Ponto de vista de terceira pessoa
Na manhã seguinte, Logan despertou em seu apartamento. O ambiente estava surpreendentemente calmo — calmo até demais, considerando o tipo de vida que levava. Mas essa paz logo foi quebrada por uma cena, no mínimo, inusitada.
No corredor, G.E.S.S. e Lucy discutiam. O garoto parecia estar em plena campanha de sedução, embora com resultados nada promissores.
— Me dá uma chance, gatinha... Eu posso fazer de tudo pra você gostar de mim — dizia ele com um sorriso confiante.
Lucy apenas balançou a cabeça em negação, o semblante carregado de tédio e impaciência.
— Garoto, você nem tem idade pra estar pensando nesse tipo de relacionamento.
Apesar da negativa, G.E.S.S. permanecia impassível, determinado como um cão de guarda em missão. Logan, no entanto, não demonstrou qualquer interesse na cena. Passou direto, ignorando o teatrinho como quem já estava acostumado a presenciar situações absurdas antes mesmo do café da manhã.
Seguiu para a cozinha. Puxou um bloco de notas e começou a rabiscar algumas ideias. Poucos minutos depois, já estava fazendo ligações. Contatou velhos conhecidos do submundo, articulando a venda da carga que haviam roubado do laboratório da Pegasus Med.
Negócio é negócio — e para Logan, aquela manhã prometia render mais do que apenas café.
Era um protótipo de armadura de combate. À primeira vista, lembrava uma conversão corporal para um full borg, mas com uma diferença crucial: não exigia qualquer cirurgia. O traje parecia incorporar uma tecnologia de simbiose neural, algo que se conectava diretamente ao córtex cerebral. Em nível nanotecnológico, a armadura se moldava ao corpo do usuário, adaptando-se à pele em escala molecular. Era como se ela se tornasse uma extensão natural do próprio corpo.
Os contatos de Logan haviam conseguido um comprador disposto a pagar 500 mil eurodólares. Meio milhão. Era dinheiro pra cäralho. E, como Kira havia deixado claro: quem pegasse o que conseguisse carregar, era dono. Aquele traje agora era dele. Só dele. Logan sorriu ao se lembrar disso, voltando a fitar os rascunhos e anotações no bloco de papel — esquemas, ideias, possibilidades que ele ainda mäl conseguia colocar direito no papel.
Lucy e G.E.S.S. entraram na cozinha logo depois, provavelmente em busca de algo para comer. Mas Logan estava completamente absorto, mergulhado nas suas anotações e rabiscos — ou ao menos tentativas de desenho — a ponto de sequer ter se lembrado de preparar qualquer coisa.
De repente, o interfone tocou.
O som estridente o fez saltar levemente na cadeira. Ele franziu o cenho, confuso. Em todo o tempo que morava ali, nunca havia sequer encostado naquele aparelho.
"— Logan falando."
"— Senhor Logan, aqui embaixo tem dois caras... bem, estranhos. Disseram que os nomes são Dragon e Ivan." O tom do porteiro do condomínio, Francisco, soava claramente apreensivo e desconfiado.
"— Ah, pode deixar eles entrarem." respondeu Logan com total despreocupação, como se fossem velhos conhecidos.
Francisco deu de ombros, ainda franzindo a testa com a sensação de que aquilo não era exatamente normal. Mesmo assim, apertou o botão de liberação e permitiu a entrada dos dois visitantes.
Ivan e Dragon atravessaram o saguão do condomínio como se estivessem indo a uma festa, animados como duas crianças em dia de parque. A empolgação quase saltava dos olhos deles.
Ao chegarem ao apartamento, a porta se abriu e, por um momento, o silêncio os envolveu. Ambos encararam Logan com sorrisos largos e cheios de expectativa.
"— Aí, estamos aqui! Você falou que poderíamos ter uma oportunidade juntos!" disse Ivan, claramente animado — e convenientemente se esquecendo do tom intimidador da conversa anterior, que agora parecia relembrar com um brilho romantizado nos olhos.
FLASHBACK
"— Vocês viram como ela matou dois de vocês com apenas um movimento... Mas estou disposto a lhes dar a chance de viver mais um dia — e de se tornarem homens melhores." disse Logan, com um tom firme, oferecendo uma nova oportunidade.
Com essas palavras, Logan conseguiu convencê-los. Dragon e Ivan, diante da brutalidade que presenciaram e da chance inesperada, decidiram abandonar a vida que levavam e agarrar a possibilidade de recomeçar sob uma nova perspectiva.
FIM DO FLASHBACK
Logan, ao relembrar como tudo de fato aconteceu, acaba se compadecendo e compreendendo a visão dos dois homens recém-reabilitados, aceitando sem resistência a versão "reformulada" por eles.
— Ok. Estou esperando uma grana pela carga que negociei e vou começar a desenvolver um projeto particular. Se quiserem, podem fazer parte da gangue que estou fundando. Vamos ajudar as pessoas, e farei as coisas do meu jeito. — Logan fala com empolgação genuína, parecendo uma criança prestes a ganhar seu brinquedo favorito na véspera de Natal.
