— É bom ver que vocês estão felizes. — diz Ricardo, dando um abraço em Hideo. — Espero que essa nova fase conforte o seu coração.
Ricardo sabia que Hideo não admitiria, mas ele tinha visto o quanto a perda do pai o havia afetado.
— Obrigada, Ricardo.
— Já podemos começar a planejar a despedida de solteiro. — diz Aurélio com um largo sorriso.
— Vai demorar. Segundo as tradições, ele tem que esperar o luto passar. — diz Yuki com um sorriso de canto. — Ao menos um mês.
— Um mês!? Fala sério. — responde Aurélio, fazendo bico.
— Pensa pelo lado positivo: vamos ter tempo para planejar direito. — diz Charles. No mesmo instante, os olhos de Aurélio brilham com as palavras dele.
— Eu tenho ótimas ideias, e que, de preferência, ninguém apareça atirando em nós. — diz ele com um olhar sugestivo para Max.
— Não tive culpa. — diz ele, dando de ombros.
— Não os leve a sério, Mei. Sei que deve estar muito triste com tudo o que passou. — diz Oksana, se aproximando de Mei e segurando as suas mãos.
— Eu estou triste, querida, e sei que essa dor vai demorar a ir embora, mas não vou me abater a ponto de não ficar feliz por meu filho. — responde ela com um fio de voz.
— Nos desculpe por isso, senhora Shinoda. Nos empolgamos com a notícia. — diz Max, passando a mão pelos cabelos, constrangido.
— Não peça desculpas. Eu entendo.
O burburinho das conversas na sala principal começava a se dissipar. Hideo conversava com Matteo quando sentiu uma mão delicada pousar em seu braço. Era Mei.
— Filho… posso falar com você em particular? — perguntou com a voz baixa, porém firme.
Ele a olhou por um momento e assentiu. Não questionou, apenas a seguiu em silêncio pelos corredores da mansão até o escritório de Haruki — agora o seu.
O lugar ainda guardava o cheiro do incenso usado no funeral. As prateleiras estavam intocadas, e sobre a escrivaninha repousava um retrato antigo de Haruki com Mei, tirado no início do casamento. Hideo fechou a porta atrás de si e se encostou à parede, cruzando os braços.
— O que foi, mãe? — pergunta, sabendo que devia ser algo muito sério para que ela o chamasse em particular como havia feito.
Mei caminhou até a janela e ficou em silêncio por um momento, como se buscasse as palavras certas. Ela sabia que devia ter contado aquilo há muito tempo ao seu filho.
— Você nunca entendeu o motivo de ter sido prometido a Sayuri… e talvez tenha pensado que foi apenas uma decisão fria, um jogo de poder entre famílias. Mas há algo que nunca te contamos. E está na hora de você saber a verdade.
Hideo franziu o cenho, saindo da parede. As palavras de Mei acendiam um alerta em sua mente. Ele se lembrava de sua mãe dizer algo um tempo atrás, e ao que parecia, ela havia finalmente se decidido a lhe contar a verdade.
— Estou ouvindo.
Mei virou-se, os olhos marejados, mas firmes.
— Quando me casei com seu pai, não foi fácil. Muitas pessoas não me aceitavam como a esposa de Haruki. Algum tempo depois do nosso casamento, sofri um atentado. Fui sequestrada por um grupo rival que queria forçar Haruki a entregar informações da organização… ou então, me perderia.
Hideo empalideceu, sem dizer nada. Os seus punhos se fecharam com tanta força que ele pensou que poderia quebrar os dedos.
— Seu pai mobilizou todas as forças que tinha, mas quem me resgatou… quem me salvou quando ele já achava que não havia mais esperança… foi a família de Sayuri.
Ela se aproximou do filho, pousando a mão sobre o peito dele.
— O pai dela, Kyota, arriscou a própria vida para me tirar de lá. E como forma de gratidão eterna, Haruki prometeu selar um laço de sangue entre as nossas famílias — através de um casamento entre você e a filha deles.
Hideo ficou em silêncio, absorvendo cada palavra. As coisas finalmente começavam a fazer sentido. A forma como seu pai sempre se recusava a romper aquele laço… é claro que ele jamais cancelaria aquele compromisso. Ele não podia.
— E por que ninguém nunca me contou isso?
— Porque eu tinha esperança — respondeu ela, a voz embargada. — Esperança de que você se apaixonasse por Sayuri por conta própria. Que o laço entre vocês fosse feito pelo coração, e não por dever. Eu conheço você, meu filho. Sei que, se soubesse disso antes, teria aceitado o casamento por gratidão… não por escolha. E eu não queria isso pra você.
Hideo desviou o olhar, sentindo-se atingido por uma verdade maior do que esperava. Pensava estar no controle de tudo, mas havia um passado enterrado sob os alicerces que agora pisava.
— Eu não sei o que dizer…
— Apenas saiba — continuou Mei — que seu pai pode ter feito muitas escolhas duvidosas… mas essa, ele fez para proteger o que era importante. E agora está nas suas mãos decidir o que fazer com essa história.
Hideo olhou para o retrato na mesa, depois para a mãe. O seu olhar já não era o mesmo. O peso daquela revelação reescrevia anos de convicções silenciosas.
— Obrigado por confiar em mim — murmurou ele, por fim. — E obrigado por me deixar escolher.
Mei sorriu com tristeza e alívio.
— Sempre, querido.
— Eu a amo, mãe, mais do que poderia colocar em palavras. — diz ele com um sorriso de canto.
— Então o meu plano funcionou. — responde ela.
— Sim, dona Mei Shinoda, o seu plano deu certo. — diz ele, a puxando para um abraço. — Acho que, se eu não fosse tão teimoso, não teria dado certo.
— Isso eu tenho que concordar. Sempre vão te chamar de fujão, filho. — diz ela com um pequeno sorriso no rosto diante de sua piada r**m.
— Nem me lembre. Eles jamais me deixarão esquecer disso. — diz ele com um suspiro, ao pensar em seus amigos.