As descobertas / part I.( Pietro)

1774 Words
" As dores são profundas, me afogo nesse vasto oceano sem saber se algum dia serei salvo." Por: Pietro. Uma semana e três dias vivendo em plena agonia, olho através da parede de vidro da minha cobertura aqui em São Paulo, louco para sair atrás de um bagulho e acalmar meus nervos. Tudo aqui me remete aos tempos em que vivi aqui com Pâmela, cada canto, cada móvel , cada cômodo me lembra dos nossos corpos unidos sucumbindo ao prazer carnal. _ Está tenso, Pietro? - meu pai pergunta, virando a página do livro que lê. "O Asno de Ouro", único romance latino da Antiguidade a sobreviver na íntegra até os nossos dias, é de Apuleio, escrito no século II d.C. Seria a recíproca tão verdadeira, teria eu engolido uma poção, como ocorreu ao jovem personagem Lucio, que me tornou cego aos sinais, me transformando num verdadeiro asno? _ Como não estaria? Ao mesmo tempo que não quero criar expectativas por motivos bem óbvios, eu me afundaria mais ainda na escuridão que tenho presente em mim, anseio e temo pela verdade.- revelo vendo o movimento dos carros abaixo dos meus pés. _ Não era para ser assim, você deveria querer tirar a limpo a história toda, descobrir as vias de fato. O que temes, Pietro? _ Muita coisa, meu pai, mas principalmente descobrir que fui um covarde com a filha do veterinário. - falo, remoendo cada uma das cenas em que fui um escroto com a ragazza. _ Larissa não é importante, o que nós queremos e se forem seus são as crianças. Tiraremos elas da garota, e Andrea e você as criaram como filhos de vocês. Olho de soslaio para o meu pai, sem querer crer no que ouço. Larissa poderia não ser importante para eles mas é para mim e se for confirmado que as crianças são realmentes minhas, vou atrás da minha ragazza. _ Se os gêmeos forem realmente meus, ninguém vai decidir nada sobre a vida deles. Absolutamente ninguém. - falo, voltando a encarar a paisagem recheada de concreto do lado externo. _ Isso depois veremos. Vamos ao mais importante agora, buscar os resultados dos exames. - diz, fechando o livro. No dia em que minha mãe chegou, literalmente, jogando uma "bomba" em meu colo, fiquei desnorteado com tanta informação. Eu não estava nada bem psicologicamente e tudo foi demais para mim. Assim que subi e deixei meus pais sozinhos na sala, não consegui refletir sobre nada. Cada peça de roupa que eu colocava na mala era apenas o prenúncio de que eu reabriria velhas feridas e talvez retornasse muito mais machucado dessa viagem. _ Vamos? - meu pai me pergunta, levantando-se da cadeira em que está sentado e pousando o livro no assento vazio. _ Sim. - Tento acreditar nas minhas próprias palavras. Andamos até a porta e descemos pelo elevador até a garagem do prédio. Entramos no nosso carro junto com mais dois seguranças que nos aguardavam no corredor do apartamento. Pelo caminho, sigo mudo, pensando nela, na minha ragazza. Os olhos verdes assustados sob a mira de uma arma de fogo não dilui em minha mente, a forma como ela abraçou o ventre protuberante querendo proteger os.... os nossos filhos. Travo meu maxilar, fechando meus olhos, pensando o quanto fui um figlio da puttana. Quando chegamos, somos guiados pela assistente do Doutor Durand até seu consultório médico. _Buongiorno, doutor.- saúdo assim que atravesso a porta. _Bom dia, senhor Pietro. Está preparado para vermos os resultados dos exames? - diz ele com seu sotaque francês. Não, eu não estou. Apenas mantenho a minha postura austera, não abdico do ar aristocrático que permeia minha existência, precisando mais do que nunca que a casca invisível que criei em torno de mim seja forte o suficiente para aguentar ,provavelmente, a mesma pancada que me derrubou há anos. _ Estamos preparados, doutor Durand. - manifesta meu pai, sentando-se em uma poltrona confortável bem próxima da mesa do médico. _ Bom senhor, Pietro o senhor foi submetido a exames como espermograma e o teste de fragmentação do DNA espermático. O primeiro como já lhe expliquei, é a pedra angular e principal teste laboratorial envolvido na investigação da fertilidade. Os principais parâmetros analisados são concentração, morfologia e motilidade dos espermatozóides, além das características gerais da amostra, como aspecto, cor, viscosidade, volume e pH. E o segundo, o teste de fragmentação de DNA espermático avalia a integridade do material genético dos espermatozoides. Fizemos uma analise seminal, através desta é possível realizar diferentes avaliações teste de capacitação espermática, espermocultura, teste de sensibilidade aos antimicrobianos (TSA) ou também chamado de antibiograma e a pesquisa de anticorpos anti-espermatozoides. Para não haver quaisquer dúvidas. - explica nos olhando através das lentes dos seus óculos de grau. Quando Durand pega os resultados da mão de sua assistente, meu peito aperta. Será que eu teria que ouvir tudo de novo, sentir o dissabor me consumir outra vez? Fico apreensivo enquanto o médico corre seus olhos por cada folha do masso que compõem os meus exames. O médico divide seu olhar entre meu pai e eu. Dou uma olhada furtiva para Gerardo, que tem seus dedos entrelaçados com tanta força que as falanges estão