Depois de algum tempo de conversa, Logan recebe uma ligação confirmando que começará a receber várias transferências, totalizando o valor de 500 mil eurodólares. Logo as notificações começam a pipocar: 10 mil, 50 mil, 25 mil, 42 mil... valores variados que, ao fim, somam os tão aguardados 500 mil. Logan sorri, satisfeito — agora meio milhão mais rico.
— Aí, Ivan, Dragon, vamos sair. Temos que fazer umas compras. Esse apartamento até que é grande, mas não tem segurança nenhuma e m*l oferece qualidade de vida. — diz Logan, empolgado, já se preparando para sair.
Lucy e G.E.S.S perguntam se podem ir junto. O garoto, no entanto, aproveita a oportunidade para desabafar:
— Logan e eu? O que vai ser de mim? Eu tinha razões para trabalhar com a Pegasus Med. Agora... o que vai ser de mim? — As palavras de G.E.S.S saem quase como um sussurro, carregadas de incerteza e melancolia. Havia algo doloroso em suas palavras.
Mas Logan estava imerso em sua missão. Sua prioridade, naquele momento, era garantir conforto, segurança e uma nova vida para os membros da gangue que pretendia formar — um grupo que ele esperaria para promover a mudança que tanto desejava.
Nas ruas, a agitação. Shoppings enormes, zonas residenciais misturadas ao comércio, e prédios de mais de 100 andares abarrotados de gente.
Logan elabora sua lista de desejos — e não só do que precisava, mas também de tudo aquilo que nunca teve e agora podia adquirir. De loja em loja, vai comprando: móveis encomendados sob medida para o apartamento, itens de segurança como alarmes, travas, bombas de luz, apagadores automáticos, películas reforçadas para as janelas e outros tantos objetos — alguns essenciais, outros nem tanto.
No caminho, Ivan e Dragon param abruptamente diante de uma loja. Olham para Logan com olhos de cachorro abandonado. Logan segue o olhar deles até a vitrine e logo entende o motivo. Sem dizer uma palavra, entra com eles.
— Bom dia! Eu sou Augusto, e vocês estão na loja de artigos esportivos de última geração! — diz o vendedor, animado. O entusiasmo fazia sentido: Logan podia não ser musculoso, mas os dois brutamontes atrás dele pareciam saídos de um ringue.
— Podem escolher o que for necessário pra começar um treino. Nada muito pesado, um treino mediano. — diz Logan, já testando alguns halteres.
— Vamos montar uma academia de responsa no apê! — exclama Ivan, animado, empilhando barras e halteres de 10 a 100 kg como se fossem feitos de isopor.
Enquanto isso, G.E.S.S observa em silêncio, pensando se ele também teria acesso a computadores, internet, e toda a estrutura necessária para trabalhar com segurança e eficiência.
— Ei, Logan, eu também preciso de alguns equipamentos pro apartamento. Pra melhorar meu acesso à rede e o desempenho das minhas ações. E, bom... alguns programas são meio caros. — fala de forma tímida, quase pedindo desculpas.
— Claro! Vamos providenciar tudo isso ainda hoje. Esse apartamento vai ficar top. — responde Logan, entusiasmado.
Lucy, sem perder tempo e muito menos com timidez, também entra no jogo:
— Ué, e por que não montar um pequeno centro de trauma? Nada muito grande, só o básico: uma maca, suporte de soro, freezer, armário pra medicamentos, aparelhos de raio-X, ultrassom, desfibrilador, respirador... E claro, bisturis, agulhas, colas cirúrgicas, esse tipo de coisa.
A lista dela era extensa — e direta. Logan, apesar de começar a se sentir levemente sobrecarregado, também se sentia realizado. Estava criando algo. Estava construindo.
Quando finalmente termina de adquirir tudo, já passam das oito da noite. Está faminto, sedento e exausto. O cansaço mental começa a pesar.
— Terminamos por aqui. Vamos embora, galera. Amanhã começam as entregas, e teremos muito trabalho pra organizar o espaço. — diz Logan, saindo do shopping com um largo sorriso no rosto.
Todos retornam juntos ao apartamento. Cada um deles com suas próprias ideias, planos e esperanças para o futuro.
Não muito longe dali, o dia também chega ao fim. Chang Liu sai do estúdio de gravação quando recebe uma ligação sobre um show especial. O local do evento é um tanto inusitado, mas o pagämento é generoso. Os medicamentos que havia negociado — por estarem sem nota fiscal — não renderam muito. Recebeu apenas 75 mil eurodólares, já que além da falta de documentação, o extravio dos remédios havia sido denunciado anteriormente.
Apesar do valor considerável, Chang não se apresenta apenas pelo dinheiro. Ele ama sua banda, ama estar no palco. E, como todo astro que se preze, também ama garotas, drogas, bebidas e reputação — exatamente nessa ordem.
Ele aceita o show: será em um galpão localizado numa área industrial da Zona Norte. O evento reunirá figurões envolvidos com o tráfïco de drögas e armas ilegais — uma mistura perigosa, mas lucrativa.
Antes de encerrar o dia, Chang liga para Logan. A intenção é dupla: descobrir se o velho conhecido está por dentro da negociação e, claro, satisfazer sua curiosidade. No fim das contas, um astro prevenido vale por dois — talvez três, dependendo de quantos copos já tenha virado naquela noite.