Limite de Proteção

998 Words
O quintal da mansão parecia ainda maior à noite. A escuridão emoldurava as sombras das árvores e das plantas bem cuidadas, e a brisa leve batia contra meu corpo quente, misturada com a adrenalina que me fazia sentir cada músculo pulsando. O bastão de beisebol firme na minha mão, e Isadora... grudada em mim, como se eu fosse seu escudo contra o mundo. — Isadora... volta, por favor... — a voz arrastada do cara ecoava pelo jardim. A presença dele ali, naquele horário, naquele lugar, não fazia o menor sentido. E o modo como ela congelou atrás de mim, segurando meu braço como se a vida dela dependesse daquilo, só deixava tudo mais tenso. — Enzo... é ele — ela sussurrou, a voz trêmula, os dedos finos cravados na minha pele nua. — É o Pedro. — Quem é Pedro? — perguntei sem tirar os olhos dele, apertando o bastão com mais força. — Meu ex... ele... ele não pode estar aqui, tem uma liminar, ele não pode chegar perto de mim! — agora a voz dela subia, o medo evidente, quase em desespero. — Pedro, vai embora! Vai embora agora ou vou chamar a polícia! O tal Pedro cambaleou, os olhos vermelhos e o cheiro de álcool vindo forte quando ele deu mais um passo. Ele estava mesmo bêbado, e parecia totalmente fora de controle. — Isadora, você é minha! Você sabe disso! — ele gritou, com a voz carregada de raiva e dor. — Esse cara aí? Quem é esse cara? É ele que tá te comendo agora? Senti o sangue ferver. Eu podia não suportar a Isadora e toda essa história esquisita com meu pai, mas ver aquele babaca falando assim com ela e avançando como se fosse dono de alguma coisa... era demais. — Você tem cinco segundos pra sair daqui antes que eu enfie esse bastão na sua cara, irmão — falei, firme, dando um passo à frente. — Vai me bater? Vai bater em mim por causa dela? — ele riu, um riso insano, e foi aí que a coisa estalou. Do nada, ele puxou uma faca do bolso da jaqueta. Um brilho metálico refletiu sob a luz da varanda. Isadora gritou. — ENZO! Eu não pensei. Reagi. Levantei o bastão e acertei ele de lado no ombro. Ele cambaleou, grunhiu de dor, mas ainda segurava a maldita faca. — Corre, Isadora! Chama a polícia! AGORA! — gritei, sem tirar os olhos do cara. Ela hesitou, mas quando viu que ele se reergueu e veio pra cima de mim, correu. — Filho da p— — Pedro avançou, rápido apesar da embriaguez, e a lâmina cortou o ar. Senti uma ardência forte no braço — o corte foi certeiro, superficial, mas doeu como o inferno. A dor me deu ainda mais raiva. Eu empurrei ele com o ombro, mas ele caiu por cima de mim, e começamos a rolar no chão. O bastão escapou da minha mão. Ele tentou me esfaquear de novo, mas consegui segurar o pulso dele, usando o peso do meu corpo pra desequilibrar. A faca caiu no gramado, e aí foi soco atrás de soco. Ele me xingava, cuspia, gritava o nome dela. — ISADORA É MINHA! ELA É MINHA! Até que minha mão alcançou o bastão de novo. Com um impulso, levantei, ele também, empurrei ele pra trás e dei uma paulada certeira na lateral da cabeça. Ele apagou na hora. Caiu duro, inerte, ofegando como um animal abatido. Fiquei ajoelhado, respirando pesado, o sangue escorrendo do meu braço. O corte ardia, latejava, mas o alívio de ver ele desmaiado era maior. Ouvi a sirene ao longe. A polícia chegou em segundos. Dois viaturas, faróis iluminando o jardim, agentes descendo já com as armas em punho. Isadora apareceu logo atrás, chorando, os olhos arregalados. — Ali! Foi ele! Ele tentou me matar! Eu tenho a liminar! — ela apontava, trêmula, as mãos sujas de grama e a respiração falhada. Os policiais algemaram Pedro, que ainda estava desacordado, e logo estavam revistando tudo, tirando foto, pedindo nossos depoimentos. Mostrei o corte, expliquei o que aconteceu. Isadora confirmou cada palavra, entregou a cópia da medida protetiva e foi ouvida por mais dois agentes. O tempo parecia parado. A tensão, o sangue, a dor... eu m*l percebia o frio da noite até os policiais finalmente levarem Pedro e darem a garantia de que ele seria mantido sob custódia. — Ele não vai chegar mais perto de você — disse um dos agentes a ela, que assentiu com os olhos marejados. Quando o último carro da polícia saiu, o silêncio voltou. Só o som do vento e o barulho abafado do meu coração batendo no peito. — Vem. Eu... eu vou cuidar do seu braço — Isadora falou, me puxando pela mão, devagar. Entrei com ela na mansão, sentindo o corpo dolorido. Estava suado, descabelado, e o corte ainda sangrava um pouco. Sentamos na bancada da cozinha, e ela começou a limpar o ferimento com um pano úmido. — Você foi muito corajoso, Enzo... — disse baixinho, sem me encarar. — Não fiz por você, princesa. Eu só não gosto de ver ninguém levando vantagem em cima de mim — retruquei, mesmo com o rosto tenso. Ela sorriu de canto, ajeitando um curativo sobre o corte. A mão dela era delicada, atenciosa, e a forma como me olhava agora era diferente. Menos defensiva, mais... grata. — Mesmo assim, obrigada. Se você não estivesse aqui... — Ele teria feito uma besteira — completei. O silêncio voltou por uns instantes. Ela ainda estava próxima demais. Senti o perfume doce no ar e os olhos azuis fixos nos meus. Por um segundo, pensei em perguntar mais sobre esse tal Pedro, mas eu sabia que ela falaria quando se sentisse pronta. E parte de mim... queria ouvir. Entender o que essa mulher escondia por trás dos sorrisos forçados e da pose de madame. Mas isso... era um mistério que eu só estava começando a desvendar.
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