Lara
Uma chuva caía fina sobre cidade de Las Vegas.
Lara observava as gotas escorrerem pelo vidro do quarto de hotel, e o som suave contrastando com o caos exiem sua mente.
As palavras de Dante ecoavam em sua mente sem parar:
“Entre o certo e o errado existe uma zona cinza. E é nela que eu vivo.”
Ela queria odiá-lo.
Precisava odiá-lo.
Mas algo dentro dela dizia o contrário— esse lado teimoso e irracional — a fazia acreditar que ele estava dizendo a verdade sobre tudo.
— Você está perdida, Lara — murmurou para si mesma, fechando os olhos. — Completamente perdida.
O toque do celular a fez despertar.
Era Sofia, sua melhor amiga, mais uma vez.
— Temos companhia Lara — disse a amiga, em tom tenso. — Alguém invadiu o servidor do cassino. E não foi o Sr Moretti.
Lara franziu o cenho surpresa.
— Quem são então?
— Estou tentando rastrear… espera, espera… — um clique, mais outro — Droga. O IP é o mesmo que usaram na fraude da empresa do teu pai.
O coração de Lara gelou.
— Isso quer dizer que…
— Isso quer dizer que o mesmo grupo que destruiu o teu pai está aqui, agora atrás de ti.
E provavelmente de olho em você, o tempo todo.
Lara levantou-se num impulso, começou a se vestir rapidamente.
— Onde está o Dante, você sabe?
— Desapareceu há uma hora. Não há nenhum sinal dele nas câmeras.
O medo se misturou à raiva.
Ela pegou uma pistola pequena que guardava na sua mala. — lembrança de um tempo em que ainda acreditava que podia se proteger de tudo — e saiu do quarto.
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O corredor estava silencioso, o som distante dos elevadores quebrando o ar pesado.
Quando virou a esquina, uma sombra se moveu em sua direção.
Lara levantou a arma assustada — e o corpo reagiu antes da sua mente.
— Calma — uma voz masculina disse a ela de forma, firme, porém baixa.
Ela reconheceu o timbre antes de vê-lo.
Dante.
— Você está me seguindo de novo? — ela sibilou, baixando lentamente a arma.
— Te salvando, de novo isso sim. — Ele deu um passo à frente, o rosto meio oculto pela penumbra. — Renaud mandou gentes atrás de você.
Lara sentiu o estômago revirar.
— Por quê?
— Porque você descobriu mais do que você devia.
— E o que exatamente eu descobri, Dante? — perguntou ela, cruzando os braços. — Que o homem que arruinou a vida do meu pai também é o mesmo que paga suas contas?
Ele ficou em silêncio. Por um momento, apenas o som da chuva preenchia o espaço entre eles.
Então ele disse, quase num sussurro:
— O seu pai não era tão inocente quanto você pensa.
A frase caiu como um raio para cima dela.
— O quê?
— Ele entrou em um acordo com Renaud. Tentou sair depois, e pagou o preço.
— Mentira.
— Eu vi os documentos. Seu pai lavava dinheiro do próprio Renaud há anos.
Lara deu um passo atrás, como se o chão tivesse desaparecido sob os pés.
— Você está mentindo pra mim.
— Gostaria que estivesse.
As lágrimas ardiam, mas ela não deixaria cair.
— Está tentando me manipular.
— Estou tentando te impedir de ser a próxima vítima.
O silêncio que se seguiu foi brutal.
Lara olhava para Dante como se o desconhecesse — e, de certo modo, era verdade.
O homem que a fascinava era também o portador da pior dor que ela já ouvira.
— E por que me contar isso agora? — ela perguntou, com a voz embargada.
— Porque Renaud quer te usar. Ele precisa que você ganhe o torneio.
Ela o encarou, surpresa com a revelação.
— Ganhar?
— O prêmio é uma fachada. O dinheiro não existe. O verdadeiro objetivo é limpar os fundos escondidos nos cofres do cassino.
Se você vencer, o sistema transfere tudo automaticamente para as contas dele.
Lara ficou sem ar.
— Então… eu sou a isca.
Dante assentiu. — E se recusar a jogar, você morre, entendeu.
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Ela se afastou, sem saber se gritava ou chorava.
— E você, Dante? Qual é o seu papel nisso tudo?
Ele a olhou com uma dor real nos olhos.
— Eu entrei nesse jogo pra destruir Renaud. Só não esperava te encontrar no meio dele.
Lara se virou, furiosa.
— Você devia ter me contado desde o começo!
— E você teria acreditado? — ele rebateu. — Teria me ouvido, depois de tudo o que seu pai te fez acreditar sobre mim?
Ela hesitou.
— O que meu pai te fez?
— Me mandou pra prisão — ele disse, frio. — Porque eu descobri que o acordo com Renaud existia.
O ar entre eles ficou pesado.
Lara não conseguia respirar.
Dante deu um passo, depois outro. Parou a poucos centímetros dela.
— Eu não sou seu inimigo, Lara — disse, a voz rouca. — Mas se continuar me vendo como um, vamos acabar nos destruindo.
Os olhos dela se encheram de raiva e desejo.
— Talvez seja exatamente isso que esse jogo quer.
Ele a encarou por um instante… e então, como se as palavras não bastassem mais, a beijou.
O beijo foi feroz, urgente, como se ambos estivessem tentando esquecer tudo o que sabiam — e, por um instante, conseguiram.
Mas quando ela se afastou, os lábios ainda tremendo, a realidade voltou.
— Isso não muda nada — ela sussurrou.
— Não! — ele respondeu. — Só muda o quanto isso vai doer para nós.
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Horas depois, sozinha no quarto, Lara abriu o cofre e tirou uma antiga carta, escrita pelo pai pouco antes de morrer.
As mãos tremiam quando ela leu as últimas linhas:
“Nem tudo é o que parece, minha filha. Às vezes, o inimigo que mais tememos é o único que ainda pode nos salvar.”
Ela deixou a carta cair.
E, pela primeira vez, não sabia mais em quem deveria acreditar.