Teatro da Vida

2251 Words
Talvez tenha se passado alguns minutos quando finalmente acordou. Desistiu de choramingar. Precisava tomar uma atitude! Por Mahina! Levantou a cabeça e decidiu que tinha chances de mudar isso. Iria pedir desculpas e explicar quem era Si Woo para ele, quem ele era, como o perdeu. Jae precisava saber... -Isso – Exclamou Chen Ren engolindo a vontade de chorar e o sentimento amargo. Levantou-se e foi ver a calça. A caixa sem a tampa mostrava roupas novas e muito bem-feitas. Sob o toque dos dedos parecia mais macio que seda. Onde Jae encontrou essas roupas? Trocou se rapidamente colocando o robe novo na cor creme. Depois a calça de mesmo tom e então o robe secundário na cor azul claro. Amarrava sua cintura e então o casaco azul mais celeste. Era tão leve que não parecia que vestia algo. Uma ótima escolha. Seu cabelo estava trançado na ponta para não ficar por aí balançando. Respirando fundo ele saiu do quarto e foi em direção as escadas. Suas botas nevadas batiam no chão, mas não produziam som algum. A cada passo parecia nadar sobre travesseiros de tão confortável e na medida certa. Estava tão distraído que não notou a escada até que seu pé não tinha onde pisar. Foi um desespero tão palpável que seu coração parou por alguns milésimos de segundos até seu pé encontrar o degrau. Apoiou se na parede até seu coração voltar ao lugar e a vergonha vir com tudo em forma de risada. -Sr. Yanar – Cumprimentou a dona do lugar com um sorriso satisfeito – está belíssimo, dormiu bem? -Sim senhora, e você? – Respondeu Ren procurando o dito cujo. -Sr. Yanar foi buscar algo, disse que esperasse aqui por alguns minutos – Contou a mulher ao notar a expressão decepcionada dele, então se apoiou na bancada e o encarou – está tudo bem? Pareciam tão felizes, algo muito r**m? -Nada – Retrucou Ren irritado – estamos bem. -Tudo bem, desculpe a pergunta, é que já vi muitos casais e as vezes um m*l-entendido pode causar estresse desnecessário – Comentou ela como quem não queria nada enquanto dobrava alguns panos – eu sempre dou bons conselhos. -Que conselhos você dá a essas pessoas? – Incentivou Chen Ren não querendo aceitar de fato. -Quando se junta com alguém, ocorre o momento conhecido como “descobrimento da verdade”, vocês estão se conhecendo ainda mais, pois antes podiam ser próximos, mas não viviam juntos, agora tudo parece diferente, mas na verdade nada mudou realmente – Ponderou ela parando de limpar o balcão – porém o que sempre digo é, o que causou o problema? Pergunte-se se é muito importante ter reagido da maneira que reagiu? Veja os dois lados e então conseguiram se resolver, mas ambos devem desejar isso senão não irá funcionar, como minha mãe dizia “Casa sem parede firme não para em pé”. -“Casa sem parede firme não para em pé” – Repetiu Chen Ren confuso. -Ou seja, sem uma boa estrutura de comprometimento, respeito, compressão, amor e amizade o teto que vai proteger tudo isso não existe, se for fraca vai desabar – Explicou ela voltando a passar o pano mesmo que a superfície já estava lustrada – cuide bem das paredes e vai ter um lar para sempre, não deixe qualquer coisa e pessoa entrar. Chen Ren queria chorar. Tudo estava o sobrecarregando. A culpa pelo desejo que sentia por Jae. O sentimento de segurança, confiança e talvez amor que cultivou para ele, tudo parecia uma traição com a memória de Si Woo, mas e se na verdade Si Woo desejasse sua felicidade? Eles se amavam muito então ele não ficaria chateado, não? Ou ficaria se revirando no tumulo...? O tumulo. Ele nem havia feito sua homenagem e pedido perdão e já estava pensando em outro homem? Ren entristeceu se ainda mais com a culpa. Tinha que ir até aquele lugar rapidamente e então poderia simplesmente ceder o que seu coração desejava. -Está pronto – Afirmou Jae aparecendo na entrada principal. Ren olhou imediatamente ao som daquela voz. A dor tornou se mais branda ao vê-lo mesmo que se mantivesse intensa. Ele trajava um robe simples da cor roxa bem escura. Seu cabelo no mesmo r**o de cavalo de sempre, mas parecia algo diferente o que? Seus olhos percorreram todo o corpo sem pudor até que focou em algo inusitado. Ele levava na mão dois papeis pequenos. -Vamos – Chamou ele em tom frio – ou vamos nos atrasar. -Claro – Concordou Ren andando até ele, mas o outro virou