A sala reservada no subsolo do cassino estava silenciosa demais para uma noite tão movimentada.
Lá fora, o som de máquinas, risadas e música vibrava pelo ar, mas ali dentro, o mundo parecia preso em suspensão.
Lara sentia o coração bater forte demais, tão alto que parecia ecoar dentro da própria cabeça.
Suas mãos estavam frias, mesmo que seu corpo estivesse quente de adrenalina. E raiva. E confusão. Tudo misturado.
Dante estava à sua frente. Alto, firme, perigoso.
Com os braços cruzados, as mangas da camisa social dobradas até os antebraços, revelando veias marcadas que denunciavam tensão extrema.
Aquele homem conseguia bagunçar tudo nela — o pensamento, o ar, o equilíbrio.
Mas dessa vez… dessa vez era diferente.
Ele a havia tirado da mesa à força.
Invadido seu jogo.
Assumido controle como se tivesse direito.
— Você não deveria ter feito aquilo — ela sussurra, ainda com a respiração instável.
— Você me expôs na frente de todos.
Dante dá um passo à frente.
Lara recua um.
Não porque estivesse com medo , mas porque aquele homem tinha um efeito devastador sobre ela quando se aproximava demais.
— Eu te tirei dali porque você estava sendo observada — ele diz, a voz baixa, grave, contendo algo que parecia prestes a explodir.
— Eles não deviam ter te cercado daquele jeito.
— "Eles"? — Lara ergue o queixo. — Ou você?
Ele franze o cenho.
— Lara…
— Você passou o jogo inteiro me encarando como se quisesse ler minha alma.
— Ela aperta os punhos. — E depois me arrasta pra cá como se fosse dono de mim. Você não é.
A respiração dele falha por um instante.
Os olhos escuros — sempre tão impenetráveis, e mostram um brilho de frustração.
Ou dor. Ou algo muito parecido com possessividade.
Ele passa a mão pelos cabelos, caminhando alguns passos pelo ambiente.
— Eu não sou dono de você — ele responde, finalmente.
— Mas estou tentando evitar que se machuque.
Lara ri sem humor.
— Você está escondendo alguma coisa, Dante.
Ele para.
O silêncio que se segue pesa toneladas.
Lara sente o estômago afundar.
Porque vê exatamente no rosto dele,
a tensão, a hesitação, o arrependimento que tenta disfarçar, a verdade que ainda não tem coragem de entregar.
— Tem gente atrás de você — ele diz, finalmente.
— E não é por causa do pôquer. Não apenas.
O mundo parece girar um pouco.
— Como assim?
Dante se aproxima. Devagar.
Como se temesse que ela quebrasse.
Ele levanta a mão… mas não toca nela.
A para a poucos centímetros de seu rosto, como se tocar fosse perigoso demais — para ela ou para ele.
— Porque sua família está na mira.
— Porque seu pai não contou tudo.
— Porque você está entrando em um terreno que não entende, Lara.
Ela sente algo quente no peito — algo entre raiva e medo.
— Então me explica.
Ele a encara com uma intensidade que corta o ar.
— Se eu explicar tudo agora, você vai me odiar.
Lara sente o corpo desmoronar por dentro.
— Já estou no limite.
Ele fecha os olhos, como se a frase o tivesse ferido mais do que qualquer golpe físico.
Um segundo.
Dois.
Três.
Quando abre novamente, há algo novo ali — algo cru, sincero, perigoso.
— Eu estou tentando te proteger — diz baixinho.
— Mesmo que você não veja isso agora.
Ela dá um passo na direção dele.
— E eu estou tentando confiar em você — sussurra.
— Mas você não facilita. Você me invade, me provoca, me salva, me confunde… e depois me deixa no escuro.
Os olhos de Dante descem para os lábios dela por um segundo breve demais para ser acidental.
— Eu não devia sentir o que sinto — ele admite, a voz tão baixa que parece uma confissão proibida.
— Não devia querer você desse jeito.
O coração dela dispara.
— Então por que quer?
Dante inspira fundo.
Como se estivesse lutando contra si mesmo.
— Porque você me enfrenta — ele diz.
— Porque você não abaixa a cabeça pra mim. Porque quando eu chego perto você respira mais rápido… mas não recua.
Ele dá mais um passo.
Lara sente o calor do corpo dele.
— E Deus, Lara… — a voz dele falha — …porque eu te quero tanto que chega a doer.
Ela perde o ar.
Ele continua.
— Mas querer você significa colocar você em mais perigo do que já está. E eu não vou permitir isso.
Lara sente as lágrimas queimarem atrás dos olhos, mas não cai nenhuma.
— Eu não preciso que você me proteja do mundo inteiro — diz, firme.
— Só preciso que não seja mais um a me machucar com segredos.
A expressão dele muda.
É quase uma rendição.
Ele levanta a mão… e dessa vez toca seu rosto.
O toque é quente.
Devagar.
Como se tivesse medo de quebrá-la — ou se quebrar.
— Eu juro — ele murmura, os dedos deslizando pela linha da mandíbula dela, eu nunca vou ser o inimigo que você precisa temer.
A respiração dela falha.
— Então me deixa entrar, Dante.
Ele fecha os olhos, encostando a testa na dela, a voz rasgada de conflito.
— Isso é o que mais quero.
Pausa.
A respiração quente deles se mistura.
— E também é o que mais temo.
Por um momento, o mundo inteiro parece conter o fôlego.
O toque dele.
O cheiro dele.
O peso da verdade entre eles.
E a certeza silenciosa, inevitável:
Aquilo não era só tensão.
Era algo que já tinha passado de ponto, algo que poderia salvá-los, ou destruir os dois.