prologo

1010 Words
Prólogo Malu narrando O vento quente da tarde soprava devagar, levantando poeira pelas vielas estreitas do morro. Cada passo que eu dava ecoava entre as paredes descascadas, e era impossível não sentir os olhares queimando nas minhas costas. Alguns eram curiosos, outros maliciosos, e alguns, eu tinha certeza, estavam prontos para ver um espetáculo — como se minha vida fosse um desses barracos que as pessoas adoram comentar. Perigo não me deixou ir ao baile na noite anterior. Eu sabia muito bem por quê. Não era por ciúmes, como ele sempre alegava, mas porque as fotos dele com outras mulheres já estavam circulando por aí. Mulheres que não eram daqui, mulheres que se vestiam como se quisessem estampar revista. As imagens chegavam até mim por um número desconhecido, sempre em horários aleatórios, como se a intenção fosse me desgastar aos poucos. Eu não precisava perguntar para saber que era exatamente isso. Respirei fundo e continuei andando, tentando ignorar o burburinho à minha volta. Mas o comentário veio, venenoso, alto o bastante para cortar o ar. — Do que adianta ser a primeira-dama do morro se é obrigada a ficar em casa? — Larissa disse, rindo com uma outra mulher que eu não conhecia pelo nome, mas cujo rosto eu reconhecia de algumas fotos que me enviaram. O sangue me ferveu, mas decidi passar direto. — Corna! — Larissa gritou. Parei de imediato. Senti o peso daquela palavra descendo como uma pedra no meu peito. Virei devagar, como um animal prestes a atacar. — O que você falou? — perguntei, caminhando em direção a ela. — Repete na minha cara, se você tem coragem, sua vagabunda. Ela soltou uma risada debochada, cruzando os braços como se quisesse me provocar ainda mais. — Não tem vergonha não de ser uma p*****a que corre atrás do homem dos outros? — continuei, sentindo minha voz sair carregada de raiva. — E você não tem vergonha de ser a trouxa do morro? — ela rebateu, com um sorriso falso. — Todo mundo sabe. Você é uma piada. — Cala essa boca, sua p*****a! — gritei, indo para cima dela. Meu punho encontrou o rosto dela antes que eu pudesse pensar. Senti o impacto vibrar no meu braço. Ela revidou com um tapa que estalou no meu rosto, mas eu a empurrei com força, e ela caiu no chão. Sem hesitar, me joguei por cima, socando seu rosto uma, duas, três vezes. A outra mulher tentou me puxar, mas era como tentar arrancar um pitbull da presa. — Vai aprender a me respeitar! — gritei, cada palavra acompanhada por um golpe. — Eu não sou sua amiga pra você folgar comigo, garota! Um estampido alto cortou o ar. Um tiro para cima. O som reverberou no peito, e, por um segundo, o mundo ficou em silêncio. Olhei para o lado e vi Perigo vindo na minha direção, o olhar escuro como tempestade. — Eu já não disse que não quero barraco no meu morro? — ele rosnou, aproximando-se. — Malu. Antes que eu pudesse reagir, ele me pegou pelos cabelos e me puxou com força. — Me solta! — gritei, tentando arrancar a mão dele da minha cabeça. — Raspa o cabelo dessas duas — ele ordenou, sem me olhar. — Perigo! — Larissa implorou, tentando se levantar. — Raspa o cabelo das duas! — ele repetiu, a voz mais alta e mais fria. — E da próxima vez eu boto todas no micro-ondas! — Eu ainda tentava me soltar, mas ele me arrastava como se eu não pesasse nada. — E você… você tá ferrada! Ele me empurrou morro abaixo, até a boca. — Me solta, seu demônio! — berrei, me debatendo. — Eu odeio você, Perigo! Ele me jogou com força no chão, e uma dor aguda subiu pelo meu braço. — Tá de s*******m comigo, c*****o?! — ele gritou, chutando um caixote que estava próximo. — Você viu o que fez?! — respondi, tentando levantar. — Você me machucou! Ele se abaixou, ficando na minha altura. O cheiro de cigarro e suor se misturava no ar. — Quem mandou você arrumar briga no morro? — disse, prendendo minhas pernas com uma das mãos. — Quem mandou, Malu? — Se você não pegasse essas vagabundas por aí, nada disso teria acontecido! — cuspi as palavras, o coração acelerado. — Eu não seria chamada de corna, não estaria na boca do povo! Você me trancou em casa pra eu não ir ao baile porque tava lá pegando aquelas vadias! Ele me encarou, os olhos escuros se estreitando. — Me deixa ir embora! — gritei. O tapa veio rápido, ardendo no rosto. — Vai ser a última vez que você me desafia — ele disse, baixo e ameaçador. — Eu juro que te deixo trancada num quarto pro resto da vida. — Eu odeio você! — gritei de volta. — Eu odeio você, Perigo! — cuspi no rosto dele. O que veio depois foi pior que qualquer tapa. A mão dele fechou ao redor do meu pescoço, apertando. — Se me odeia, então tem que morrer — ele disse, e apertou mais. Tentei empurrá-lo, bater, mas o ar já me faltava. Minhas unhas arranharam o braço dele, mas parecia que nada surtia efeito. O mundo começou a escurecer nas bordas. Quando ele percebeu que eu estava realmente sufocando, me soltou. Bati a cabeça no chão, a dor explodindo na nuca. — Eu não sei como um dia fui me apaixonar por você — murmurei, ainda tentando recuperar o fôlego. Ele riu sem humor. — Você se apaixonou e quis ficar. Agora sabe demais. E daqui você só sai morta, ao meu lado. Entendeu, Maria Luiza? — Ele falou meu nome completo como se fosse uma sentença. — Entendeu, c*****o? — Sim — respondi, rápido, antes que ele surtasse de novo. O ronco de uma moto se aproximando fez ele se endireitar. — RD, meu primo, tá chegando — disse, já guardando a arma no bolso. — Sai pelos fundos. Agora! — gritou, apontando para a porta.
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