre estão de olho em mais de um piloto. Caramba, mas isso não responde a minha pergunta de forma alguma. Tenho para mim que o pessoal da equipe, sempre sabem mais do que os cabeças por trás de todas as burocracias. Joaquim sabia que eles estavam de olho em mim e no Tristán, simplesmente por ver os representantes fazendo perguntas sobre nós dois, enquanto o meu próprio empresário, não estava sabendo de nada. - Quando vai ser essa reunião? - Amanhã, bem cedo. Eu sei que vai ser difícil, mas tente dormir cedo, tudo bem? Ia ser realmente difícil controlar a minha ansiedade para esse momento e as perguntas que já estão martelando em minha mente. “O que será que eles vão dizer?” “Será que vão me perguntar sobre o meu acidente?” “Será que vou passar uma boa impressão?” Muitas perguntas e as respostas, eu só terei amanhã. - Nos vemos amanhã, Ramon. - Combinado! Vou te mandar mensagem com o endereço e o horário certinho. Até amanhã, Sophie! Feito isso, ele finaliza a ligação. Passo alguns segundos completamente parada, encarando um quadro que tinha na parede da minha sala, processando tudo o que eu acabei de ouvir. Quando a minha ficha cai, eu jogo o celular no sofá e dou um pulo, começando a pular por toda a minha sala, enquanto um sorriso vai crescendo em meu rosto. Eu fui notada por uma grande equipe! m*l posso acreditar que estou prestes a realizar o meu maior sonho! Só espero que isso não envolva o Tristán, espero que o Joaquim esteja errado.
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