Na manhã seguinte, o sol ainda m*l havia rompido o horizonte quando Francesca Cavalcante já estava sentada à sua escrivaninha.
O quarto era amplo, imponente, decorado com cortinas pesadas e móveis escuros. Sobre a mesa, repousava um maço de cartas seladas e uma pena mergulhada em tinta preta.
Ela escrevia com calma, a caligrafia precisa e elegante.Cada palavra era um golpe silencioso, um fio a mais em sua teia de manipulação.
"Às filhas do senhor Frederic Pérez,"
"Em reconhecimento aos serviços prestados por vosso pai à madeireira e à boa reputação que ainda conserva, a família Cavalcante deseja oferecer uma oportunidade de trabalho honesto e digno, como forma de quitar a dívida que vosso pai estende.Precisamos de uma jovem discreta e educada para atuar como dama de companhia em nossa casa, auxiliando nos cuidados domésticos e na organização de pequenos eventos.Aguardamos resposta o quanto antes."—Francesca di Cavalcante
Depois, selou o envelope com o brasão da família e o entregou a um criado que aguardava na porta.
— Leve isto à casa dos Pérez — ordenou. — Entregue diretamente à mais velha das filhas. Seja educado, mas não aceite recusa. Diga que é uma oferta de boa vontade… de minha parte.
O criado assentiu e partiu imediatamente.
Francesca recostou-se na poltrona e deixou escapar um pequeno suspiro.Seus olhos, porém, brilhavam frios como o vidro de uma taça.
Logo em seguida, sua criada de confiança Lourdes entrou no quarto com um sorriso largo de quem já era acostuma as maldades de sua patroa.
— Com licença senhora, está..radiante hoje
Ela sorriu sem olhar para ela.
— Estou fazendo as coisas seguirem conforme eu desejo, querida.
— Isso tem a ver com o senhor seu filho, senhora ?
Ela finalmente a fitou com um ar de desdém.
— Meu filho está prestes a manchar o nome que construímos por gerações. Se ele não tem juízo, alguém precisa tê-lo por ele.
Lourdes deu uma risada breve, seca, tão c***l quanto sua patroa.
— E o que pretende fazer com a pobre moça?
— Nada que o destino já não lhe preparasse, — respondeu Francesca, voltando o olhar para o papel. — Ela será útil à família. E, quem sabe, aprendendo a servir, compreenderá a distância entre uma casa nobre e uma cabana de madeira seca.
Lourdes ficou em silêncio.
Sabia que, quando Francesca tomava uma decisão ninguém ousava contradizê-la.
Enquanto isso, no vilarejo, o mensageiro montado a cavalo se aproximava da casa dos Pérez.O sol dourava os campos e a poeira subia sob os cascos do animal.
Teresa, a irmã mais velha, estava no quintal, estendendo roupas, quando viu o brasão prateado no envelope e o nome “Cavalcante” gravado na cera.Seu coração gelou.
— O que eles querem agora? — murmurou, levando o envelope às mãos trêmulas.
Lá dentro, Amélie ouviu a movimentação e saiu para o pátio, curiosa.Quando viu o símbolo da família que tanto a inquietava, sentiu um arrepio percorrer-lhe a espinha.
Teresa leu a carta em silêncio.
Ao terminar, olhou para as irmãs com os olhos arregalados.
— Eles… estão oferecendo um trabalho.
Amélie franziu o cenho, desconfiada.
— Um trabalho? Na casa dos Cavalcante?
Teresa assentiu, mas a voz falhou:
— Sim. Querem uma de nós como dama de companhia.
As irmãs se entreolharam em um silêncio pesado, como se cada uma pensasse o mesmo isso não era uma oferta, era uma armadilha.E do outro lado da cidade, em seu quarto, Francesca sorria levemente, observando o jardim pela janela.O jogo havia começado e ela sabia que Amélie, cedo ou tarde, seria levada até ela.