Capítulo 63.

1426 Words
Manu narrando Entro em casa e, como esperado, a sala está vazia. O silêncio é tão grande que até os meus passos no chão parecem ecoar. Vou direto para o quarto da Any, já sabendo que ela deve estar acordada. E, claro, não erro. Ela está deitada, com o cabelo bagunçado, segurando um livro. Manu: Amiga, foi m*l pelo horário. – Digo, me encostando na porta, já pronta para ouvir alguma bronca. Ela coloca o livro na cabeceira e senta na cama, me olhando daquele jeito dela: um misto de seriedade e deboche. Any: Eu até queria te esfolar viva, mas já tá tão quebradinha que resolvi te poupar. – Ela diz rindo, e eu acabo rindo junto, enquanto me jogo na cama dela. Manu: Amiga, tô rindo agora, mas foi horrível. – Falo, puxando o edredom dela pra me cobrir, me ajeitando ao seu lado. Any: Pelo jeito, os safanões do Terror não serviram de nada, né, sua safada? – Ela solta uma gargalhada, e eu escondo o rosto no travesseiro, rindo também. – Já que tava se enfiando com ele até agora, eu desisto de te salvar. Tu tá perdida. Manu: Culpa do seu irmão, que me cercou na subida do morro. – Tento me defender, mas sem muita convicção. Any: E tu caiu na lábia do Rodrigo? – Pergunta rindo. Manu: Cai. – Admito, enquanto ela gargalha mais ainda. – Mas, na real, eu também queria ir. Precisava, sabe? Colocar um ponto final nessa história. – Acrescento, ficando séria de repente. Any: E conseguiu? – Ela me encara com curiosidade. Manu: Sim. – Respondo com um aceno de cabeça, tentando disfarçar o nó na garganta. Any: Deixa eu ver isso. – Ela pega meu braço engessado com cuidado, balançando a cabeça negativamente. – Deve ter ficado bem feio, né? Manu: Tá de boa agora. Tirando a parte que não dá pra coçar o cu. – Respondo, soltando uma risada, e ela se joga na cama, rindo alto também. Any: Ridícula! – Ela me dá um tapa leve no ombro. Manu: Ai, tá doendo! – Resmungo, fingindo um choro dramático, mas ela me acerta com um travesseiro na cara, nos fazendo rir ainda mais. Any: Não tava doendo quando ganhou esse chupão no peito, né? – Ela aponta para o decote, e eu tento esconder a marca com a mão, mas só conseguimos rir mais alto. O tempo passa entre risadas e provocações, até eu finalmente tomar coragem de falar o que estou enrolando desde que entrei. Manu: Vou mudar. – Solto de uma vez, olhando pra ela. Any: O quê? Tá puxando um agora, fia? – Ela pergunta, ainda rindo, mas logo senta na cama, ficando séria. Manu: Consegui um apartamento, amiga. Não fica longe, dá pra gente se ver direto. – Digo, tentando soar otimista. Any: Por que você vai mudar? É por causa do Renan? Se for, eu posso falar com ele. Sei lá, eu fico lá. Mas não precisa se mudar, pô! Manu: Não tem nada a ver com o Renan. – Respondo, suspirando. – Tá, já pensei nisso, dar mais privacidade pra vocês. Mas o real motivo é que não quero mais ficar perto do Terror. Ela franze o cenho, surpresa. Any: Ele te ameaçou? Manu: Não. Mas foi horrível, amiga. Tudo que ele falou, as coisas que aconteceram... Any: E, mesmo assim, tu ficou com ele? Manu: Fiquei. – Admito, respirando fundo. – Eu gosto dele. Ele pediu perdão. A gente junto é tipo fogo e gasolina, sabe? Mas não dá, amiga. Eu não quero acabar igual minha mãe. Decidi me mudar porque não consigo ficar aqui vendo ele como se nada tivesse acontecido. Ela abaixa a cabeça, suspirando, mas depois me encara de novo. Any: O coração é igual fígado com cirrose. Sabe que não pode beber, mas insiste. – Ela brinca, e acabamos rindo juntas. – Mas me diz: tu tem como se manter lá? Manu: Caraca, ótima comparação. – Respondo rindo. – O apartamento é da tia da Lavínia. Any: Aposto que vai morar no morro dela. Você vive me largando por essas minas: Larissa, Bruna, agora essa daí. – Ela diz, fingindo indiferença, mas dá pra sentir o ciúme disfarçado. Manu: Não é lá. Errou. – Respondo rindo, abraçando ela por