A Filha de Dracus

 — Vivien, preciso de você em minha sala, em dois minutos. — me diz o prefeito de Vama Veche, meu chefe há quase um mês.  — Sim, senhor Cracium.  — Você é educada demais, sabia disso? — ele sorri. — Eu tive muito medo de te contratar, mas você prova, a cada dia, que eu estava errado. Te aguardo em minha sala. Ele atravessa o hall de entrada, onde fica a minha mesa, e entra em sua sala. Adam Cracium tem seus trinta e poucos anos e, assim como o meu pai, perdeu a esposa num parto. Mas, ao contrário do meu pai, o filho dele morreu no parto, com a esposa. Não sei o que meu pai fez com a criança, ou se realmente não morreu, nunca entrei em detalhes com ele sobre isso. Me levanto e pego dois blocos de anotações e um lápis de escrever, então caminho para a sala de Adam. Bato levemente na porta, para ele saber que estou entrando, e o encontro olhando pela janela. Não faz muito tempo que sua esposa morreu, e ele sente a sua falta. Seu olhar triste demonstra isso.  — Vivien, preciso de uma reunião com Iancu Bucur. Se puder ser ainda essa semana, é melhor. — ele fala ainda de costas, depois se vira, caminha até sua mesa e se encosta nela. — Também preciso que você faça a conferência do material para a construção da escola no campo rural, perto da fazenda de Iancu. Ele pode te ajudar a fazer isso, e é um cavalheiro. Sei que muitas mulheres têm sofrido com o comportamento inadequado de certos indivíduos… o que me lembra que preciso falar com o chefe de polícia local. Marque uma reunião com ele também, por favor.  — Para essa semana também? — pergunto terminando as anotações.  — Se ele tiver um tempo livre, sim. Mas não no mesmo dia da reunião com Iancu.  — Sim, senhor. — não que eu precise anotar, são instruções simples, mas anoto, para ele saber que eu não vou esquecer.  — É apenas isso, por enquanto, Vivien. Obrigado. Saio de sua sala, e começo a procurar um dos garotos de recados. O telefone foi inventado há pouco tempo, mas sei que é uma grande invenção, e que logo terá um em cada esquina. Muitos homens pensam exatamente o contrário de mim, e não sou eu quem dizer a eles que estão errados. Encontro o pequeno Beniamin, brincando com vários outros garotos, perto da porta do prédio. Ele entra comigo, para que eu faça o bilhete que ele vai levar para o senhor Bucur. Me sento à frente da máquina de escrever, em poucos minutos o bilhete está pronto, e Beni o leva. Em pouco mais de uma hora, Beni volta com a resposta, que eu levo para Adam Cracium, depois de pedir a Beni que leve o bilhete do chefe de polícia.  — Estou com a resposta de Iancu Bucur. Ele pode vir em três dias, senhor Cracium. Na parte da manhã.  — Sei exatamente o que ele quer! — Adam faz uma careta de descontentamento.  — E o que ele quer, senhor? — pergunto franzindo as sobrancelhas.  — Ele quer vir depois que o material for entregue. — ele suspira. — Você terá que conhecê-lo no território dele, Vivien. Não sei se isso será um problema para você, mas muitas mulheres não gostam de conhecer alguém sem a presença de alguém que já conhece.  — Para mim, não há problema nenhum, senhor Cracium. — sorrio levemente.  — Ótimo! — sinto o alívio em sua voz. — Então, depois de amanhã, na parte da tarde, vá até a sua fazenda. Se achar que não vai conseguir achar o endereço, ou se não se sentir bem em ir sozinha, leve Beniamin. É só um garoto, eu sei, mas esse menino é bem desenvolvido. Vai te passar segurança.  — Não é necessário, mas agradeço mesmo assim. — ele franze as sobrancelhas, me olhando como se parecesse desconfiado. — O senhor me assegurou de que o senhor Bucur é um cavalheiro. — sorrio para ele. — Ou será que eu não devo confiar tanto assim?  — Sim! — ele sorri fechando os olhos. — Eu assegurei. Mas voltando ao assunto reuniões, já marcou com o chefe de polícia?  — Beniamin foi levar o bilhete há poucos minutos. Eu volto com a resposta assim que Beni chegar com ela.  — Obrigado, Vivien! Ele sorri para mim, e volta aos seus afazeres de prefeito, analisando toda a papelada em sua frente. Eu volto para a minha mesa e começo a separar os documentos por suas prioridades, até Beni chegar com a resposta, então, volto para a sala do prefeito.  — Amanhã de manhã, senhor Cracium.  — Perfeito! — ela mostra um sorriso largo. — Assim você pode fazer as anotações e relatório da reunião. Ou melhor, das reuniões! Quero que esteja presente na reunião com Iancu também.  — Claro, senhor! — também sorrio. — Foi exatamente o que pensei.  — Você separou to.dos os documentos mais importantes?  — Só não separei as outras duas categorias: média e baixa urgência.  — Ótimo! Traga os mais urgentes para mim, e já pode ir para casa. Já são quase cinco horas da tarde.  — Aqui estão. — falo para ele, voltando em poucos minutos, com os documentos que ele me pediu, e os coloco em cima de sua mesa.  — Muito obrigado, Vivien! Até amanhã.  — Até amanhã, senhor. Moro a duas quadras da prefeitura, numa casa que é muito mais espaçosa do que preciso. Poderia morar numa casa menor, já que eu moro sozinha, mas a verdade, é que eu gosto de espaço. E eu nem preciso trabalhar, mas cansei de não fazer nada em minha vida e viver embaixo das asas de meu pai. Não que ele realmente tenha asas, mas essa é uma frase que as pessoas costumam falar, e eu gosto dela. A reunião com o chefe de polícia acontece bem cedo, e o prefeito fica muito satisfeito com a resposta dele, que aumentará a segurança para as mulheres da cidade, além de começar a prender homens que as assediem. E este, é o primeiro passo para a modernidade. O segundo passo, é a escola que será construída nas terras de Iancu Bucur, que terá mulheres estudando lá. Isso é algo que Adam quer implantar em todas as escolas da cidade. Até hoje, as mulheres aprendem o básico, em casa. A não ser as de famílias ricas, que vão para os internatos de freiras, quando os pais deixam. A minha história é muito diferente. Papai sempre fez questão que eu tivesse professores, e os fez me ensinar desde pequena, mesmo quando meu avô era contra. Ainda assim, não consigo o chamar de pai. Tenho certas mágoas dele, e prefiro chamá-lo de tio. Quem sabe um dia? Mas, por ora, é assim que me sinto bem, chamando meu avô materno, que já faleceu há muito tempo, de pai e a meu pai de tio. Hoje é o dia que chega o material para a construção da escola nas terras de Bucur, e Adam me deu a manhã de folga. Me preparo calmamente para ir para as terras dele, e consigo chegar a tempo de acompanhar a entrega, e não só para conferir se o material foi to.do entregue. Vários homens ajudam a descarregar os materiais de construção dos caminhões, e eu acompanho de perto. Em certo momento, um deles está passando com um saco de um dos materiais, bem perto de mim. Para não ser atingida, eu dou um passo para trás, e acabo tropeçando numa raiz de uma árvore, que está exposta, e que eu não havia notado, que estava muito próxima dos meus pés. Imediatamente, braços musculosos me abraçam, impedindo que eu caia no chão. Olho para o rosto do meu salvador, e me deparo com lindos olhos cinza que fazem meu coração acelerar.  — Cuidado, moça!