Os olhos de Haruki pareciam que iriam saltar das órbitas. O seu coração gelou na mesma hora ao ver o ódio brilhar nos olhos de seu filho enquanto ele ameaçava a vida do irmão.
Culpa.
A culpa o corroía por dentro como o mais forte ácido. Aquilo era o reflexo dos seus erros, e agora que as coisas tinham chegado àquele ponto, ele via isso com mais clareza. Culpa. Era tudo culpa sua, e ele não tinha como mudar aquilo.
Um filete de sangue escorre pelo pescoço de Sora quando Hideo pressiona a sua adaga com mais força. Ele olhava para o pai com olhos suplicantes e assustados, algo que Haruki jamais tinha visto em Hideo. Não importava o que acontecesse, o seu filho sempre o encarava com desafio. Mas, ao observar Sora, ele via que tinha criado um covarde, dando a ele tudo o que jamais deu a Hideo: um colo, compreensão e carinho.
Apesar de tudo o que estava acontecendo à sua volta, algo falava mais alto no peito de Haruki — o orgulho que ele tinha pelo nome que levava — e, diante de Masato, ele sabia que não poderia permitir que o seu filho o desrespeitasse daquela forma.
— Abaixe isso! Ficou louco! — diz ele com os punhos cerrados.
— Fiquei! E a culpa disso é toda sua! — grita Hideo, dando um chute no joelho de Sora e o jogando para frente.
Haruki corre e ampara o filho, ajudando-o a se levantar, e aquilo deixava Hideo com náuseas. Por vezes, ele era espancado pelo pai e apenas deixado à própria sorte com as suas feridas. Mas ali estava ele, ajudando o seu meio-irmão como se o que tinha acontecido fosse algo horrível. Um sorriso de escárnio se abre no rosto de Hideo, e uma risada descontrolada deixa a sua boca enquanto ele observava o pai.
— Você é tão patético! — cospe ele com ódio. — Espero que aproveite bem o seu bastardo, papai. Devo te parabenizar por criar um covarde.
Os olhos de Haruki se escurecem com aquelas palavras. Ele dá um passo à frente, mas as mãos de Sora o seguram.
— Ele está apenas chateado, papai. Não leve para o lado pessoal. — diz Sora com a cabeça baixa.
— Olhe para você, machucado e ainda defende esse rebelde! — grita Haruki.
— Continue agindo assim, pai, e não vai nem sentir quando ele te esfaquear pelas costas. — diz Hideo.
Hideo podia ignorar o que o seu pai fazia, mas ele não era burro e investigava cada passo que o seu meio-irmão dava. Sempre soube que aquela aparência frágil dele era apenas isso: aparência. Sora não era o que parecia.
— Chega! — grita Haruki, fervendo de raiva com o desrespeito do filho. — Shiro! Venha aqui!
Rapidamente, o líder dos soldados de Haruki se aproxima, fazendo uma reverência.
— Senhor. — diz ele de forma respeitosa, com os olhos baixos.
— Leve Hideo. Já sabe o que fazer, e que desta vez seja dez vezes pior que a anterior. — Os olhos de Haruki estavam fixos em Hideo enquanto falava, mas, diferente do que ele esperava, o seu filho não esperneou nem gritou, apenas riu das suas palavras.
— Não quer colocar uma bala na minha cabeça, pai? Vai te poupar tempo. — diz ele de forma debochada.
— Senhor? — chama Shiro. — Por favor, deixe esta vez passar.
Os olhos de Haruki se viram rapidamente para o soldado à sua frente, mas ele mantinha os olhos no chão enquanto permanecia inclinado em sua reverência diante dele.
— Está questionando a minha ordem?! — diz Haruki.
— Jamais, senhor. Mas esta é uma situação diferente, então me atrevo a fazer esse pedido. — diz ele, ajoelhando-se aos pés de Haruki com o rosto no chão. — Deixe passar, senhor, apenas desta vez.
Haruki trava em seu lugar ao ver aquilo, o seu coração estremece, mas quando os seus olhos encontram os de Masato, ele volta a si na mesma hora.
— Ele que pensasse nisso antes de me desafiar na frente dos outros. — diz Haruki de forma indiferente.
— Venha, Shiro. — diz Hideo, se aproximando e erguendo o soldado pelos braços. — Ele não merece o seu respeito.
Com essas palavras, Hideo se vira e acompanha o soldado até o carro que estava ali.
Haruki jamais admitiria o quanto as palavras do filho lhe doíam. Ninguém veria aquele lado dele enquanto ele vivesse, e, em sua mente, ele apenas cuidava de discipliná-lo por seu mau comportamento.
— Vamos ao que interessa. — diz Haruki, virando-se para Masato.
— Claro, prossiga no que dizia. — diz ele com escárnio, o que não passou despercebido a Haruki.
— Você tocou em alguém sob a proteção da Yakuza, e antes que negue novamente, tenho provas. Então vai responder por isso de acordo com as nossas regras. — diz ele, observando os olhos de Masato escurecerem.
— O que está dizendo? Se esqueceu que você também tem parte dos lucros com as minhas cargas, Haruki? — diz ele com o maxilar trincado.
— Está questionando as minhas decisões, Masato? Se esqueceu de quem é o líder por aqui? — diz, dando um passo em direção a Masato. Ele recua diante do olhar de Haruki.
Masato podia ter negócios com Haruki, mas sabia bem o seu lugar e não ousaria desafiá-lo daquela forma.
— Não foi o que eu quis dizer. — diz ele, abaixando a cabeça com raiva.
— Sempre deixei bem claro o que aconteceria com quem ousasse tocar em Sayuri, e você sabia disso. Então escolha: a morte ou a punição por seus erros. — diz ele, sem deixar brechas para questionamentos.
Masato sabia o que isso significava, e por mais que a sua raiva o dominasse, não havia nada que ele pudesse fazer. Ao olhar para o lado, vê os soldados de Haruki o cercando. Estava sem saída.
— Eu aceito a minha punição, senhor. — diz, ajoelhando-se e retirando a camisa. Um soldado se aproxima e entrega um chicote com pontas de ferro a Haruki.
— Você cuidará da punição dele, Sora. E não seja misericordioso. Masato quebrou as regras e precisa pagar de forma adequada pelo que fez. Apenas assim ele recuperará a sua honra diante da família. — diz ele, entregando o chicote nas mãos de Sora.
— Sim, papai. — diz ele, pegando o chicote e se aproximando de Masato.
— Sessenta chicotadas por sua audácia, Masato. E na próxima vez será a morte.
— Eu aceito. — diz ele, apenas com a cabeça baixa.