CAPÍTULO 4
Narrativa do autor
Um mês se passou desde aquela noite, e Fantasma não quis mais voltar à boate. No morro, TH já notava a mudança no chefe — o olhar fechado, a fala seca, o corpo carregando um peso invisível.
Enquanto isso, na boate...
Aquela noite estava mais tensa do que o usual. Dona Leila observava, satisfeita, enquanto um segurança batia no rosto de Marília e de outra garota. Elas se recusaram a se tocar — não quiseram se beijar para satisfazer um cliente exigente.
Foram jogadas no chão, espancadas com força e arrastadas de volta para o quarto, onde dois clientes as aguardavam impacientes.
— Vocês se acham o quê, suas putas nojentas? Acham que aqui é lugar pra dar frescura?! — gritava Leila, com um sorriso c***l e os olhos de quem se alimenta da dor alheia.
Ela se aproximou de Marília, falando baixo, mas com toda a brutalidade possível:
— Sua v***a inútil, tá achando que tem direito a alguma coisa? Aqui é a minha casa, minha regra. Ou joga o jogo, ou some! Se quiser chorar, chora no seu quarto, mas ninguém vai te ajudar, sua desgraçada.
Marília segurava as lágrimas. O medo, a dor, a humilhação eram profundos demais para qualquer palavra. Ela sabia que ali, naquele lugar, não havia saída.
Na manhã seguinte, quando finalmente se olhou no espelho, sentiu um nó no estômago. No pescoço, marcas roxas denunciavam a violência da noite anterior; nos braços, arranhões profundos. Ela tocava o rosto, sentindo a pele inchada, o gosto amargo de uma humilhação que não passaria tão fácil.
Até quando? — pensou, os olhos marejados, mas a mente buscando forças onde só havia dor. A ideia de largar tudo — a boate, o dinheiro, o pouco que tinha — martelava em sua cabeça como uma lâmina fria. Mas para onde ir? Com quem contar? Ela estava sozinha, presa numa rotina que só consumia sua alma.
No quarto apertado e m*l iluminado, Marília sentou na beira da cama, abraçou os joelhos e deixou as lágrimas caírem silenciosas. O barulho da boate lá fora — o som dos copos, as vozes altas — parecia distante, como se ela já não fizesse parte daquele mundo.
Lembrava dos poucos momentos de liberdade — uma risada com uma amiga, um beijo roubado, uma noite sem violência — e se perguntava se algum dia teria isso de novo.
No morro...
FB, o gerente geral, chegou na boca com o rosto sério.
— Chefe, ontem fui lá na boate... Vi um segurança batendo na Marília e numa outra mina porque elas se recusaram a se tocar. Não quiseram nem se beijar para satisfazer os clientes — contou, com tom grave. — As duas foram jogadas no chão, espancadas, humilhadas na frente de todo mundo. Dona Leila estava rindo, curtindo o show.
Fantasma ficou em silêncio, as palavras de sss ecoando na cabeça. O desconforto que sentia há semanas se transformava em algo mais claro: não podia continuar deixando aquilo acontecer.
TH se aproximou, percebendo a mudança no chefe.
— Chefe, cê tá estranho, mano. Tá na hora de resolver esse rolo aí. Não pode deixar isso te corroer.
Fantasma olhou para ele, com expressão dura.
— Eu sei o que tá rolando. Mas a guerra não é só lá fora. É aqui dentro também.
Naquele momento, no peito de Fantasma, a chama de algo maior começava a crescer. Não só pela boate, não só por Marília, mas pelo morro inteiro, pelo que tinham virado.
De volta à boate, Marília tentava juntar os pedaços de si mesma. Pensava em um plano para sair dali, mas sabia que não era só vontade — era estratégia, força, esperança. Guardava dentro do peito uma revolta silenciosa, uma chama que, apesar de quase apagada, ainda queimava. Sabia que, se continuasse naquela vida, perderia o pouco que restava dela mesma.
O silêncio da madrugada na Rocinha era pesado. Mas, dentro dele, uma revolução começava a se formar — e Fantasma e Marília, de formas diferentes, já estavam no meio dela.
Fantasma começou a pensar mais do que podia em Marília. Seus amigos começaram a perceber que ele já não ficava com mais ninguém e não dava ousadia pra nenhuma p**a. sss fez uma pergunta que deixou Fantasma pensativo:
— Fantasma, será que você tá gostando de alguém?
Ele não respondeu, ficou sério, fechou sua sala na boca e foi pra casa. Chegando em casa, sua empregada já veio toda se querendo, mas ele deu um papo sério nela.