se saiu andando. Não seria simples pelo jeito. As ruas ainda de dia marcavam o calor habitual e o tempo que os vendedores tinham para ganhar algum dinheiro. Assim que viam o homem andando com imponência já arrumavam suas tendas, mas ele passava por eles sem dar a mínima. Onde estavam indo? Deveria perguntar ou esperar para não o chatear? E se... seu corpo foi puxado para o lado e algo o cobriu. Um coração batia forte contra seu rosto. Ao olhar para cima viu Jae com um olhar suavizado. -Cuidado onde anda – Repreendeu Jae o soltando com certa agressividade. Isso doeu mais do que uma lâmina. Se fosse físico poderia usar seus remédios caseiros, mas algo emocional? Era impossível de curar com remédios. O seguiu de perto tentando andar no mesmo ritmo e ver o mercado lotado. Tantas pessoas que nem conseguia conceber como tudo funcionava. Estava tão curioso que olhava tudo sem focar em nada quando Yanar Jae simplesmente parou em frente a uma casa grande. De madeira e varanda larga. -Vamos – Chamou Jae parando na entrada até que o outro o alcançasse. Passaram pelas portas e vozes eram ouvidas. Jae entregou os dois papeis para uma mulher bem vestida que sorriu sugestiva para ele, mas o homem nem a olhou. Segurou as costas de Chen Ren o empurrando gentilmente para dentro. A cada passo Ren sentia aquela mão em suas costas, quentes e macias. Era um convite a sua imaginação. Só de lembrar o que fizera momentos antes... o rubor tingiu suas bochechas. De repente ele parou. Diante de si havia um palco e algumas pessoas sentadas aguardando. Aquilo era um teatro? Jae o levara ao teatro? Sua satisfação o deixou animado, queria dizer que estavam bem? Que Jae havia perdoado a mancada de antes...? -Bem-vindos ao Melhor Teatro de suas Vidas – Cumprimentou um homem com animação em cima do palco interrompendo seus pensamentos – sente-se senhores e aproveitem o conto tão antigo quanto a própria terra. Jae o conduziu até um canto onde havia um sofá. Enquanto outros se sentavam no chão, eles se sentavam em um sofá confortável. Mesmo que não quisesse ele sentiu se m*l. Contudo Chen Ren acomodou se ali ao lado de Yanar que colocou seu braço atrás de suas costas. Seus olhos atentos ao apresentador então Chen Ren o imitou, anda que seu coração pulasse em seu peito de tanta felicidade. Eles estavam juntos. Estavam se tocando! Jae com toda certeza havia perdoado aquele deslize e nada poderia ser melhor. Era um momento feliz e momentos assim não poderiam ternar errado. -A história que vou lhes contar ocorreu a mais de 500 anos – Começou o homem em tom misterioso e então no palco mostrou se um homem de roupas muito familiares – uma guerra eternizada pelo céu, no qual as próprias estrelas vieram lutar, conhecida também como a ‘Guerra das 1.000 estrelas’! Chen Ren que mantinha um sorriso paralisou. Seu sorriso morreu e seu coração errou as batidas. Sua respiração tornou se difícil com as lembranças. Jae segurou sua mão, mas não disse nada. Como um redemoinho tudo apareceu a sua frente. Cada detalhe tocando sua pele. Conseguia sentir até o abafado som de corpos caindo no chão. O cheiro de cinzas, sangue e morte. -Tudo começa em uma manhã comum quando um rugido capaz de ser ouvido a quilômetros de distância acorda os pobres moradores de Hayashi, uma terra grandiosa, mas condenada quando a ‘Onça Celestial’ desceu a terra em busca de vingança – Contou ele com morbidez ouvindo os sussurros chocados da plateia lhe dando mais combustível – em meio as mortes e sangue que manchava as pradarias, a ‘Grandiosa Deusa Mahina’ olhou para a terra e ficou em horror! A ‘Onça Celestial’ que era a protetora dos portões para a ‘Residência Imperial de Mahina’ agora estava na terra, ceifando vidas inocentes sem qualquer remorso. -E o que ela fez? – Perguntou uma criança com desespero misturado com entusiasmo – ela matou a Onça? -Não, infelizmente a Divindade não queria perder um animal tão raro e deixou que vidas fossem levadas sem mais nem menos – Entristeceu se falsamente o homem – porém os homens corajosos daquele tempo se colocaram a defender os mais fracos, mesmo que morressem como moscas, lutavam até a morte. -Corajosos – Murmurou alguém com orgulho. Ren fungou não conseguindo dizer nada além do que sentia. Seu corpo não se movia. Apenas o nó em sua garganta era sentido o