“Foi como tomar sorrisosal para um coração partido; aliviou a dor, mas não me curou.”
Califórnia
Helena Veigas
O aroma de bacon invade a cozinha, chamando a atenção das pessoas com quem convivo. Aos vinte e dois anos, continuo na casa dos meus pais; não sou a única; meu irmão, cinco anos mais velho que eu, também está lá. Digamos que somos pássaros que se recusam a sair do ninho e voar para longe.
— O cheiro é delicioso, Helena, Carlos me elogia enquanto pega os pratos do balcão e se senta para tomar nosso café da manhã.
— Minha menina é a melhor, diz papai enquanto me bajula e se senta ao lado do meu irmão.
Espero mamãe entrar pela porta, mas ela não entra. Eu me forço a sorrir enquanto me sento na frente deles com meu prato na mão, nós provamos a comida em silêncio até que papai abre a boca:
— Ela está melhorando, crianças.
Carlos e eu ficamos em silêncio, nós dois sabemos que Fernando, nosso pai, diz que é mentira. Ela não está bem, e não temos certeza se ela vai se recuperar.
— Nós sabemos, eu respondo.
É um acordo silencioso que meu irmão e eu temos: aceitamos a mentira de papai sobre o estado mental de mamãe. Desde que me lembro, ela é uma mulher instável, mas piorou há cinco anos quando isso aconteceu. Ela não foi a única afetada, todos nós sofremos a perda, mas ela afundou ainda mais nas profundezas da depressão e gradualmente nos puxou para baixo com ela.
Acho que é por isso que não saímos, temos medo do que pode acontecer se ela sentir que a estamos abandonando. É uma culpa que nos recusamos a suportar, mais eu do que eles.
— Tenho que ir, não quero me atrasar para o trabalho. Meu irmão se levanta, deixa o prato na pia e depois me beija na cabeça. Vejo você à noite, irmãzinha. Tchau, pai.
— Tchau, filha. — Papai repete a mesma ação que meu irmão.
Deixada sozinha, arrumo a cozinha antes de pegar o outro prato de comida e levá-lo para o quarto dos meus pais no final do corredor. Abro a porta, o quarto está mergulhado na escuridão, caminho com cuidado para não tropeçar e deixo o prato na mesa de cabeceira ao lado da cama, onde mamãe está deitada com o olhar voltado para a janela. Eu me inclino sobre ela, acaricio seu cabelo emaranhado e sem brilho - não consigo lembrar da última vez que ela se deixou pentear - e beijo sua bochecha. Sinto falta dela estar conosco, dela sorrindo como se fosse a mulher mais sortuda do mundo, sinto falta de ter uma mãe.
— Eu te amo, mãe, eu sussurro.
Minha voz a tira de sua letargia, ela pisca e foca seus olhos em mim. Espero que ela me dê um sorriso, mas ela olha para mim com tanto ódio que meu coração se parte.
— Não me toque! - Ela grita, se afastando de mim. — Saia daqui!
— Mãe, por favor, eu imploro, meus olhos cheios de lágrimas.
— Você é uma assassina! Eu não quero te ver! Você o tirou de mim, você tirou meu bebê de mim.
— Mãe...
— Vá embora!
Ela continua gritando mesmo quando eu saio do quarto, encostada na porta com a mão no peito, como se isso pudesse aliviar a dor que sinto com sua acusação. Toda vez que tento me aproximar dela, para fazê-la ver que a amo, ela me trata da mesma forma. E ela tem razão, afinal, a culpa é minha que ele se foi, mas ela é a única que ousa me dizer na minha cara.
Com o corpo mais pesado, subo as escadas até o segundo andar para terminar de me arrumar para o trabalho. Quando termino, pego minha bolsa e desço assim que a campainha toca. Dou um meio sorriso quando vejo Mirella, a mulher que cuida da mãe enquanto trabalhamos.
— Bom dia, Helena, ela me cumprimenta quando entro.
— Bom dia, Helena. Deixei o almoço pronto, assim como os remédios, você deve tomá-los...
— Entre as refeições, eu sei. - Ela me interrompe. — Eu vou cuidar bem dela, agora vá.
Ela agarra meus ombros e me empurra em direção à saída, depois fecha a porta na minha cara, mas não sem antes sorrir para mim. Suspiro, ela faz isso toda vez que fico tensa aqui em casa. Respiro fundo, entro na rua e finjo que não há nada de errado em casa. Hoje não posso me dar ao luxo de ser invadida por pensamentos negativos; estou começando um novo emprego.
