Capítulo- XVI. Conversa (P2)
" Fale de ti e saberás o que penso. "
Liliana
_ Conversar? Sobre o que desejas conversar? - pergunto aflita, ele olha-me e movimenta-se com passos letais, parece um predador nato. Seus olhos parecem ser um aparelho detector de mentiras.
_ Com grande anelo, desejo travar conversa a respeito da donzela; que outro assunto de relevância poderia estar presente em vossa augusta presença?- a voz de Ragna soa baixa comedida muito embora a altivez esteja presente o tempo inteiro.
_ Falar sobre mim? Por qual razão, sou uma pessoa simples. Deve estar em posse de todos os passos da minha vida, não é desse modo que pessoas como o senhor se portam diante de outros desfavorecidos?
Ragna estreita o olhar em minha direção.
_ Pessoas como eu?- inclina levemente o pescoço.Um raio de diversão passa em seu semblante, olhos de hábeis acompanham os gestos mínimos de minhas mãos inquietas. Ele para à minha frente. Dou-me conta do quanto é grande, intimidante.
_ Esmagadoras, sem escrúpulos. Trocando em miúdos, estou de frente para um i*****l completo!- perco a noção do perigo quando a raiva me domina.
Seu olhar azul continua fixo no meus, as íris brilham Duras. Inflexíveis. Fico sem palavras por um momento, apenas olhando-o , entre o limbo de assustada e deslumbrada, ele é soberbamente bonito. Mas o d***o também, por isso as irmãs diziam para nós moças internas que deveríamos sempre tememermos os belos rapazes que a vida pudessem nos trazer, eles são as razões de muitas desventuras.
_ Esta é a vossa augusta consideração a meu respeito?
_ Céus! Precisarei de um dicionário...
Minha frase morre ao sentir dedos grandes erguer meu queixo de modo que fique com meus olhos presos aos do escocês.
O toque simples sutil faz meu corpo estremecer por completo. Não sinto o calor de sua pele apenas o couro frio- material que confecciona as luvas que usa.
Fico tensa no mesmo instante em que Ragna estremece, percebendo que estou perdendo o domínio de mim mesma. Meu sangue esquenta. Minha carne vibra eletrizante.
— Um dicionário… — sussurra áspero. O polegar escorrega para o meu maxilar; minha pele arrepia enquanto minha i********e lateja. No susto, dou um pequeno pulo para trás, livrando-me do toque masculino.
— Quantos foram os homens que lograram o privilégio de conhecer os teus sublimes prazeres, menina? — meus olhos esgazam, não há como ser diferente.
— Não entendo a razão desta pergunta… se te referes a mim como donzela, creio que saiba a resposta.
Ragna se aproxima um passo, fechando a distância entre nós. Fico encurralada entre a janela que dá para o Rio Largo; não sei ao certo do que se trata. Estou feita uma presa sem escapatória diante do predador.
— Nestes tempos de agora, falta muito a verdade; assim pode uma dama, sem filhos e sem marido, mostrar-se donzela, ainda que sua castidade já esteja profanada.
— Então teus lacaios não fizeram o trabalho direito. Cabe a eles dizer ao senhor com quantos conheci as estrelas.
Não sei de onde brota tanta coragem, mas surge como uma cascata violenta que rompe com todas as barreiras de segurança existentes em mim.
As narinas do homem inflam. Ragna puxa-me pela cintura, trazendo-me para junto de si. Resfolego com a junção dos nossos corpos. Fico atordoada pelo contato; as notas do perfume masculino somam-se às sensações estranhas que percorrem meu organismo. Tudo em Ragna me subjulga, do olhar ao toque. Estremeço ao sentir algo rígido encostar em minha barriga.
— Por favor… deixe-me. Não quero que me toque. — Minha voz perde firmeza quando suas mãos deslizam pela minha cintura.
— Não minta para si própria, menina. Teu olhar fala por ti. — sussurra, provocando uma nevasca em meu estômago. Aflição me golpeia.
"Vou para o inferno… ser condenada por não saber lidar com tantas sensações aterradoras. Serei punida por Deus por promíscua."