sufocando. Jae apertou sua mão mesmo que em silencio o impedindo de fugir. Ele não queria ouvir sobre o passado. Era chamado assim por um motivo... ele não queria lembrar... Ren sentia as bochechas molhadas naquele momento. Era real. Tão real quanto a mão que afundava em seu braço naquele momento. Apenas uma coisa se materializava em sua mente... Por que? -Dentre estes corajosos homens estava ele, adivinhem – Exaltou se o homem para dar ênfase – o Guerreiros da Meia Noite, lutou cara a cara com o bicho, mesmo ferido não hesitou em machuca-lo, mesmo sendo amaldiçoado pela própria deusa ele lutou bravamente, massacrou os exércitos celestiais como senão fossem nada além de insetos, apenas para m***r a besta... As lembranças machucavam muito, mais do que qualquer coisa que já sentira. A imagem dos corpos caídos em meio a poças de sangue. O cheiro de queimado e morte. Conseguia sentir naquele momento o arrepio que percorria seu corpo toda vez que via a última luz nos olhos daqueles soldados sem esperança. Quando olhava para os céus e implorava por ajuda enquanto segurava o corpo de seus amigos. A sensação de umidade de suas bochechas causadas pelas lagrimas lembravam fielmente as primeiras gotas de chuva após a guerra. Quando rogou aos céus misericórdia por sua alma suja. Perdão pelo que fizera sem hesitar e só percebeu seus atos quando o animal desabou no chão após 1.000 dias de luta. -A quem diga que aquele soldado foi enviado pelo próprio Imperador da Noite, aquele que comandaria o submundo para salvar as almas – Comentou ele pensativo – mas quem poderia confirmar? O sanguinário guerreiro venceu a guerra em menos de 3 anos por causa das investidas dos céus e para salvar os humanos... Chen Ren desesperou se com aquela dor sufocante, e se levantou sem dar uma única desculpa por interferir na atmosfera. Seus pés alcançavam uma distância significativa e só parou quando estava do lado de fora. A brisa fria da tarde secou suas lagrimas antigas, mas não impediu de novas surgirem. -Esse sentimento é c***l, não é? – Falou Yanar Jae atrás dele com calma – traição. -Como você sabia...? – Fungou Chen Ren apertando o manto sobre o peito – eu... não... de todas as pessoas... -Não esperava isso de mim? Viemos ver algo sobre o seu passado, achei que ficaria animado em saber que mesmo que clandestinamente, sua história ainda é contada... – Comentou Jae sem emoção. -De maneira errada – Gritou Chen Ren segurando as lagrimas – soldado honroso? Ajudando humanos? Salvando alguém? Fui muitas coisas, mas não honrado ou benevolente com meus irmãos. -Talvez – Concordou Jae – a história geralmente é contada pelo lado dos vencedores, aqueles que sobreviveram levaram como algo “milagroso” ... Chen Ren, você precisa superar o seu passado se quiser ter um futuro, é c***l? Sim, mas é necessário, leve o tempo que quiser, mas precisa começar senão nunca vai sair do lugar. -Você não entende – Rosnou Ren indignado sentindo as mãos tremerem. Jae permaneceu em silencio. Deixou que o outro sentisse aquela dor e vergonha sozinho. Era c***l fazer aquilo, mas ele não estava mais aguentando. -Como você sabia? – Perguntou Chen Ren de costas com os ombros caídos – como descobriu? -Não é como se você fizesse algum esforço para esconder – Murmurou Jae se aproximando – vamos comer alguma coisa. -Não tenho fome... – Falou Chen Ren pronto para voltar para casa e chorar em posição fetal. -Volte para lá então, vou dar uma volta – Interrompeu Jae se afastando lentamente. O que...? Chen Ren estava sem palavras. Ele o deixaria naquele estado? Sozinho? Muito bem, que o fizesse então, rosnou Ren triste se afastando... não! Ele não o deixaria simplesmente ir embora assim, eles conversariam, era sobre isso que havia saído daquele quarto e não voltaria para lá no primeiro momento, mesmo que seu corpo estivesse dolorido devido aquele episódio de segundos atrás. Aquilo não era nem de perto o que já passara. Jae havia mostrado que sabia sobre seu passado então menos uma coisa para conversar, mas ele não sabia sobre Si Woo e o que ele era para si por isso estava irritado. Seguiria o concelho da dona da estalagem e conversaria, mas se no final Jae não quisesse mais vê-lo então recorreria ao que havia pensado a 500 anos. Voltaria para casa.
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