Capítulo 2

1680 Words
Nem quando comi comida entupida de pimenta na China fiquei tão nervosa como estou agora. Nunca fui boa em conhecer pessoas. Viajar fez com que eu me abrisse para o desconhecido, mas, mesmo assim, ainda fico com um pé atrás. Sempre bate um nervosismo, o que leva o meu cérebro a processar um zilhão de pensamentos negativos por segundo. Mente ansiosa é isso aí. Agora estou próxima à piscina, enfileirada com o resto das meninas. Elas estão cheias de fogo no r**o, doidinhas para conhecer os caras. Meu único desejo ainda é dar o fora daqui. Com um sorriso de orelha a orelha, Tetê prossegue: – Certo, vamos começar. Nosso primeiro participante tem vinte anos, é instrutor de bodyboard e quer encontrar a nora dos sonhos da sua mãe. Vem para cá, Allison! Um garoto com pele n***a bronzeada e vestido com uma bermuda verde com estampa de folhas põe-se diante de nós. Seus cachinhos castanho-escuros parecem pequenas molas. Seu corpo torneado atiça a ala feminina. Não me enche os olhos; nunca gostei de homens bombados. Além do mais, esse aí tem cara de pirralho. Se eu quisesse um novinho, iria para uma creche. – Seja bem-vindo, Allison – Tetê cumprimenta. – O que achou das garotas? – Lindas – ri, sem graça. Tadinho! Será que a família dele também o obrigou a se inscrever? Eu te entendo. Como te entendo! – Vamos ver se elas acharam o mesmo de você. Meninas, deem um passo para frente se curtiram o Allison. Caso mais de uma o faça, ele ganhará o poder de escolha. Lembrando que a sortuda será a parceira dele pelos próximos dias. Alguns instantes se passam, mas ninguém se movimenta. Ah, isso é meio escroto. Como podemos dizer que gostamos de alguém apenas vendo o exterior? Não sabemos nem o que ele curte, o que faz nas horas vagas ou se curte rachar a conta do restaurante. Nossa, o cara que ficar comigo vai ter um prejuízo danado. Do jeito que como, é capaz do sujeito ir à falência! – Liga não, elas estão tímidas – Tetê tenta amenizar o climão. – É porque você é o primeiro. Hellen, por que não quis o meninão aqui? – Muito novinho – Ela dá de ombros. – E você, Maya? – Não senti a vibe. – Ah, mas não tem problema. Allison, o poder está em suas mãos. Qual garota você quer como sua parceira? Allison leva alguns instantes analisando cada uma de nós, até finalmente se decidir. – Todas são muito bonitas, mas hoje vou ficar com a loirinha. Todas aplaudem quando Allison e Ariana cumprimentam-se. Ele posiciona-se ao lado da companheira enquanto Tetê continua a apresentação – O próximo gato tem trinta e três anos, é CEO de uma empresa no ramo da tecnologia e quer não só uma namorada, mas uma companheira para todas as horas. Com vocês, Benjamin. Um ruivo com barba e cabelo impecavelmente cortados coloca-se ao lado de Tetê. Um ar de seriedade paira em seu semblante, como se ele estivesse desconfortável de estar aqui. Depois de um breve papo furado, Hellen, Maya e Akemi dão um passo à frente. Benjamin elege Hellen como sua parceira, que solta um gritinho afetado de felicidade. – Já temos dois casais formados, mas será que durarão? – O rosto de Tetê expressa dúvida. – É o que saberemos a seguir. O candidato seguinte tem vinte e oito anos, é mestre de capoeira e já avisou que não aceita nada menos do que uma mulher forte, independente e bem-humorada. Chega mais, Otávio! Em seguida, um homem n***o alto e com dreads até a cintura adentra o recinto, esbanjando simpatia e irreverência. Maya passa a língua pelos lábios, como se o cara fosse uma gigante barra de chocolate. Os dois formam um casal e vão para o seu lugar. – Milene, você ainda não se candidatou para ficar com ninguém – Tetê observa. – O que está esperando? Gostaria de responder que estou aguardando uma lancha para me levar para casa, mas não quero parecer nojenta. Bem ou m*l, o programa está me dando a oportunidade de viajar de graça e ter novas experiências. Tenho que demonstrar pelo menos um pouquinho de gratidão. – Sei lá. Acho que vou saber quando o cara certo der as caras. – Quem sabe o dito cujo não é Frederico – Tetê dá uma piscadinha. – Ele tem vinte e quatro anos, é ator e modelo, nasceu e cresceu em Lisboa, e gostaria de ter alguém para curtir a vida sem arrependimentos. Um homem com madeixas loira-escuras, presas em um coque, e sorriso contagiante paira diante de nós. Possui uma barba bem aparada e olhar cativante. Percebo que algumas meninas lançam-lhe uma mirada devoradora. Reflito por um momento e dou um passo à frente, assim como todas as outras. É melhor garantir, afinal a probabilidade de alguém melhor chegar depois é praticamente nula. Além do mais, adoro homens com estilo rústico. – De repente, fiquei doida para descobrir Portugal... – Maya