— Não… engana-se, senhor. Eu lhe desprezo. Não suporto o seu toque e… — O polegar, coberto pelo couro da luva, desliza vagarosamente pelos meus lábios.
— Gosto do que vejo em teu olhar. Muito. Tenho vasta experiência, menina; sei quando sou desejado por uma fêmea. Sei que estás em guerra contigo mesma, entre excitação e medo. Vamos… revela-te para mim. Permite que eu veja o que sempre me pertenceu.
Pânico me toma por inteiro. Meu primeiro pensamento é que o infeliz vai agir feito o d***o, rompendo com minha moralidade como um homem vil.
— O que pretendes com isso, senhor? — minha garganta seca.
— Recolher tua alma, menina.
— Ãh?! — Não tenho tempo de pensar; Ragna avança sobre meus lábios, soltando pequenos rosnados. Estremeço ao sentir que sua língua é morna, não quente. Tento empurrá-lo, mas minha força é inútil. Ele me aperta contra si, aprofundando o beijo que não correspondo.
Ele se afasta e me olha. Seus olhos são de um azul profundo, como se espalhassem um mar sem fundo.
— Não me dás o g**o de teus beijos e me gelas, dura e fria qual mármore de sepultura! Mostra-me, já, o fogo do teu desejo, pois eu serei quem há de te desposar. Quero as folguras da paixão em toda a inteireza, menina, e não tolerarei que me negues o que me é de direito! — Seu tom muda para ameaça.
— Não te quero. Nunca te quis. Estou aqui por tua imoralidade e pela burrice do meu irmão. Não consegue ver, senhor, que eu não o estimo?
Ragna gargalha alto, como uma maldição encarnada. Quando volta a me olhar, possui a máscara de escárnio cobrindo o rosto.
— Não tens o querer, nem tampouco o não querer: és minha, menina, por todo o tempo que minha vontade determinar. Tua liberdade jaz morta, e tua escolha é vã. Assim ordeno, assim será, e ninguém ousará contradizer-me.
O escocês solta-me com brusquidão; por pouco o chão não me ampara. A raiva me consome enquanto lágrimas escorrem pelos meus olhos. Detesto esse homem.
Ragna vira as costas. Furiosa, agarro o que vejo pela frente: uma esfera brilhante de vidro. Arremesso-a em suas costas. O som do objeto colidindo contra o corpo dele e se espatifando no chão, reduzido a cacos, me devolve à c***l realidade dos meus atos. Levo as mãos à cova, cobrindo os lábios; estou em choque com a minha própria ousadia.
O homem c***l olha por cima do ombro, atravessa a porta e a bate com força, um estrondo que parece reverberar em minhas entranhas. Deixo meu corpo ceder; vou de joelhos ao chão.
— Perdida… estou perdida. Amanhã é o casamento. Amanhã ele subirá sobre mim e me fará sangrar… me fará mulher, mas com dor… e… não! Isso não! Ele vai usar de violência… Edgar, o que fizeste do meu destino? A que me submeteste? — soluço baixo, arrasada, encurralada em um beco sem saída.
Lá fora, a chuva aperta. Os pingos caem grossos, batendo no vidro da janela, açoitando-me sem piedade. Sinto o frio da água refletido em meu corpo, como se o mundo inteiro conspirasse contra mim, esmagando qualquer esperança de alívio.
Bato com a minha mão espalmada no chão de piso de madeira, estou a beira de uma síncope nervosa.
Meu coração pula dentro do peito, parece uma novilha indomável.
_ Ele é velho, muito mais velho, homem feito e eu sou nova, como posso aceitar isso? Como? Serei uma escrava sob o seu julgo.
Lágrimas pingam da ponta do meu queixo.
Minha vida tem sido lástima atrás de lástima desde que perdi meus pais. E Edgar se mostra ser a minha maior decepção.
Levanto-me do chão, sento na borda da cama. Escorou a cabeça em um dos pilares do dossel. Estou com o corpo trêmulo em sua totalidade, não existe uma pequena parte de mim que esteja livre dos tremores fruto do desespero em que me encontro.
Olho pela janela que parece ser uma cascata com a água jorrando.
_ Será esse o meu infortúnio?