Existem anjos por aqui

1128 Words
Acordei no outro dia depois de ter apagado do nada e percebi que tudo não se passava de um sonho. Não a parte que eu estava completamente ferrada, mas sobre o anjo. Anjos não existem, tsc! Fui tomar banho, porque precisava encontrar outro emprego urgentemente. Algum lugar que contratasse alguém sem experiência e que pagasse o suficiente para um aluguel, comida e contas. Não havia quem eu pudesse pedir ajuda, tinha descoberto da pior forma que estava sozinha, não tinha amigos de verdade. Vivi meses acreditando que estava no caminho certo até perceber que tudo era um farsa, emprego, amigos, amores... Estava em outro país, numa cidade completamente grande e agitada ao interior onde nasci, e parecia que em algum momento eu desapareceria. Mas adivinha só, minha conta de água estava atrasada, então eu ainda estava ensaboada quando a última gota caiu. Maravilha! Só faltava um apagão, que não estava longe de acontecer a julgar pela instalação elétrica ser tão velha a ponto de a luz do corredor e do meu banheiro ficarem piscando sempre que chovia forte. — Não esqueça que estou aqui! — Abel alertou quando ameacei sair do banheiro sem a toalha. Tudo bem. Não foi um sonho. Anjos existem, pelo menos aquele existia e estava vagando pelo meu apartamento como uma alma penada. Ironicamente falando, do jeito que eu era sortuda, era muito capaz que ele fosse uma alma penada, ou um anjo caído. Um primo distante de Lúcifer determinado a tornar minha vida ainda mais complicada. — Você trocou de roupa? — perguntei notando que sua roupa branca estava rosa. Devia ser algum tipo de chantagem emocional, visto que rosa era minha cor favorita. — Eu gosto mais dessa cor. — admitiu enquanto passava as páginas de um livro. — Combina comigo, não acha? Dei de ombros pegando algumas garrafas de água da geladeira para terminar meu banho. — Você nem deveria existir... — retruquei. Abel rolou os olhos passando a me encarar. — Para que isso? — apontou para as garrafas. — Sua água foi cortada? — Por que pergunta se já sabe? — resmunguei dando as costas. O anjo tinha me explicado anteriormente que viera para me ajudar a resolver meus problemas. Quase chorei de emoção depois de rir feito i****a. Tínhamos combinado de não questionar sua existência, eu no caso não poderia questionar. Mas me irritei quando em vez de me arranjar um emprego, Abel queria que eu fosse para a casa dos meus pais primeiro. Sem chance! Nem morta. — Sua energia será cortada amanhã... — ele avisou tranquilamente enquanto eu me arrumava para deixar currículos e cobrar uns favores alheios. — Me ajude a encontrar um emprego, então! — respondi ajeitando o cachecol no pescoço. — Vamos para a casa dos seus pais e eu te darei seu emprego! — devolveu se levantando do meu sofazinho. — Não vamos tomar café da manhã? — Não temos tempo para isso. E o açúcar tinha acabado, mas não quis me humilhar ao dizer isso em voz alta.Abri a porta e Abel puxou-me para dentro novamente. Lancei-lhe uma careta. — Se não quiser encontrar a dona do prédio, espere alguns minutos antes de sair. Mordi a língua e fechei a porta novamente. Se a Sra. Jackson me visse cobraria logo o aluguel atrasado e eu teria que inventar uma desculpa mirabolante, porque se ela descobrisse que eu estava desempregada, me colocaria para fora no mesmo instante. O pequeno prédio onde morava só tinha mais dois moradores, além de mim. Eu morava no apartamento do meio. Betty era a senhora que morava em cima e eu precisava suportar quando ela treinava sapateado. Sr. Martim morava embaixo e escutava música clássica até de madrugada porque tinha saudade da esposa que o deixara para fugir com um mexicano. Ou seja, era um prédio composto por velhos e eu. Todos fracassados. E ainda tinha a Sra. Jackson que morava na casa ao lado e vivia subindo e descendo as escadas do edifício para cobrar o aluguel. Desci as escadas correndo com Abel na minha cola. — Você vai se machucar se continuar correndo assim. — reclamou. — Por que ainda está aqui? Vá assombrar outra pessoa! Me deixe em paz ou chamarei um exorcista. — Com quem está falando, querida? — Betty me parou quando nos esbarrando, ela estava voltando da padaria no horário de sempre. — Com um louco que diz ser anjo. — sorri. Ela riu colocando a mão na boca, mas sempre dava para ver seu dente manchado de batom rosa. — Como é bom ser jovem! Não fique sozinha no feriado! — falou me entregando uma sacolinha quente. — Você precisa de um namorado! Eu tinha um namorado na terca-feira, mas não dava para explicar como na sexta já não o tinha mais. Também não tinha emprego, daqui a pouco não teria casa nem comida, várias reticências. — Espera aí! — parei abruptamente quando a senhora já tinha subido e Abel e eu estávamos na pequena recepção. — Ela não te viu? — Só você pode me ver! — explicou como quem está em vantagem sobre a situação. — Então, não adianta gritar comigo publicamente, só vai parecer que você enlouqueceu. — Mas eu estou enlouquecendo! — retruquei e uma mulher passou me olhando torto. Amaldiçoei mentalmente minha d***a de vida. — Isso é comida? — Abel perguntou apontando para a sacola em minha mão. — Acho que é pão pizza! — afirmei sentindo cheiro inebriante de comida. — Posso? — pediu sorrindo e entreguei bruscamente me afastando dele. — Anjos não sentem frio, mas sentem fome? — sibilei. Ele deu uma mordida no lanche e me olhou. — Comer é uma das maravilhas do mundo humano de que posso desfrutar. Não estrague meu momento, por favor! Anjos comem. Anjos trocam de roupa. Anjos existem! — Vamos dividir! — disse me entregando um pedaço Eu só aceitei, porque estava faminta e poderia comer até uma pedra se pudesse cozinhá-la. — Quando voltarmos, você pode fazer as malas — acrescentou ao assistir minha satisfação por estar comendo. — Para quê? — franzi o nariz. — Para viajar para casa dos seus pais. Dei um sorrisinho amarelo deixando aquela frase soar engraçada para não parecer uma afronta. — Você só pode estar de brincadeira! — resmunguei. — Nana, — ele me parou com seriedade — isso é importante! Você precisa ir! — Eu já disse que não vou! — berrei. — Você vai! — Não vou! — insisti. — Vai sim! — cruzou os braços. — Já disse que não! — cruzei meus braços também. — Você está falando sozinha! — informou rindo no tom de que tinha vencido a discussão só por causa daquele detalhe e******o. Estava começando a odiar os anjos.
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