trás. – Amiga, você é a número um pra sempre, tá? Te amo. Any: Hum... também te amo. – Ela murmura, fingindo birra, mas logo sorri. – E arruma meu quarto lá, hein. Manu: Com certeza! Vai dormir comigo. – Respondo, e nos abraçamos de lado. – E o que deu com a Bruna e o L7? Vou ligar pra ela mais tarde. Any: Nada... Ela aceitou o chifre, como sempre. Manu: Sério? Any: Aquela ali é corna de carteirinha. Não larga ele porque adora o status de ser "mulher de bandido". Aceita tudo e, por isso, ele não muda. Manu: Nossa, achei que ela ia pelo menos dar uma dura nele. Any: Ele gosta de trair, e ela gosta de fingir que tá tudo bem, desde que ele banque o luxo dela. – Fala com indiferença, dando de ombros. (...) Acordo cedo e começo a ajeitar minhas coisas. E vou direto pro banho, saio do banheiro e visto uma calça jeans cintura alta e uma blusa de alcinha branca. Enquanto escovo os dentes, recebo uma mensagem da Lavínia com a localização do apartamento e a confirmação de que posso ir hoje mesmo. Respondo rápido, dizendo que já vou levar tudo de uma vez. Melhor acabar logo com isso. Aproveito o tempo e mando mensagem pro RD pedindo ajuda com as malas. Ele responde que tá chegando em alguns minutos. Deixo a casa arrumada pra Any. Como ela saiu pro trabalho muito cedo não vou conseguir me despedir. Vou ter que voltar depois pra pegar algumas coisas que ficaram pra trás. Isso me dá uma chance de me despedir direito, mas é estranho sair sem vê-la. Ouço uma buzina lá fora e respiro fundo, pegando as bolsas. RD já tá fora do carro, encostado na porta, e vem me ajudar. Ele coloca as malas no porta-malas e liga o som baixinho assim que entro. Seguimos em silêncio até a barreira. Ao chegar, descemos, e eu lhe mostro a localização. Ele pega meu celular verificando o endereço. Analisa por uns segundos e me devolve, pensando em algo. RD: Queria ir contigo, mas se eu for capaz de não voltar. Os verme tão na cola. Manu: Não precisa, amigo. Eu chamo um Uber. Obrigada de verdade. – Respondo, sorrindo, e ele me puxa pra um abraço de lado. RD: Jaé. – Concorda com a cabeça e pega o celular que vibra alto com uma notificação. Ele lê rápido, faz um gesto para um dos rapazes na barreira, e logo o moleque aparece ao lado dele. RD troca algumas palavras com ele antes de se virar pra mim. RD: Vitinho vai te levar lá, ele tá limpo. Manu: Não precisa, sério. Vitinho: Que isso, mina? Eu te levo, de boa. RD: Ele tem cara de psicopata, mas é de confiança. – Brinca, rindo, enquanto Vitinho faz cara de indignado. – Só tem a cara de maníaco. Manu: Credo. – Respondo rindo, e eles caem na risada. Vitinho vai buscar o carro estacionado e encosta ao nosso lado em poucos minutos. RD me faz sinal com a cabeça. RD: Pode ir tranquila. Manu: Obrigada. E se cuida, tá? – Digo, antes de entrar no carro. RD: Cuidado com a patroa! – Ele diz, batendo no vidro do lado do motorista, com um sorriso brincalhão. Respondo com o dedo do meio, rindo junto. Fecho a porta e, enquanto o carro começa a andar, meu olhar se prende ao retrovisor. No reflexo, vejo uma moto encostando na barreira. É idêntica à do Terror. Meu coração acelera, e sinto um calor estranho subir pelo peito. Será que ele veio se despedir? A pergunta ecoa na minha mente enquanto tento desviar o olhar, mas é impossível. A moto permanece imóvel, o piloto parado, como se estivesse me observando. Meu coração aperta, e as lágrimas começam a ameaçar cair. Respiro fundo, tentando me segurar. Não posso ceder agora. Preciso acreditar que isso é o melhor. Mesmo que lá no fundo, cada parte de mim queira parar o carro, descer e correr até ele. Mas eu não corro. Não posso. A moto continua parada, e sinto um pedaço de mim se quebrar mais a cada segundo. Aperto as mãos no joelho. Vai ser melhor assim, repito pra mim mesma, tentando acreditar de verdade.
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