Os Greccos

2006 Words
Capítulo-I. Os Greccos " Se um dia na Calábria anda, ouvirá falar sobre os Greccos clã que domina o lugar com punhos de ferro." Hadassa. Se eu tivesse um espelho na minha frente nesse momento, daria para ver se estou pálida ou verde. Mas, na realidade, sei que estou sob o efeito tremendo de um nervosismo. Faz poucos minutos que cheguei à Calábria para ficar, precisamente, com a família do meu futuro noivo, sob o jugo do Don, o líder do clã Greco. Se não bastasse isso, tenho certeza absoluta de que meus dias não vão ser nada fáceis nessa casa. Está bem viva em minha memória a cena em que Dante me pegou perto da porta do escritório, tentando ouvir uma conversa. As lembranças ainda estão frescas em minha mente, como tinta recém-aplicada no fundo de uma madeira. De repente, a porta se abriu e eu rapidamente me apressei em abrir um sorriso enorme, querendo disfarçar. Minhas bochechas queimavam. Eu tinha sido pega no flagra na casa de um Don, em território que não era o meu, fazendo algo que, segundo o julgamento deles, é imperdoável de expiar. Os olhos de Dante brilharam feito aço molhado, e eu tive que controlar as muitas asas batendo dentro do meu estômago. Não era momento para borboleta nenhuma alçar voo. — A senhorita deseja alguma coisa? — perguntou, com um tom de sarcasmo. Vi quando ele estreitou o olhar. Senti medo, porque o rosto dele não estava nada amigável. Qual seria a sentença para alguém que tenta escutar atrás das portas, dentro do território calabrês? Eu sinceramente não queria saber. Por isso dei a primeira desculpa que me veio à mente: — O senhor me perdoe, eu estava procurando um brinco... acho que perdi ele por aqui. Olhei para o chão, fingindo estar realmente procurando alguma coisa. Dante deu um passo, fechou a porta atrás de si e me deixou alguns segundos em silêncio. Quando dei uma olhadinha de leve para ele, vi a sua boca fechada em uma linha dura. — Se refere a qual brinco? A esse que está em vossas orelhas? Passei a mão rapidamente nas orelhas e fiquei pálida feito um fantasma. Os brincos estavam ali. Que raios! Eu poderia ter inventado uma desculpa melhor. Talvez dizer que perdi uma lente de contato — podia até ser uma lente transparente, apenas para enxergar melhor, não para mudar a cor dos olhos. Sorri sem graça. Ele deu mais um passo em minha direção, dessa vez de forma ameaçadora. Eu quase fiz xixi nas calças de tanto medo. Meu coração bateu de um jeito diferente... mas, apesar disso, eu me senti ainda mais atraída. Encarei-o como um mistério que eu queria desvendar. — Escuta aqui, menina. Se tem algo que eu odeio é mentira. Não pense que vai estar dentro do seio da minha família e usar de artimanhas, porque não terei pena nenhuma em te castigar. Aqui as regras são outras. Não confunda a minha casa com a sua casa. Não me confunda com seu pai ou com seus irmãos. Se eu tiver que cortar suas orelhas por descobrir que estava ouvindo atrás da porta, você ficará sem as orelhas. O gelo percorreu minha espinha. — Assim também será se abrir a boca para falar qualquer coisa que ouvir por aqui. Tenha em mente que você não faz parte da família ainda. Ser uma possível noiva de um Greco não significa ser uma Greco. Assuntos de trabalho não chegarão até você, e seus questionamentos não serão respondidos. Preocupe-se em mostrar-se apta a fazer parte desta família. Fiquei morrendo de raiva. Quase gritei: alguém me arruma uma arma que eu quero dar um tiro na cabeça desse miserável! Mas tive que engolir todas as bolas de espinho, jurando vingança. Ah, como eu queria dar um cuecão nele — puxar suas cuecas por trás até entrarem todinhas no meio da b***a, juntando p***o, ovo, tudo, fazendo aquele omelete. Tive que me conter, por mais que algo em mim vibrasse, pedindo para que eu não me mantivesse calada. — Sabe... acho que o senhor está enganado. Na sua família não tem tantas regras assim não. Porque, se tivesse, Renzo não teria aquela cara de marginal safado, sem vergonha. Falei com a cara e com a coragem, mesmo tentando manter meus pés firmes no salto fino. Maldita hora em que deixei minha mãe escolher minha roupa e meus sapatos. O vestido não tinha nada de atrativo, nenhum decote para exibir meus s***s, e o salto era tão alto que me fazia andar nas pontas dos pés. Virei o corpo para sair de sua presença, dura, tensa, parecendo um robô. Mas ele segurou meu braço com força. E eu gostei. Por muito pouco não perguntei se ele também queria dar um tapa na minha b***a. Não sabia onde estava com a cabeça... ou sabia: estava nele. Eu queria que fosse daqueles