sussurra. – Aí Fred, está cheio de opções! – Tetê vibra. – E aí, quem vai ser seu pastelzinho de Belém? O olhar de Frederico oscila entre as garotas, até ele finalmente anunciar com um sotaque característico: – A gostosona ali. Olho para o lado algumas vezes, até cair a ficha que Frederico está falando de mim. Um misto de nojo e raiva borbulham no meu interior. Quem ele pensa que é para referir-se a mim dessa maneira? Já estou até vendo. Ele deve ser um desses caras escrotos acham que o valor de uma mulher está no tamanho da b***a e dos p****s. Como, em pleno século XXI, ainda há gente que só liga para o exterior, para a casca? Sou muito mais do que um corpinho bonito, meu povo! Ah, pelo jeito não vou engolir esse i****a nem tomando dois litros de água! Viramos parceiros há cinco segundos e já estou me arrependendo. Palminhas tímidas ecoam no ambiente. Todas ficaram desconfortáveis com a situação, inclusive a apresentadora. Com um sorrisão, Frederico tenta desferir um beijo no meu rosto, mas desvio a tempo. Minha face só consegue contorcer-se, tamanho o asco que estou sentindo. Meus pais me pagarão muito caro por isso! – Bem, quatro casais estão formados, mas tudo pode mudar. O último rapaz tem vinte e sete anos, é bombeiro e está à procura de uma namorada linda, responsável e carinhosa para apresentar para sua nonna [1]. Venha cá, Pietro! Meu queixo despenca quando um cara branquinho, de cabelo escuro arrepiado e barba bem feita põe-se diante de nós. Seu corpo é quase todo tatuado, lembrando um pouco o estilo do Adam Levine [2]. Caramba, como tenho um fraco por caras com visual de roqueiro! d***a, por que não esperei mais um pouco? Minha ansiedade ainda vai me meter em uma encrenca das grandes! Dou uma olhada ao meu redor e percebo que não sou a única em choque. Um calor me toma de súbito, como se eu estivesse na menopausa. É bom o ar-condicionado daqui estar funcionando, porque estou pegando fogo! – E aí? – Somente essas palavras são suficientes para derreter todo o lado feminino da casa. – Parece que o bombeiro está causando alguns incêndios – Tetê ri para si mesma. – Quem está a fim do Pietro, dê um passo à frente. As meninas nem hesitam em se mover. Pietro sorri, analisando cada uma cuidadosamente. Acho que seus olhos se demoram em mim, mas estou rezando tanto para ele me escolher que talvez só esteja alucinando. – Hoje escolho a japonesinha – diz, por fim. Mais uma vez, a decepção me dá a mão. Que d***a! Não basta não ser escolhida pelo cara mais lindo da casa; serei obrigada a passar meus dias com um embuste. Vai ter azar assim lá longe! Este será um longo verão... – Ai, que chato. Vou ficar com um gato desses só para mim! – Akemi solta uma risada maligna que não combina nada com seu lado fofinho. Pietro beija suas bochechas, e os dois ficam em suas posições. – Finalmente temos todos os casais – Tetê sorri, parecendo estar em um comercial de margarina. – Durante quinze dias, vocês irão conviver uns com os outros, se divertir e até dividir a cama – Todos se entreolham após a última constatação. Dividir a cama com um estranho não é uma das tarefas mais confortáveis. Não é como se a gente estivesse indo fazer um piquenique na pracinha, mas pelo menos estou acostumada. Já compartilhei quartos de hostel com catorze estranhos várias vezes durante minhas viagens. – Mas nada será simples. No Ilha do Amor, o problema pode aparecer quando vocês menos esperam. E o de vocês está prestes a surgir. Subitamente, uma ruiva de madeixas, caindo em cascata até o meio das costas, e olhar marcante surge. Ela identifica-se como Thayná, diz que tem vinte e cinco anos e é cantora de funk, atraindo olhares de desejo de todos os caras. – Amanhã, a Thayná terá que escolher um dos rapazes para ser seu par, deixando uma garota solteira e vulnerável – Tetê explica, causando pavor geral. Menos o meu, é claro. Se Thayná pegasse o Frederico, estaria me fazendo um favor. – Agora, vou deixar vocês se divertirem. Aproveitem o melhor verão de suas vidas. Tetê despede-se com um aceno e um sorriso. Ninguém realmente sabe o que dizer ou como agir. Saber que uma garota pode estar em perigo e ir para casa sem nem ter a chance de usufruir da casa não é legal. Por mais que não compreenda, sei que os participantes quiseram muito viver esta experiência. Ai, se eu pudesse abrir mão da minha vaga... Aí ninguém precisaria ir embora. – Bora abrir a champanhe? – Otávio sugere. Não há uma alma que seja contra. Pelo menos por ora, nada abalará os moradores da Ilha do Amor. Nem a possibilidade de voltar para casa com o r**o entre as pernas.   [1] Avó em italiano. [2] Vocalista do Maroon 5
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