Capítulo 8. Desespero

477 Words
A noite caiu lentamente sobre a pequena cidade, trazendo consigo o frio e o cheiro de lenha queimada. Dentro da casa dos Pérez, as lamparinas tremiam, lançando sombras nas paredes gastas. As irmãs ainda estavam acordadas o jantar esfriava sobre a mesa, intocado. Amélie, sentada perto da janela, segurava o rosário que pertencera à mãe. Teresa olhava para a porta a cada som que o vento fazia, inquieta. Isabel costurava apenas por não saber o que fazer com as mãos. Quando finalmente ouviram o rangido da fechadura, todas se levantaram. Frederic entrou cambaleante, o casaco molhado de orvalho. O cheiro de vinho o precedeu. Seus olhos fundos revelavam exaustão, vergonha e algo mais desespero. — Papá… — começou Teresa, com voz suave. — Estávamos preocupadas. Ele jogou o chapéu sobre a mesa, evitando olhá-las. — Não precisam se preocupar comigo. — Sua voz estava rouca. — Preocupem-se em dormir. Clara se aproximou devagar. — O senhor não comeu nada o dia todo… — Eu não tenho fome! — rosnou, batendo a mão na mesa com força. O som ecoou pela casa, fazendo Amélie se encolher no canto. Teresa manteve o tom firme, mas compassivo. — Papá, nós sabemos. Os Cavalcante estiveram com o senhor hoje, não foi? Ele se virou, os olhos avermelhados, a expressão tomada por um misto de raiva e vergonha. — Isso não é assunto para vocês! — Como não seria? — rebateu Clara, a voz embargada. — São nossas vidas também! Frederic inspirou fundo, os punhos fechados. — Vocês não entendem o que estão dizendo. Amélie levantou-se, os olhos marejados. — Papá, nós só queremos ajudar. Por favor… fale conosco. A doçura na voz dela o atingiu mais do que qualquer acusação.Mas o orgulho e o medo falaram mais alto. — Ajudar? — Ele riu, amargo. — O que uma menina como você pode fazer, Amélie? Hã? Pagar minhas dívidas com suas preces? Ela recuou, ferida. Teresa, enfurecida, deu um passo à frente. — Não fale com ela assim! Frederic passou as mãos pelo rosto, como se tentasse apagar tudo. — Basta! — gritou, virando-se para a porta. — Eu já tenho peso demais sobre mim. Não me façam carregar o de vocês também! E, sem esperar resposta, saiu novamente, batendo a porta com força. O silêncio que ficou foi devastador. Isabel começou a chorar baixinho. Clara correu para trancar a porta, com medo que ele saísse novamente. Teresa respirou fundo, tentando conter as lágrimas. Amélie ficou imóvel por um instante, o rosário ainda nas mãos, os olhos fixos na porta. Quando falou, sua voz era apenas um sussurro: — Ele não está mais lutando… Teresa se aproximou, abraçando-a. — Então teremos que lutar por ele. E, enquanto o vento frio entrava pelas frestas da janela, as quatro irmãs entenderam algo terrível estava prestes a acontecer, e nenhuma delas tinha poder para detê-lo.
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