O carro preto desliza pelas ruas movimentadas, refletindo o sol da tarde nos vidros escurecidos. Henrique dirige em silêncio, os olhos fixos na estrada. No banco de trás, Virgínia está reclinada, mexendo no celular, mas atenta a seu novo segurança.
— Você sempre dirige assim, calado? — pergunta ela, sem levantar os olhos.
— Estou trabalhando, senhorita. — responde Henrique, voz neutra.
Ela solta uma risada leve.
— Trabalhando? Parece mais um robô programado pra ignorar conversas.
Henrique não reage. Continua focado no trânsito.
Ela o observa pelo espelho interno, intrigada com a frieza dele. Está acostumada a seguranças que tentam puxar assunto, bajular, rir de tudo o que ela diz. Mas aquele ali... parecia feito de pedra.
Ela não podia deixar de notar sua cicatriz na lateral do rosto, o que a deixa curiosa, quais serviços ele fez antes de ser seu segurança ? Por que seu pai confiou nele ? Por que ele tinha aquela cicatriz que ao invés de deixá-lo feio, o deixava ainda mais atraente para ela, com um ar misterioso, poderoso, amedrontador.
Quando chegam ao shopping, Henrique estaciona o carro e sai primeiro, fazendo uma rápida varredura com o olhar antes de abrir a porta para ela. Virgínia ajeita os óculos escuros, segura a bolsa e desce com um ar de rainha entediada.
— Relaxa, ninguém aqui vai me sequestrar.— diz ela, andando à frente.
Henrique a acompanha de perto, sempre um passo atrás, calado, ela percebe.
— Você é sempre assim paranoico ou é seu charme profissional?
Henrique ignora o comentário, seguindo firme. Ela sorri, provocada.
Enquanto caminham pelos corredores do shopping, as pessoas os observam ela, linda e confiante; ele, imponente e discreto, vestindo preto, o olhar sempre atento.
Virgínia entra em uma loja de grife e começa a provar roupas. Henrique permanece do lado de fora, braços cruzados, observando o movimento.
Depois de um tempo, ela sai do provador com um vestido azul e pergunta:
— E aí, o que acha?
Henrique mantém o olhar neutro, mas por dentro não consegue deixar de reparar na beleza de Virgínia.
— Não sou o público-alvo pra opinar, senhorita, estou trabalhando.
— Quer dizer que não tem opinião?
— Quer dizer que não estou aqui pra isso.
Ela dá um sorriso de canto, avaliando o desafio.
— Você é difícil, hein. Achei que todos os seguranças do meu pai fossem uns cachorrinhos adestrados.
Henrique não mexe um músculo sequer, continua neutro com um olhar vazio.
— Eu respondo a seu pai, não a você, senhorita.
Virgínia o encara, surpresa pela ousadia. Depois sorri um sorriso genuíno, divertido.
— Você é mais interessante do que deixa transparecer, Henrique.
Ele desvia o olhar, sério.
— Minha função é garantir que volte pra casa em segurança. Só isso.
— E se eu disser que quero ir embora sozinha?
— Não vai.
Virgínia dá uma risada curta e balança a cabeça.
— Você realmente leva isso a sério, não é?
— Sou pago pra isso.
Ela se aproxima um passo, os olhos azuis faiscando de curiosidade e desafio.
— E se eu disser que quero te conhecer melhor?
Henrique encara os olhos azuis brilhantes dela por alguns segundos, depois responde com frieza:
— Não tenho interesse.
O silêncio paira entre os dois. Virgínia o observa, tentando decifrar aquele muro de gelo que ele parece carregar. Depois dá de ombros, fingindo indiferença.
— Tudo bem, Henrique. Vamos ver até quando você aguenta ser o cara certinho.
Ela entra de volta no provador o som dos saltos ecoando no piso de mármore. Henrique observa por um momento, firme, impassível mas por dentro, já sente que o verdadeiro perigo da missão não são os inimigos de Antônio, e sim a filha que ele jurou proteger.