006: Megan Kanka

2129 Words
— Todos eles, no mesmo lugar. Jongin observava as seis fotos espalhada pela mesa da modesta lanchonete, fora o lugar mais discreto que conseguiram encontrar próximo ao hospital, haviam tantas pessoas apressadas e ocupadas ali que ninguém parecia os notar, que da mesma forma, estavam absortos demais em um assunto para prestar atenção no dos outros. Eram fotos tão iguais que pareciam ter sido tiradas da mesma pessoa, a tatuagem com os mesmos números se repetia com a mesma caligrafia em todas elas, podendo deixar claro que se tratava de um trabalho muito profissional, ou simplesmente feito pela mesma pessoa. 1998, Made In Korea. Aquele número não lhe parecia mais ser uma data de nascimento, as fotos nas fotos seguintes eram muito diferentes, com pessoas de idades muito distintas, indo de crianças até idosos. — Chanyeol, o que é... — Um código de identificação, não da vítima, mas sim de seus sequestradores. — o Park bateu com o indicador em uma das fotos, fazendo o médico olhar bem para ela — Uma quadrilha especializada em tráfico humano, que atua em diversas áreas e se divide em grupos, o  1998 sequestra ômegas de diversas idades e os vende para qualquer pessoa de mente doentia que queira comprar, não se preocupam com a finalidade. — Finalidade? — Brinquedo s****l, escravo particular ou até mesmo para pegar seus órgãos e transplantar em outras pessoas. — Chanyeol não conseguia se manter impassível enquanto falava, até mesmo para ele, um policial com mais de 10 anos de carreira, dava agonia pensar em alguém fazendo isso — Mas tem uma coisa errada. Jongin ergueu os olhos, sentiu-se estranho, as coisas já estavam ruins o suficiente. — Consegue notar algo em comum nas vítimas? O Kim olhou novamente para as fotos, eram simplesmente o rosto de várias pessoas e também uma foto da parte de trás de seus corpos, mais precisamente suas costas, dando bastante ênfase na tatuagem em suas nucas. Olhou por longos segundos, finalmente se dando do que não havia ali, e havia em Kyungsoo. — A pele não tem arranhões. — Analisei bem as fotos que me mandou dele, ele se machucou bastante no acidente, mas há várias cicatrizes que não condizem, algumas antigas e outras nem tanto, queimaduras de cigarro e até mesmo algo como um chicote ou até mesmo uma corda fina. Você é médico, sabe o que pode ser causado em um acidente de ônibus e o que não pode ser causado. — o Park soltou o ar dos pulmões, fechou os olhos por mais de dois segundos e os abriu — Ele já estava machucado quando foi levado pela 1998, alguém estava com ele antes, fazendo sabe-se lá o que, e por algum motivo precisou se desfazer dele. Se desfazer, era como se falasse de um objeto quebrado. — Se desfazer... — Jongin, precisamos continuar, essas pessoas precisam ser presas, precisa incentivar o ômega a lembrar, ele é a única vítima viva disso, pode ajudar a polícia a prender essa quadrilha, ou pelo menos, salvar nem que seja apenas mais uma pessoa inocente disso. — Chanyeol falava sério, conhecia Jongin há muitos anos e sabia o quanto ele poderia ser sensível a coisas assim, sabia que a qualquer momento o Kim poderia optar por parar. Optar por proteger o ômega de coisas tão horríveis em seu passado. — Lembrar disso vai machucá-lo. — E não lembrar disso vai deixar que outras pessoas se machuquem. Às vezes odiava Chanyeol por ser tão bom com as palavras, odiava seu senso de sempre querer proteger os outros. Ele era um médico, estava ali para cuidar e presar pela vida. Mas o bem estar de Kyungsoo precisava mesmo ser sacrificado? Ele não sabia como se portar a partir dali, se sentia dividido ao meio. Se pudesse, evitaria toda a dor.     [...]     — O que está fazendo? Jongin chegara mais cedo naquele dia, ainda estava de tarde, algo que pegou o ômega baixinho de surpresa. Ficara entediado quando a bateria de seu celular acabou, um pouco triste ao lembrar do médico lhe dizendo para não mexer nele enquanto ainda estivesse carregando. Passara um pouco do tempo vendo televisão, mas a desligou após tocar na tele e sentir que estava muito quente. Achou que ela poderia explodir. Teve outra lembrança naquele momento, onde ele estava sentado no chão vendo TV, uma TV pequena e nem antiga, a imagem era muito r**m e não conseguia se recordar dela, lembrava de ter visto alguém passando, alguém que não conseguia ver o rosto, lembrava daquela mesma pessoa lhe dizendo que a TV estava quente e que ela iria explodir, e logo então a desligar. Lhe dava angustia lembrar de qualquer coisa que fosse, um arrepio na espinha. Logo depois procurara algo a mais para fazer, parando para observar o restante das coisas na sala, e um pequeno móvel num cantinho meio esquecido, que só passava por ali para tirar a poeira, mas nunca abria sua grande gaveta. Era um toca disco velho, mas muito bem conservado, e que por algum motivo combinava com aquele ambiente e com a pessoa que morava ali. Jongin tinha um ar nostálgico, por mais que Kyungsoo não conhecesse direito essa palavra. — Eu não sabia que gostava de coisas antigos. — Eu também sou antigo, quando meu pai comprou isso eu tinha sete anos. — não era bem de sua época, já haviam CD’s, mas os discos ainda não haviam sido completamente abandonados — Lembro que a minha mãe adorou tanto que não nos deixava mexer porque iriamos acabar estragando os discos dela. Kyungsoo riu, imaginava um Jongin ainda criança e certamente uma criança bagunceira. — Ainda funciona. — Sério? — estranhamente aquilo deixara o ômega muito animado — Podemos ouvir um? O alfa sentou no chão ao seu lado, dentro da grande gaveta havia uma boa quantidade de discos, a maioria com capas autografadas, guardara com todo cuidado os itens de colecionador do seu pai, um legitimo fã do Blues. Aqueles discos traziam muitas lembranças boas, em muitas delas estava sentado na sala com seus irmãos enquanto viam seus pais dançarem ao som de Nina Simone. — Não conheço nenhuma dessas pessoas, mas não é como se eu conhecesse algum. — Kyungsoo riu de si mesmo, às vezes Jongin sentia que ele gostava de não se lembrar de nada. E sabia muito bem o porquê. — Billie Holiday, era o favorito do meu pai. — dissera assim que se ergueu do chão para poder ligar o toca discos e pôr aquele para rodar — Me impressiono como essa agulha continua boa. Uma melodia bonita começou a soar pela casa, em um ritmo que o ômega não lembrava de já ter sido apresentado. Era bom, o deixava calmo de certa forma. Jongin poderia discorrer sobre a canção de 1952, Blue Moon era a favorita na hora do jantar por ser calma e elegante. Sua mãe gostava de parecer elegante. — Meus pais adoravam dançar, eles diziam que deveríamos dançar enquanto nossos quadris fossem flexíveis, pois um dia seriamos velhos cheios de dores na bacia. — o alfa dizia enquanto começava a se mexer de um lado para o outro com passos que só faziam sentido em sua cabeça — Vem, dança comigo! Quando o moreno lhe estendeu as duas mãos para que levantasse, Kyungsoo se sentiu envergonhado, não sabia se um dia já havia dançado uma musica assim com alguém, mas a ideia de dançar com Jongin deixava seu rosto completamente vermelho. E não havia motivos para não tentar. Ficou de pé e experimentou ir de um lado para o outro como o mais alto também fazia, ele continuou a segurar suas mãos e a sorrir, como alguém que muito se divertia. O ômega ainda estava meio travado, talvez pela timidez ou pela falta de prática com aquilo. — Pise nos meus pés. — Hum? — Coloque os seus pés sobre os meus. Olhou pra baixo ainda mais tímido, mas fez o que ele pediu, pisando com a pontinha de seus pés descalços sobre os pés descalços do Kim. Os pés de Kyungsoo eram tão pequenininhos que m*l faziam pressão, tinha espaço suficiente para eles sobre o peito do pé do mais alto. Jongin foi de um lado para o outro, e para manter o ômega bem equilibrado sobre ele, o segurou pela cintura com uma das mãos. — Acho que a balança estava errada, você deve pesar só uns 30kg. — Eu não peso só 30kg. — ele riu. Por alguns segundos o