esbranquiçadas. A tensão não consumia somente a mim. _ Senhores, comunico que o senhor Pietro Grecco é um homem totalmente saudável e fértil, totalmente capaz de produzir, ou melhor, reproduzir. As palavras que ouço fazem meu coração suspender suas batidas, meus olhos marejam. Levanto-me de súbito e pego os exames das mãos do médico, que estranha a minha atitude abrupta. "Corro" meus olhos, confirmando o que acabara de dizer. Como há tempos não acontecia, meu corpo é tomado por um tremor absurdo. Olho para o meu pai com lágrimas descendo pelo meu rosto. _ Pai... - palavras me faltam para exprimir o que sinto e penso. Meu peito é esmagado ,sinto-me esquentar e esfriar tão rapidamente como se eu fosse do centro da terra ao planeta mais frio que existe no universo. " Eles são meus, meus!"- a certeza inunda minha alma sombria, um crepitar de luz fagulha dentro de mim, corta-me como o raio faz com a escuridão. Gerardo se levanta e me acolhe num abraço terno. _ Parabéns, meu filho, você é pai! - diz dando tapas amistosos em minhas costas. Eu sou pai, a ficha tinha enfim caído e em seu lugar veio o remorso. Eu tinha feito uma tortura psicológica com a mãe deles, eu tinha ameaçado a existência dos três, por muito pouco quase não os matei. Me desfiz do abraço, voltei para o médico, enxugando o simbolismo da fraqueza dentro da minha organização, as lágrimas. _ Doutor, faz muito tempo minha falecida esposa tentou por muito tempo engravidar e não conseguia. Diante dessa situação fizemos exames de fertilidade, os dela ocorreram tudo bem, mas o meu deu alteração, fui considerado infértil e hoje descubro isso? Durand me olha com minúcia, retira os óculos e me fita com desvelo. _ Entendo, mas depois dos exames vocês mantiveram relações sem o uso de qualquer método contraceptivo? _ Sim, - respondo, sentindo um suor gelado escorrer por todo o meu corpo. _ Então o problema estava com ela e não com você. - diz, cruzando os braços em cima da mesa. _ Mas como? Foi um amigo dela que realizou nossos exames, um médico bem conceituado de Araçatuba! - me expresso, com o cérebro queimando diante da possibilidade de ter algo anuviado diante dos meus olhos e eu não consigo enxergar. _ Procure saber disso direito, meu rapaz. Um erro desses cabe processos. A sua história está muito estranha. - diz, colocando os óculos e virando o rosto para o monitor do computador. - Bom, peço desculpas, mas estou com outro paciente agendado para daqui a três minutos. _ Claro, doutor, agradeço por tudo. - meu pai diz. Pego a sacola com o logo do hospital particular e coloco os meus exames dentro. Deixamos o consultório para trás e minha mente revive os flashes dos momentos em que Pâmela, aos gritos, me disse que se ela não podia ser mãe, a culpa era minha por ser somente metade de um homem e não um homem completo. Das vezes que se negou a ser minha, ela bradava colérica que não via mais motivos para se deitar comigo, já que eu não fazia filhos. _ Voltaremos hoje para Alegrete, quero ir ver meus netos. - meu pai diz com os olhos brilhando. _ Não retornaremos ainda, tenho contas para acertar por aqui. - reporto-me, pensando no nome do infeliz Gabriel Barbosa Assunção. _ Siga para Araçatuba, durante o trajeto eu lhe forneço o endereço. - falo, travando meus punhos. _ Quer fazer isso hoje mesmo? Está bem para tal ato, figlio. Sabes que com sangue quente nada sai bem feito, deixamos rastros. _ Não se preocupe, pai, mais gelado do que estou, impossível.- minto, estou fervendo mais do que água de fazer café. Vinte e cinco minutos depois, estou parado na frente da casa onde o tal Gabriel reside. Lembro de estar aqui em duas ocasiões, todas duas uma confraternização que o amigo de minha falecida esposa estava oferecendo aos amigos. Aperto a campainha e, algum tempo depois, um homem barbudo segurando uma garrafa de cachaça abre o portão. _ Ora, quem aparece à minha porta depois de anos. Demorou, mas descobriu, né, o****o? - fala rindo como um alucinado, aparentando saber qual o motivo de minha presença no local. Dou um empurrão no babaca e entro no quintal, que é só mato e entulho. _ Quero saber que merda você fez nos meus exames? - pergunto, pegando ele pela gola da camisa ensebada. _ Pergunta para a sua esposinha... Ih, desculpas, esqueci que ela foi devorada pelos vermes. - ao ouvir isso, preparo meu punho para acertar o rosto do sujeito. _ Pare, Pietro. Se agir na força da raiva, não vai tirar informações desse farrapo. Ele perderá a consciência e amanhã, assim que passar o efeito do álcool, se lembrará que você esteve aqui e sumirá no mundo. - Gerado profere, atravessando o portão enferrujado. Olho para o homem que tem os cabelos desgrenhados, olhos fundos e corpo quase esquelético, vendo que ele não se parece nem com a sombra do que um dia foi. _ Anda, seu arremedo de ser humano, desembucha! - berro em seu ouvido. _ Não precisa gritar, playboy dos gados, e para começar, me larga. - diz com os dentes trincados. Solto o infeliz com brusquidão, seu corpo ondula, penso que vai cair como um fruto podre no chão, mas ele consegue, de alguma maneira, manter o equilíbrio. ■Continua...............
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