A manhã seguinte chegou como um golpe para Lara.
Ela acordou com o celular vibrando de forma insistente — uma chamada de Sofia, sua melhor amiga.
— Acorda, garota. Temos um problema dos grandes.
Lara sentou-se, ainda tonta de sono.
— Que tipo de problema?
— O tipo que veste terno caro e faz o FBI parecer escoteiro.
O sangue dela gelou.
— Fala direito, Sofia.
— Dante Moretti. — A voz da sua amiga ficou mais baixa. — Fiz o rastreamento do nome dele. E ele não é só um jogador de pôquer amiga.
Lara levantou-se da cama num salto, andando de um lado para o outro pelo quarto.
— Eu imaginei.
— Ele tem conexões com uma grande5 rede internacional de lavagem de dinheiro. Só que tem uma coisa estranha... — Sofia hesitou.
— As transferências mais antigas o ligam ao mesmo homem que destruiu a empresa do seu pai.
Lara parou, em silêncio.
— Quem?
— Victor Renaud. -O mesmo nome que aparece nos documentos que o Rafael usou contra a tua família.
O coração de Lara batia descompassado.
Victor Renaud.
O nome que ela ouvira apenas em sussurros na sua casa— o homem que financiara a armadilha que arruinou seu pai.
E agora, Dante estava ligado a ele.
Mas uma dúvida se infiltrou no meio da raiva:
Se Dante trabalhava para Renaud… por que ele teria tentado avisá-la de um suposto perigo presente no momento?
Já não sei o que pensar, ou em quem confiar. Tudo isso é muito coisa para eu assimilar.
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O salão do cassino estava lotado novamente naquela tarde.
A segunda rodada do torneio começaria em alguns minutos.
Apesar dos rostos serenos de todos, havia uma tensão no ar.
Lara entrou com o rosto sereno, mas por dentro era um turbilhão de sentimentos.
Dante estava lá, como sempre, no centro do salão.
Quando ela se aproximou, ele levantou o olhar — e, por um breve instante, pareceu aliviado por vê-la.
—Como você Dormiu ? — ele perguntou, com aquele tom leve que escondia algo mais profundo.
— Dormi o suficiente pra lembrar que não posso confiar em você e mais ninguém daqui.
Ele arqueou a sobrancelha.
— E mesmo assim veio.
— Vim pelo prêmio, não por você.
O dealer anunciou o início da rodada.
As cartas deslizaram sobre a mesa.
E o jogo começou.
Lara jogava com uma precisão surpreendente. A Cada movimento, cada olhar, era calculado.
Mas o verdadeiro jogo acontecia dentro dela.
Enquanto trocava fichas e olhares com Dante, observava todos os detalhes.
Os sinais discretos que ele fazia para alguém no balcão do bar.
A forma como, em certos momentos, parecia receber mensagens em um relógio digital.
Tudo aquilo formava um quebra-cabeça que ela ainda não conseguia montar.
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Algumas horas depois, o torneio foi suspenso para o intervalo.
Lara saiu discretamente do salão e entrou em um dos corredores de serviço, onde a sua amiga Sofia a esperava com um laptop aberto.
— Conseguiu alguma coisa? — Lara perguntou.
— Consegui, mas você não vai gostar de saber.
Sofia virou a tela: imagens das câmeras de segurança internas do cassino.
Nelas, Dante aparecia em uma sala restrita, conversando com dois homens de terno.
Um deles… era Victor Renaud.
Lara sentiu o estômago revirar.
— Então é verdade mesmo. Ele trabalha pra o homem que destrói a vida do meu pai.
Sofia suspirou.
— É o que parece. Mas escuta: a conversa foi parcialmente captada pelo áudio. Olha isso.
Sofia aumentou o volume. A gravação era baixa, mas clara o suficiente para ouvir Dante dizer:
> “Ela não sabe de nada ainda. Mas se Renaud encostar um dedo nela, o acordo entre nós acaba.”
Lara ficou em silêncio.
— Espera... ele está protegendo você — disse Sofia.
— Ou fingindo proteger — respondeu Lara, fria, mesmo que o coração dissesse o contrário.
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Mais tarde, quando voltou ao salão, Dante estava sozinho, apoiado no bar.
Lara se aproximou, decidida.
— Precisamos conversar.
Ele a olhou, surpreso. — Sobre o quê exatamente?
— Sobre Victor Renaud.
O nome atingiu Dante como um soco.
O sorriso desapareceu.
— Onde ouviu esse nome?
— Isso importa? — ela retrucou. — Quero saber qual é a sua parte nisso.
Ele a fitou longamente, avaliando se podia confiar nela.
Depois, disse baixo:
— Não aqui.
Pegou o casaco e a conduziu até uma saída lateral.
No estacionamento, o vento noturno cortava o ar, e as luzes de Las Vegas pareciam mais distantes.
— Você acha que eu sou um vilão, Lara — ele começou dizendo. — Mas o que você não entende é que o seu pai não foi o único enganado por Renaud.
Ela estreitou os olhos. — Está dizendo que também foi vítima?
— Estou dizendo que entre o certo e o errado existe uma zona cinza. E é nela que eu vivo desde que ele destruiu tudo que eu tinha.
O silêncio entre eles era pesado, cheio de verdades não ditas.
Lara o encarou, tentando decifrá-lo.
— Então me diz: por que está me ajudando?
Dante respirou fundo.
— Porque talvez, pela primeira vez, eu tenha algo que vale mais do que dinheiro e poder.
Ele deu um passo à frente, a mão roçando o braço dela.
— E não vou deixar Renaud tocar em você.
Lara o empurrou levemente, o coração disparado.
— Não confie em mim, Dante.
— Tarde demais pra isso — ele murmurou. — Já estou apostando tudo em você.
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Enquanto ele se afastava, o celular de Lara vibrou.
Uma mensagem anônima, outra vez.
“Ele mente para te proteger. Mas vai te destruir do mesmo jeito.”
Ela levantou o olhar.
Dante já desaparecera na escuridão.
E, pela primeira vez, Lara percebeu que estava jogando dois jogos ao mesmo tempo:
um na mesa de pôquer…
e outro, muito mais perigoso, dentro do seu coração.
Mesmo com o coração em jogo, ela não queria parar de jogar e nem perder esse jogo.