SOL NARRANDO Saí dali com o envelope grudado no peito e as pernas bambas. O barulho de rádio, moto e serra ficou longe de repente, como se alguém tivesse baixado o volume do morro. Eu tava oco. Aquilo que ele soltou bateu num lugar que eu nem sabia que tinha: ele não sabe ler. Deu um estalo na minha cabeça e tudo que sempre me irritou nele se alinhou de um jeito dolorido: o silêncio nas mensagens, a bronca de “me liga, manda áudio”, a pressa de desligar quando eu começava a escrever… não era só grosseria. Era ferida. Fiquei lembrando de tudo que ele é — ogro, frio, ignorante no trato — e de tudo que ele nunca disse. Porque quem não sabe ler não só não lê palavra; não lê bilhete de carinho, não lê letreiro de rua quando tá perdido, não lê o próprio nome sem travar. E quem cresce sem ler,

