➸ Chapter • 03

1072 Words
• 16 de Julho • 2022 • Londres • A luz irritava seus olhos, os barulhos eram constantes demais. — Irritante — murmurou para si mesmo enquanto andava pelos arredores do lugar. Para Ciel, 98% daquelas atitudes e pessoas não faziam o menor sentido. — Como você tem estado? — A voz abafada de Silas do outro lado da ligação era uma das poucas coisas capazes de acalmá-lo. — Bem — ele respondeu com segurança e simplicidade. Não havia muito o que falar, mas um dia uma amiga tinha dito que era educado tentar dizer mais uma palavra como resposta, então ele tentou — o dia está... nublado. Silas do outro lado da linha, segurou o riso com sua tentativa de conversação. — Entendi, mio caro, sei sicuro di stare bene? — Perguntou enquanto os gritos podiam ser ouvidos ao fundo. Ciel sentia falta daquilo, então sorriu. — Sì, zio... ma mi manca il lavoro — murmurou, aquela era a verdade mais próxima de um sentimento que Ciel nutria. — Logo te tirarei daí — Silas disse outra vez — irei falar com seu pai. Não mudaria nada, Ciel sabia disso e provavelmente diria a qualquer outro, mas não a Silas, não quando ele estava verdadeiramente tentando. — Grazie zio — ele respondeu, mas assim que suas palavras saíram, a ligação se foi. A bateria do celular havia acabado outra vez. Ciel suspirou. Ele sempre perdia a noção do tempo e sempre se esquecia de coisas bobas como aquelas. O sinal tocou alto o suficiente para incomodar os seus tímpanos e ele observou enquanto todos se dirigiam às suas salas. Ele não queria, não sentia vontade. Talvez fosse uma boa ideia dormir, mas na biblioteca não era uma boa opção; a mulher que guardava os livros sempre o dedurava e ele precisava de Silas para livrá-lo de toda a burocracia sem que desse aberturas ao seu pai ou madrasta. No fim ele não entendia onde aquela mulher queria chegar, se realmente era ao dinheiro dos Valentin, ela estava tentando errado. Não importava se ele estaria ou não lá, o filho dela jamais herdaria o negócio da família. Ele era fraco e burro, era incapaz de sobreviver sozinho então como poderia comandar todo o tráfico de drogas e prostituição na Inglaterra? Não importava se aquele garoto era seu irmão. Ele morreria antes de afundar o sobrenome do qual o seu tio tanto se orgulhava, nem que Ciel tivesse que matá-lo com suas próprias mãos. Laços para ele eram relativos, relativos até demais; o suficiente para durante um longo período de sua vida, se questionar sobre sua própria sanidade. — Deveria estar aqui? — A voz de Ian o alcançou e Ciel se deparou com o lugar onde se encontrava. A entrada do cemitério atrás da catedral. — Não — respondeu olhando para os túmulos além do moreno. Haviam muitos, todos decorados com maestria, muitos com belas estátuas esculpidas, cruzes, rosas. Aquele lugar não estava abandonado, mas raramente alguém entrava lá dentro. A verdade era que alguns dos idiotas de Villan haviam espalhado que havia demônios naquele lugar, que esperavam próximo aos túmulos para realizar seus desejos em troca de sua alma. Outros falaram que o cemitério era o lar de algo ainda pior, era o portal para o próprio inferno. Todas essas coisas eram mentiras, obviamente, mas de que adiantava falar? Humanos nunca se importavam com fatos, eles estavam ocupados demais assustando uns aos outros e trepando. Ian - era um deles. — Não está fornicando dessa vez — Ciel observou com o rosto impassível e Ian ergueu uma das sobrancelhas em descrença. — O que você pensa de mim? Ele parecia ofendido, ou ao menos era o que seu rosto demonstrava, mas Ciel não tinha certeza sobre isso. Ele não conseguia ler sentimentos tão bem quanto pensava - aprendeu isso da pior forma. — Normalmente? Não penso. Você não é um dos grandes tópicos em meus pensamentos, na verdade... nem chega perto de ser um tópico. — É por isso que você não tem amigos. Ciel inclinou a cabeça para o lado. — Porque não penso em você como um tópico? Isso não faz sentido. O moreno bateu com uma das mãos no próprio rosto. — Esquece, autista. — Se foi uma tentativa de me ofender, saiba que você errou o diagnóstico. — p**a que pariu — Ian resmungou e Ciel não conseguiu entender o que ele estava sentindo agora. Sentimentos humanos eram realmente confusos. Confusos demais. — Por que está aqui? — O moreno perguntou — achei que gostasse das aulas. Ciel negou com a cabeça. — Deixaram de ser interessantes a 6 meses. Ian bufou, era óbvio que ele odiava o lado gênio excêntrico de Ciel, mas não era algo que o platinado pudesse mudar. — Então agora fica andando pelo cemitério? Ciel assentiu. — Sinto falta dela — disse sem rodeios, porque sabia que Ian entenderia, sabia que ele dentre todos em Villan, também sentia. O moreno suspirou. — Você consegue sentir algo no fim das contas? Achei que os autistas não conseguiam ser empáticos. Ciel não sabia se ele estava ou não sendo irônico. Ele tinha estudado quando criança sobre uma das formas de lidar com seus próprios sentimentos, muitos adultos costumavam usar humor ou ironia para amenizar a carga emocional. Era isso que Ian estava fazendo ou ele só realmente era burro? — Não sou autista — Ciel disse com sinceridade — tenho síndrome de Asperger. É um estado do espectro autista. — E isso não torna tudo mais difícil de se compreender? Ciel negou. — Não é difícil de compreender, para começo de conversa, eu nunca compreendi, mas ao menos para mim é mais fácil entender o senso comum, diferente de alguém que realmente lida com o autismo — suas palavras estavam carregadas de coisas que teve que aprender desde muito cedo — eu tenho sorte. Ian assentiu. — Acho que faz sentido. — Você também sente falta dela, não sente? — Ciel perguntou e agora, seu rosto estava virado na direção do moreno, os olhos fixos no rosto andrógeno e delicado que Ian possuía. O moreno não queria falar sobre aquilo, mas sabia que Ciel não o deixaria escapar, então suspirou se dando por vencido. — Sinto. Os lábios do platinado se curvaram em um meio sorriso. Ele ao menos estava certo sobre isso, Ian, assim como ele sentia falta de Liene. ෴ ♚ ෴
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