baixinho acabou esquecendo das coisas ao seu redor, e por aquele momento ele sentiu que não se importava mais com o seu passado, pois estava muito feliz com o presente que tinha. Que gostava dali, que gostava de estar com Jongin e ter a proteção dele. E se para ter Jongin para sempre ele precisava abrir mão de todo o seu passado, ele abriria. Não queria saber o que havia acontecido, pois sabia que não era bom, não lembrava de coisas boas, tudo o que tinha de seu passado eram flashs e coisas ruins e sem sentido. O presente era melhor. Ele tinha que ficar no presente. E fora num desses pensamentos que subitamente abraçou o alfa, o rodeando com os dois braços e o apertando com toda a força de seu corpo, quase como se temesse que a qualquer momento ele fosse simplesmente desaparecer como as miragens que viu nos filmes de deserto. Enfiou seu rosto no peito do moreno, segurando toda a vontade que tinha de chorar, um choro que não fazia sentido de existir naquele momento, mas que insistia que deveria acontecer. Ele queria chorar porque estava com medo de perder a única coisa que o deixava feliz. — Você está bem? — o alfa questionou confuso com a atitude inesperada. — Estou muito bem. — era a sua resposta mais sincera — Acho que nunca estive tão bem quanto estou agora, quero ficar assim pra sempre. Jongin alisou seus cabelos e o apertou mais entre seus braços, com cuidado para não ferir suas costelas ainda em recuperação. Kyungsoo ficou ainda mais pequeno, mais frágil, ele parecia um vidro fino que quebraria caso o vento batesse nele.     [...]     Estava escuro, muito escuro, toda a luz que havia no quarto vinha unicamente por baixo da porta. Sentia frio e medo, muito medo. Ouvia vozes lá fora e quando tentou gritar por ajuda percebeu que sua boca estava tapada com alguma coisa. Tentou se mexer, mas estava amarrado e jogado sobre uma cama. Se sacudiu diversas vezes e tentou fazer algum som, mas sua garganta doía quando tentava. Sacudiu-se mais e mais até cair da cama, causando um baque surdo no chão. Tinha panos ali, panos que abafaram o som de sua queda e ninguém lá fora o ouviu. Se sacudiu ainda mais e tentou rolar para o lado procurando por qualquer coisa que pudesse fazer algum barulho, até finalmente chutar a perna de uma cadeira e alguma coisa cair no chão emitindo um som alto. As vozes pararam por poucos segundos, mas depois recomeçaram. Tentou fazer mais barulhos, mas não achou mais nada para derrubar em meio àquela escuridão. Mais longas horas se passaram, e só então a porta foi aberta. Alguém passou por ela, e quando pensou que seria socorrido, entrou em pânico ao ouvir um som irritadiço, e um soco forte acertar seu rosto. E então acordou. Seu rosto estava embebido em suor, não havia notado que estava gritando, percebendo isso apenas quando sentiu um abraço forte ao redor de seu corpo e uma voz pedindo para que se acalmasse. Aquela voz o acalmava, e aos poucos sentiu-se voltando para a realidade. — Fique calmo, eu estou aqui. — Jongin alisou seus cabelos e o trouxe ainda mais para perto, Kyungsoo chorava tanto que molhava toda a camisa do outro — Não precisa chorar, você não corre perigo, ninguém vai te machucar. — Jongin... era horrível. — Foi só um sonho, fique calmo. O ômega afastara seu corpo meio abrupto, focando diretamente nos olhos do moreno, ele precisava que Jongin acreditasse nele. — Não foi só um sonho, foi real, aquilo aconteceu, eu sinto isso. — O que aconteceu? — tinha medo de perguntar — O que você viu no seu sonho? Os olhos do ômega tremiam como se aquele quem o feriu ainda estivesse ali, ainda o tocasse, ainda estivesse socando o seu rosto naquele exato momento. Por um momento sentiu todas as suas cicatrizes doerem como se estivesse sendo ferido agora. Segurou com força uma das mãos do médico e a trouxe para junto do corpo, como se somente o contato dele pudesse lhe dar coragem para qualquer coisa que fosse. — Eu me vi... Jongin, eu era só uma criança.
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