4- FUGIR

1023 Words
Capítulo 4 EDUARDA NARRANDO Voltei pra casa com o coração apertado, o pensamento longe, o corpo pesado. A caminhada até o apartamento foi quase no automático. Eu ainda tava processando tudo que Milena tinha me contado. O morro, o casamento com o sub… aquela nova realidade que me esperava no dia seguinte. As ruas estavam vazias, o vento batia gelado, e eu só queria um banho quente e paz. Mas a paz não me esperava. Quando virei a esquina da minha rua, vi o farol do carro aceso. Um carro parado, do outro lado da calçada, com o motor ligado. Armei o passo. Desviei o olhar, mas meu peito já avisava: era ele. O carro avançou com tudo. Tive que pular pro lado pra não ser atropelada. O coração disparou. As mãos tremiam. A adrenalina subiu como uma onda. A porta se abriu com força, e antes que eu pudesse correr ou gritar, ele já tava na minha frente. Fernando. — Achou que podia sumir de mim assim, Eduarda? — ele rosnou, os olhos vermelhos de ódio. — Você tá maluco?! — gritei, dando um passo pra trás. Mas ele avançou. Me agarrou pelo pescoço com força e me empurrou contra o muro. — EU TE AVISEI QUE NÃO ERA PRA ME DESAFIAR! — ele gritou, o rosto colado no meu, o hálito quente e nojento me sufocando mais que a própria mão. Tentei me soltar, bati no peito dele, arranhei o braço, me debati. — Solta… me solta… — eu sussurrava, sem fôlego. Ele apertava cada vez mais. — Tu acha que vai pro Rio, fingir que é livre? Fingir que é santa? Tu é minha, Eduarda. Minha! — ele cuspiu, descontrolado. Tudo começou a ficar escuro. O ar não entrava. As forças estavam indo embora. Mas então… Uma buzina. Um grito. Um barulho de vidro quebrando. Alguém se meteu. Fernando largou meu pescoço e deu dois passos pra trás, assustado. Eu caí de joelhos no chão, engasgada, puxando o ar como se fosse a última coisa que me restava no mundo. Ouvi alguém gritar.... – JÁ CHAMEI A POLÍCIA! E vi ele correr pro carro, arrancar com tudo, sumindo na esquina feito o covarde que sempre foi. Fiquei ali, tremendo, com a mão no pescoço e o corpo todo em choque. E naquele momento, eu soube que não dava mais pra fingir que tava segura. Fiquei ali no chão, com a mão no pescoço, o corpo inteiro tremendo e a respiração falhada. Tentando entender se aquilo tinha mesmo acontecido, ou se eu tava presa num pesadelo. — Ei, moça, tá tudo bem? Quer dizer, você consegue falar? Levantei os olhos devagar. Um homem mais velho, de moletom e capacete na mão, se aproximou com cuidado, sem fazer movimentos bruscos. A moto dele tava estacionada no meio da rua, com o farol ainda aceso. — Eu vi tudo daqui. Tava vindo da padaria quando escutei os gritos. Você quer que eu te leve na delegacia? Balancei a cabeça devagar, tentando recuperar a voz. — N-não… obrigada… já vai ser pior se eu for lá de novo. Eles não fazem nada… ele tem amigos lá dentro — consegui dizer, com a garganta ardendo. Ele me olhou com pena. Mas não insistiu. — Você quer que eu te acompanhe até em casa? — Não precisa. Já tô perto… Obrigada, de verdade. Ele assentiu, me ajudou a levantar com delicadeza. As pernas estavam bambas, como se fossem feitas de papel molhado. — Fica com Deus, moça. E qualquer coisa, eu moro ali na esquina. 102. Assenti, forçando um sorriso fraco. — Obrigada, de coração. Ele se afastou, e eu fiquei parada por alguns segundos, até ter certeza de que conseguia andar sozinha. Segui até meu prédio. Cada passo era um esforço. Cada batida do coração parecia um soco por dentro. Entrei no apartamento, tranquei a porta com todas as voltas possíveis e escorreguei pela parede até o chão. E aí… desabei. Chorei baixinho, com a mão na boca, como fazia antigamente. Como nos dias em que ele gritava e batia, e eu precisava engolir o choro pra ele não ouvir. Mas agora ele não tava mais aqui. Agora eu tava sozinha. E mesmo assim, eu estava com medo. Fiquei ali, sentada no chão frio da sala, abraçada em mim mesma, tentando recuperar alguma coragem. Amanhã de manhã eu pegava o vôo pro Rio. E dessa vez, eu não ia olhar pra trás. Porque se ficasse mais um dia aqui… Talvez não sobrasse nada de mim. Fiquei ali no chão da sala, abraçada nas próprias pernas, com o rosto enterrado nos joelhos e o coração doendo como se tivesse sido rasgado com a unha. As lágrimas desciam quentes, silenciosas, como se cada uma carregasse um pedaço do que sobrou de mim. Eu não conseguia parar de tremer. Não era só pelo susto, era por tudo. Por tudo que eu engoli calada. A dor física do pescoço era mínima perto do que tava me corroendo por dentro. Eu voltei. Voltei a me sentir fraca. Voltei a sentir medo de abrir a porta, medo do escuro, medo de mim mesma. Depois de tudo que fiz pra sair daquela prisão, ele ainda me achava propriedade dele. Como se minha vida fosse um bem pessoal. Como se meu corpo fosse um território que ele podia invadir quando quisesse. A verdade era clara. Se eu não fugisse agora… ele ia me matar. Talvez não com arma. Talvez não com faca. Mas aos poucos. Na força, no grito, no sufoco. Limpei o rosto com a manga da blusa, fungando. Eu precisava ir embora de vez. Não era mais sobre a conferência. Não era sobre uma pausa. Era sobre salvar o que restava de mim. Eu ia pro Rio. Ia ficar com a Milena. Ia sumir por uns dias, umas semanas, o tempo que fosse preciso. Ia deixar ele falar sozinho. Ia deixar a dor falar sozinha. Porque eu não ia ser mais mulher de ameaça nenhuma. Não ia ser mais a mulher que sobrevive calada. Eu precisava sair dessa vida, fugir dele e viver em paz. Continua...... Deixem bilhetinhos 📚❤️
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