— Olha só, baiana, não tem como eu ficar com você aqui na minha casa. Tu tá confundindo as coisas. Naquele dia eu tinha bebido um pouco e não consegui me segurar, deu no que deu, eu te comendo em cima da mesa da cozinha. Mas não tem como você ficar se esgueirando pelos cantos da casa tentando me seduzir. Vamos fazer o seguinte: você vai pra sua casa, vou te pagar os anos que você trabalhou aqui e vou arrumar outra empregada, mais velha, pra não ter perigo de cair em tentação.
Ela olhou pra ele com a cara triste e disse:
— Que isso, Fantasma... Eu preciso do emprego, tenho que te pagar o aluguel da casa, minha filha precisa de cuidados especiais. Por favor, eu não faço mais isso. Vou esquecer o que aconteceu naquela manhã e bola pra frente.
Ele resolveu dar mais uma chance pra ela.
Naquela mesma noite, Fantasma tomou banho, se vestiu e foi pra boca. Chegando lá, estava arrumado pra sair. sss, TH e Gato iam pra boate esvaziar o saco. Fantasma se animou, mas ligou pra dona Leila mandando fechar a boate só pra ele, os amigos e mais dois vapores. Dona Leila, que gostava de dinheiro, logo ofereceu Marília, porque sabia que naquela noite ela não aguentaria mais nada e também sabia que Fantasma era exigente com as mulheres que ficavam com ele.
Cada um subiu em sua moto rumo à boate na Zona Sul. Chegando lá, a música estava ambiente, as mulheres sentadas no bar. Quando eles entraram, elas logo vieram sentar no colo dos bandidos. Mais atrás, veio ela — uma das mulheres mais bonitas que ele já tinha visto. Ele bateu na coxa pra ela vir sentar. Ela veio séria, sentou e perguntou:
— Quer beber alguma coisa?
Ele respondeu baixinho, com a voz rouca:
— Não, obrigado. O que vim fazer aqui hoje, tenho que estar sóbrio.
Ela fez uma cara de desconforto, como se tivesse sentindo alguma coisa. Fantasma percebeu e logo perguntou:
— Você está bem?
Ela respondeu, sem graça:
— Sim, estou.
Fantasma, meio sem jeito, disse olhando dentro dos olhos dela:
— Não parece.
Ela sussurrou, bem baixinho:
— Me tira daqui, por favor.
Na hora, Fantasma sentiu um aperto no peito. Falou pra ela esperar um pouco, levantou e foi em direção aos amigos, chamando cada um.
— Já escolheram a mulher que vocês querem? Se já, vamos pro motel na Barra. Já estou saindo.
A tal da Leila olhou estranho pra Marília e fechou a cara. Fantasma percebeu, mas fingiu que não viu nada.
Chegando na suíte presidencial que ele pediu, entrou e logo foi falando:
— O que tá acontecendo? Você tá sendo obrigada a trabalhar passando m*l, é isso?
Marília não respondeu e foi pro banheiro tomar banho. Ela trancou a porta. Fantasma pegou um uísque, se serviu e serviu outro copo pra Marília. Ela estava demorando no banheiro. Ele chamou:
— Tá tudo bem aí?
— Já vou. — respondeu ela.
Quando saiu do banho e foi pro quarto, apagou a luz e deitou na cama, puxando o lençol pra se cobrir. Fantasma desconfiou, acendeu a luz e puxou o lençol. Ele travou ao ver o corpo dela, todo marcado — marcas no braço, na barriga e no pescoço.
No puro ódio, perguntou:
— Quem fez isso?
Marília começou a chorar e disse:
— Foi o segurança, a mando da Leila. Porque algumas coisas eu não aceito fazer. Eles querem que eu chupe a Ágata porque sabem que nós duas não fazemos essas coisas.
Então Fantasma se encheu de ódio.
— Dorme aqui hoje. Vou sair, já volto.
Fantasma foi no quarto onde sss estava com a Ágata. Fez a pergunta baixo, pra Ágata não ouvir:
— Você viu qual foi o segurança que bateu nas meninas?
— Vi sim, patrão.
— Então vamos lá pegar ele. Passagem só de ida pro inferno.
Eles saíram, deixando elas lá, e foram em direção à boate. Botaram capacete, a capa preta que estava embaixo do banco, máscara. Quando passaram em frente à boate, lá estava ele, tranquilo, fumando cigarro com outro segurança. Fantasma e sss pararam em frente a eles, deu dois tiros no safado. O outro, eles deixaram correr.
Assim se fez justiça às meninas. Naquela noite, Fantasma só deitou ao lado dela e falou:
— Você é minha.
Continua...