Caroline Matolly Narrando
- Não sei explicar com palavras o que estou vivendo na associação, parece que eu nasci pra isso. Cuidar da comunidade e em troca receber essa demonstração de afeto que eu nunca tive, to feliz demais. Quando o Diego me leva pro trabalho, é um tal de oi aqui e oi ali hahahahah ele fala até que estou parecendo vereadora.
- Eu e Diego chegamos a um nível da nossa relação que por um momento pensei que fosse impossível, sabe. A gente não briga, não se desentende daquela forma de antes. Em um mês, aprendemos muito um com o outro e isso só fortaleceu nosso relacionamento, a gente é literalmente parceiro um do outro. Eu chego em casa, faço nossa janta e conto o meu dia todo pra ele, ele me escuta e ainda interage comigo. Assim como as questões dele com a boca, sei que ele não me conta tudo, porque de fato tem coisas que eu prefiro não saber, ainda mais sobre morte, tenho pavor. Desse lado dele, prefiro deixar do portão pra fora. Estamos trabalhando muito que não estamos tendo tempo um para o outro, também não to tendo tempo quase de me cuidar, fazer algo para sair da rotina também.
- Não tive mais problemas com essas ratas do morro, também elas rezam pra ver o d***o e não me ver hahahahah.
- Luana fecha juntinho comigo aqui, tudo a gente resolve. Fazemos reuniões atrás de reuniões para sempre deixar tudo alinhado e para melhorias. Encontramos um fornecedor de kits de material escolar e a gente já está providenciando também. Acho que a educação é o que salva a vida das pessoas, ninguém tira o seu conhecimento. E de uma certa forma, você colocar isso na cabeça das crianças, vai ajudar elas a abrirem novos horizontes. Não é que moram em uma comunidade, que você tem que ser bandido ou coisas do tipo. Você pode ser um médico ou o que você quiser ser. Foco muito nessa tecla com os pequenos, até porque só eu sei o que passo com o Diego, o fato de ter ele hoje e dormir na insegurança de saber que posso não tê-lo amanhã.
- Hoje decidi me cuidar um pouco, ir no salão e fazer tudo o que eu preciso fazer e vou chamar a Luana, nem só de trabalhos se vive uma mulher. A gente trabalha na mesma sala, mas ela foi lá fora e ainda não voltou, então vou lá ver o que tá pegando. Levantei e fui até a frente da associação e ela estava conversando com um menino, me aproximei devagar para não assustar, ele estava com uma carinha triste, de partir o coração.
Caroline: Oi, está tudo bem aqui?
Luana: Ele disse que não sabe da mãe dele, ela saiu desde ontem e ele dormiu sozinho. Mas veio fazer as atividades para não perder. - Falou inconformada com a situação.
Caroline: Oi meu amor, fala pra tia o seu nome e aonde você mora? - Disse me abaixando na sua frente, ele não deve ter uns 7 anos cara, que triste
Gael: Oi tia, meu nome é Gael e o seu? Eu moro ali pra baixo, em um dos barracos dos predinhos. - Falou apontando pra onde era mais ou menos.
Caroline: Meu nome é Caroline, você tá com fome? Vamos ali dentro que a tia vai te dar alguma coisa pra você comer e uma atividade pra você fazer. Tá bom? - Disse meio nervosa com a situação.
- Levamos ele pra dentro e Luana me olhando, querendo falar algo. Mas fiz sinal com a mão pra ela esperar, não é legal falar sobre isso na frente dele. Pedi para uma das meninas que trabalham aqui, dar algo saudável pra ele comer e uma atividade, fomos pra nossa sala conversar.
Luana: Cara, que loucura é essa? Como a mãe some e deixa essa criança sozinha? Isso não entra na minha cabeça. - Falou indignada.
Caroline: Também não entra na minha, precisamos passar esse caso para os meninos. Vou ligar para o Diego. - Disse pegando meu celular.
- Ligação On..
Digão: Fala minha rainha, tá tudo tega por aí?
Caroline: Não muito, você pode vir aqui?
Digão: Qual foi? To indo ai, aconteceu alguma parada? Fala logo.
Caroline: Aqui eu falo, fica tranquilo.
Digão: ta, to chegando.
Caroline: Ok, bj.
- Ligação Of.
- Não demorou muito e ele e o VT entraram na associação vindo até a nossa sala, eles brincaram com o Gael na sala, então sinal que conhecem o menino.
Digão: Qual foi, o que ta pegando? - Falou sentando na cadeira.
Caroline: A Luana estava la fora conversando com esse menino, ele disse que a mãe dele está sumida desde ontem e que ele veio pra cá sozinho, fazer as atividades dele.
Digão: A mãe dele é viciada, mas quem cuida dele é a avó. Vou lá perguntar cadê a avó dele. - Falou saindo da sala com o VT.
VT: Qual foi menor, cadê tua avó? - Falou se abaixando até a mesinha que ele estava sentado comendo.
Gael: Tio, minha avó morreu. - Falou meio cabisbaixo.
Digão: Quando foi isso menor? - Falou preocupado.
Gael: Tio, ela já estava doente. Ai ela foi pro postinho e ficou internada e nunca mais voltou. - Falou triste.
Digão: Já é menor, fica triste não que o tio vai atrás da sua mãe, enquanto isso você fica aqui com nós, já é? - Falou fazendo carinho na cabeça dele.
Gael: Tio, ela sempre sai e me deixa sozinho. Mas ela volta, só que dessa vez ela não voltou e eu fiquei sozinho. - Falou triste mas como se isso já fosse normal.
VT: Nós vai atrás dela, você não pode ficar sozinho e não vai ficar sozinho. Pode ficar tranquilo, já é?
Gael: Ta bom, tio. Posso comer mais comida? Estou desde ontem sem comer e minha barriga já estava doendo. - Falou e isso acabou com a minha estrutura.
Caroline: Claro que pode, a tia vai colocar mais pra você.- Disse e a menina que trabalha com a gente já pegou o prato dele para colocar mais comida.
- Os meninos saíram da associação em busca da mãe desse menino lindo. Espero que achem, mas meu coração está apertado ao ver essa situação.
- Ele é lindo, moreno com os olhos claros, cabelo cacheado. Parece um príncipe e já está passando por tudo isso, a vida é bem injusta com uns. Essa criança só precisa de cuidados, educação e muito amor, mas olha a estrutura que ele não tem? É difícil pensar nisso.
- Fiquei ali ajudando ele com as atividades e decidi dar um banho nele, aqui tem roupas para doações lavadas. Então peguei uma muda de roupas e chamei ele para o banheiro com a ajuda da Luana.
Gael: Tias, vocês não podem me ver pelado. Eu já sei tomar banho sozinho.
Luana: Então tá bom, se você precisar de ajuda, chama a gente. Tá?
Gael: Tá bom, mas já sou homem tia, sei me virar. Vou tomar banho direitinho.
Caroline: Ta bom hahahahah quero só ver.
- Saímos do banheiro deixando ele lá dentro, mas atentas caso ele precise de ajuda. É legal ver ele sendo independente, mas isso não é parte do seu desenvolvimento e sim por não ter escolhas. Ele se virava pra tomar banho ou ficava sem.