11 - Como nos velhos tempos?

1294 Words
Passei a manhã e a tarde toda conversando com fornecedores e clientes. Não parei nem para almoçar, tinha muita coisa pendente. Finalizei a última reunião totalmente esgotado e com fome. Mandei por e-mail todas as novidades, preços, negociações e contratos que firmei para Lise verificar na manhã seguinte. Fechei meu notebook, coloquei meus cotovelos sobre a mesa e descansei meu rosto nelas. Ouvi batidas na porta e a pessoa abriu sem esperar a minha resposta. – Finalizou sua última reunião? – Perguntou Claire com ar de reprovação. – Sim, essa foi a última. – Eu respondi, olhando-a cansado. – Você vai comer algo ou quer que eu o obrigue? – Disse ela, com os braços cruzados. Sim, Claire estava totalmente brava. – Já vou ali na cozinha comer algo. Só estou dando um tempo para meu cérebro relaxar. – Você sempre age assim? – Disse ela, me fuzilando com o olhar. – Assim como? – Eu perguntei, ainda sem entender o porquê de ela estar brava. – Agindo sem ter consciência de que precisa comer ou ao menos se cuidar? – Claire me repreendeu. – Sim, não vou mentir. Minha vida tem sido uma loucura total e às vezes nem consigo parar para comer. – E tudo isso vale a pena? – Claire, o que você tem que entender é que eu estava lutando contra meus tios, peguei a gerência total da empresa faz pouco tempo e até colocar as coisas no lugar, leva um bocado de tempo e esforço. – Não tem ninguém que o ajude por lá? – Tem a Lise. – Quem é Lise? – Perguntou Claire com uma pitada de ciúme. – Minha secretária de 60 anos. – Eu sorri com ar triunfante. – Ahhh... Entendi. – Disse Claire, tentando se recompor. – Isso soou como ciúme? – Eu falei, sorrindo. – Imaginação sua. – Disse Claire, se defendendo. – Sei... – Por qual motivo você contratou Lise? – Claire perguntou com o cenho franzido. – Não entendi a sua pergunta. Seria por causa da idade? – Eu a questionei, sem entender ao certo. – Isso. Normalmente, as pessoas nessa faixa etária têm dificuldades em encontrar uma empresa que as aceite pelo conhecimento em vez de jovialidade. – Eu a contratei porque gostei dela na entrevista e não me arrependo. É meu escudo na empresa e também sei que está lá para me ajudar e não para ficar "me paquerando", se é que me entende, né? – Isso foi muito legal da sua parte. Vejo que a sua essência não morreu por completo. – Imagina, nem fiz muita coisa. Na verdade, quem faz as coisas é ela. Mérito total dela. – Eu sei, mas poderia ter contratado um rapaz ao invés dela e não o fez, o que o torna um ser humano melhor na minha visão. – Disse Claire, sorrindo para mim. Era a primeira vez que via um sorriso em seu rosto, depois de oito anos, causado por mim. Na realidade, desde que cheguei, ela só tem vontade de me "matar", o que dificultou um pouco as coisas, mas agora, fiquei feliz de arrancar um sorriso dela. – Até que enfim, um sorriso! – Eu disse, sorrindo. Meu humor até melhorou. Claire ficou com as bochechas vermelhas. Claramente estava envergonhada e não vou mentir, ela ficava ainda mais linda nesse estado. – Para de enrolar e vem logo comer! Te faço companhia. – Disse ela. – Tudo bem. – Eu concordei e me levantei, me espreguicei alongando a coluna e a segui até a cozinha. – Não acredito que você me fez uma desfeita dessas. – Disse Gina, mãe de Claire. Eu fiz uma careta para ela e dei um beijo em sua bochecha. – Você sabe que não fiz por m*l. Realmente estava com muito trabalho. – Eu me justifiquei. – Entendo, mas eu guardei um prato para você do almoço hoje. – Disse