Sempre adorei cozinhar, é algo que minha mãe e eu compartilhamos, então quando me ofereceram o cargo de chef confeiteira na cafeteria Global, não pude recusar. Além de estar localizada em uma multinacional farmacêutica, também é a maior do setor no país, então farei o meu melhor para satisfazer os funcionários que trabalham lá e que precisam de uma boa xícara de café para melhorar o seu dia.
Não foi só isso que me fez aceitar, mas também foi influenciado pelo fator de ter liberdade criativa, desde que a maioria dos meus preparativos incluísse chocolate. Eu disse que sim e lá fui eu, a caminho de um trabalho que deveria me encher de felicidade, mas, ao mesmo tempo, me faz sentir culpado porque não poderei cuidar da mamãe.
Não é como se ela quisesse me ver, lembro a mim mesmo.
Quando inspeciono a propriedade, mostro meu passe quando o segurança na entrada me pede e vou até a cafeteria e ele me dá sinal verde. Vim aqui no dia anterior para me familiarizar com tudo e não perder minutos valiosos aqui; então corro para deixar minhas coisas no armário, visto meu uniforme e abro meu livro de receitas para começar a trabalhar.
A primeira coisa que faço é café e chocolate quente e depois começo a fazer donuts, biscoitos, croissant e bolos. Faço tudo o mais rápido que posso, pois abro para o público às nove da manhã. Por enquanto, serei o único a fazer tudo, mas espero ter suporte na próxima semana. O lado bom é que fecho às três da tarde, um luxo que não poderia pagar em outros empregos.
No horário marcado, abro a porta e, para minha surpresa, já há pessoas esperando para serem atendidas. Com um sorriso gentil, fico atrás do balcão e começo a receber pedidos. Pego, mas não cobro porque são debitados na conta dos funcionários.
— Quem é você e onde esteve esse tempo todo? - Uma voz de mulher me faz olhar para cima. — O aroma dos seus preparos é perceptível da entrada deveria estar de dieta, não deveria estar comendo nada disso, mas não consigo resistir.
— Eu... - Fico em silêncio, pois não sei o que dizer sobre a conversa.
— Meu nome é Joelma, um prazer, ela estende a mão para mim.
— Prazer em conhecê-la, sou Helena, digo ao mesmo tempo.
— Minha nova amiga, ela suspira como se estivesse apaixonada, "vou tomar uma xícara de café, alguns donuts e uma fatia de bolo de chocolate. Se eu for pecar, vou pecar em abundância.
— Ok! - preparei o pedido dela e entreguei a ela. — Acho que posso preparar versões mais saudáveis para você.
— Você faria isso por mim? - Para minha surpresa, seus olhos se encheram de lágrimas.
— Eu disse algo errado?
— Não, está tudo bem. - respondo com alguma dúvida.
— Você me chamar de Lena. Mais do que perfeito. — Eu te promovo como melhor amiga. É o máximo, Helena.
— Eu vou! - Você grita enquanto ela sai correndo.
Isso foi estranho. Dou de ombros e continuo cuidando das pessoas até não sobrar ninguém. Viro as costas para o balcão para organizar as porções quando ouço alguém entrar. Meu sorriso congela ao ver o homem na minha frente; ele é alto, muito alto, seu cabelo é preto, seus olhos são cinza e são emoldurados por cílios abundantes que dão intensidade ao seu olhar. Ele tem uma barba cuidadosamente aparada e, quando sorri para mim, rugas aparecem nos cantos dos olhos.
Nunca vi um homem tão bonito quanto ele.
— Posso ajudá-lo, senhor? - pergunto quando recupero a compostura.
A atenção ele me dá faz minhas bochechas corarem, um ato que não consigo esconder devido à palidez da minha pele.
— Você é nova, ele diz.
— Sim! Eu digo.
— Eu gostaria de um café preto sozinho. E uma fatia de bolo de cenoura, eu senti o cheiro desde que entrei. Tem um cheiro delicioso. - Bajulação.
Eu coro mais do que rapidamente. Minhas mãos estão tremendo enquanto preparo o que ele pediu, felizmente posso fazer isso sem molhar nada.
— Espero que goste, senhor, eu digo enquanto o entrego.
— Será. - Ele deixa a frase pairando no ar.
— Helena, eu digo.
— Tenho certeza de que vou gostar, Helena. - Ele acena na minha direção e se vira, então vira a cabeça e olha para mim - Eu sou Leonardo Salvatore, tenho certeza de que você me verá aqui com frequência.
— Leonardo, ele sussurra seu nome.
Meu coração vira de cabeça para baixo com a ideia de vê-lo com mais frequência. Minha mente corre com as possíveis melhorias que posso fazer na minha receita, o que for preciso para mantê-lo feliz e vindo me ver.