ela, toda amorosa. – Ah, como é bom estar em casa! – Eu falei, abraçando-a e quase fazendo ela derrubar o prato. – Calma, Misha, assim não vai sobrar almoço! – Disse ela, me dando bronca. Eu peguei o prato que já estava quente, me sentei à mesa e comecei a comer. Ah, como a comida da Gina era boa... Eu não fazia ideia do quanto me sentia sozinho sem eles. Ter uma família para te receber é tão reconfortante, mesmo que o seu dia tenha sido exaustivo e r**m. Comi, saboreando, parecia que tinha ido às nuvens... Fazia muito tempo que não comia comida caseira. – Ei, você está na Terra? – Disse Claire, gesticulando na minha frente. – Oi? Acabei de voltar. – Eu falei, sorrindo. – Está tão boa assim? – Disse Claire, apontando para a comida. – Está deliciosa como sempre! Gina é um anjo. – Falei, dando uma garfada. – A propósito, você também não almoçou? – Eu perguntei, com o cenho franzido. – Confesso que não. Tive um probleminha que tive de resolver e que me ocupou a manhã toda e boa parte da tarde. – Disse Claire, com aspecto cansado. – Vocês dois estão reprovados! Deixar de comer não faz bem para o estômago. – Disse Gina, dando bronca em nós. – Espera... Quer dizer que você foi me dar bronca no escritório, mas também não se cuidou igual eu? – Eu falei, tirando sarro de Claire. – Ah, isso foi diferente... – Disse ela, se esquivando. – Não foi não... "É o sujo falando do m*l lavado." – Falou Gina. – Mamãe, você deveria me defender. – Falou Claire, fazendo bico. – Óbvio que não, eu vou pelo certo. Sem contar que Misha também é como se fosse meu filho. Nota: Expressão popular: "o sujo falando do m*l lavado" significa que uma pessoa com defeitos ou problemas semelhantes está criticando ou julgando outra pessoa que possui características semelhantes. – Obrigada, Gina, você é uma bênção na minha vida! – Eu falei, puxando seu saco. – Não venha com essa, até porque você ficou 8 anos sem me ver. Está no vermelho comigo. – Falou Gina, fazendo cara de brava. – Foram as circunstâncias, mas meu amor por você não mudou. Ainda é a minha segunda mãe e sabe disso! – Eu me defendi. Claire riu, estava totalmente contente por eu ter levado bronca. – Claire, como você pode rir num momento como esse? – Eu me fiz de coitado. – Até parece... Fique mais tempo sem nos ver para ver o que vai acontecer com você quando aparecer em nossa fazenda. – Ameaçou Gina. – Isso aí, mamãe! – Comemorou Claire. – Você vai deixá-la continuar tirando sarro de mim? – Eu fiz bico. Nós três nos olhamos e começamos a rir. Claire e eu não mudamos em nada. Tudo estava como era antes, e eu estava tão feliz que não imaginava o que viria a seguir. – Fiquei sabendo que vocês dois estão noivos. É isso mesmo? – Perguntou Gina. Eu e Claire nos encaramos com olhos arregalados. Esquecemos de contar para Gina o que ocorreu. – Mamãe, eu inventei isso para despistar os dois abusados que andam me enchendo o saco. Na verdade, não estamos noivos. – Se adiantou Claire. – Entendi, mas se vocês realmente se gostam, dou minha bênção. – Mamãe! – Claire a repreendeu. – O que foi? Só falei o que está em meu coração. – Gina se defendeu. Eu não disse nada, fiquei apenas escutando e observando. Ver Claire falar rapidamente e esclarecer tudo fez meu coração doer. Sei que não posso exigir nada, que não posso desistir, mas ver aquilo me fez perder o apetite. Levantei-me da mesa sem dizer uma palavra, dei um beijo na testa de Gina e saí da cozinha. Precisava espairecer a cabeça.
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