homens atacantes, que vêm para cima, pegam de jeito, puxam pelo cabelo. Podíamos muito bem estar trancados em alguma porta daquele espaço, nos beijando, nos acariciando e deixando o mundo se explodir, dando uma banana para todas as regras da máfia. Sim, era só uma alucinação minha. Mas sonhar não custa nada. — Tenha cuidado, senhorita Falzoni, ao se referir ao meu irmão nesse tom pejorativo. Não se esqueça que Renzo nunca está sozinho. Eu sou como a sombra dele. Ninguém encosta no meu irmão sem passar antes por mim. Vi, naquele momento, minhas esperanças de trocar Renzo por Dante indo embora. Ele parecia fiel demais ao irmão, a esse amor fraternal. Então me lembrei dos meus, que também tinham lealdade entre si, apesar de todas as divergências. — E se eu disser ao senhor que não quero me casar com seu irmão? O que faria? Dante riu, um sorriso cheio de sarcasmo. Então segurou meu pescoço e me levou de costas até a parede oposta. — Você é o valor cobrado por uma ajuda, no tempo em que seu irmão veio até mim. Então, minha cara, não há escolha. Senti-me usada, uma moeda de troca. Algo banalizado, sendo que eu sou uma pessoa, não um objeto. Segurei a mão dele com força, sem deixar meu olhar vacilar, encarando aquelas duas gemas acinzentadas que agora pareciam um buraco n***o me sugando. — Não pense que terá de mim uma cunhada que abaixa a cabeça. Não serei uma cunhada que se cala diante dos mandos e desmandos. — Você é uma garota mimada e malcriada. Mas, com o tempo, entenderá que não existe escolha. Apenas obediência. Quis muito dar-lhe um chute no meio das pernas, uma joelhada nos países baixos. Mas me controlei. Estávamos em menor número, em território proibido. Não sairíamos vivos se eu atacasse logo o chefe do bando. Dante largou meu pescoço. Ele não apertara, apenas me mantivera imóvel. Depois saiu, dando uma olhadinha por cima do ombro, me deixando parada feito uma i*****l no meio do corredor. Eu o odiei. Xinguei-o de todos os nomes na minha mente. E, como a Mariane sempre fala, dei os dedos pelas costas, murmurando baixinho: — Enfia o dedo no c* e rasga. Nervosa, passei as mãos pelos cabelos e andei dura até a sala. Quando cheguei, olhei bem nos olhos da minha mãe. — Eu não fico aqui nem um minuto! Suspenda essa porcaria de casamento, porque não vou ser mulher de ninguém! Dona Gema arregalou os olhos. A xícara em sua mão quase caiu. Ao lado, estavam a senhora Larissa, a bruxa, e mais uma jovem me olhando. — Meu Deus, o que é isso? Eu não te dei essa educação! — minha mãe me repreendeu entre dentes. Se eu fosse menor de idade, acho que levaria uma surra ali mesmo. — Algum problema, criança? — perguntou a bruxinha, se aproximando lentamente com um vestido preto. Paralisei. Depois coloquei as mãos na cintura. — A senhora faz porção de chá de sumiço e também de semancol? Se tiver, eu compro dose dupla: o de sumiço pra mim e o de semancol para... Não consegui terminar, porque o abençoado surgiu na sala, feito um demônio querendo atormentar meu juízo. Dante estava ali, com o olhar pousado sobre mim, me avaliando. Eu morria de ódio dele. — Olá, você deve ser a noiva do Renzo? — a menina perguntou, me olhando com estranhamento. Virei na direção dela. Vi que estava espantada com meu jeito. Mas eu usava de subterfúgio para não explodir e não ir feito uma ariranha para cima do Dante. — Pelo que consta, parece que sou eu, né? Vou ter que encarar essa parada aí. — Hadassa! Que linguajar é esse?! — Dona Gemma levou a mão ao peito, como se tivesse sentido uma dor forte. Sua expressão era de puro horror. — Com a Mariane, mãe, com quem mais? — respondi. Dona Gemma se sentou, levou a mão à lateral da cabeça e fez movimentos circulares. — Creio que esses quinze dias longe de Mariane farão muito bem a você... Meu Deus amado, onde seu irmão foi arrumar aquela garota? — Onde, mãe? Na favela! — falei. — Ela contou pra todo mundo que veio da favela do Brasil. — Dio Santo! Porcapipa! — minha mãe exclamou, tensa. A menina se aproximou, estendeu a mão para mim e em seguida me deu um abraço. — Meu nome é Vitória, sou irmã do Renzo. E fico feliz em ver que ele terá uma noiva linda como você. — Ela não é bonita? — perguntou. Eu comecei a tremer inteira. Meu coração acelerou tanto que achei que cairia dura ali mesmo. Dentro da minha mente, uma vozinha gritava: diz que sim, diz que sim, diz que sim! Dante não disse nada. Simplesmente virou de costas e sumiu pelo corredor. Fiquei totalmente sem graça. A menina deu de ombros. Sentamos na sala, provamos do chá e dos biscoitos que estavam dispostos na bandeja. Eu comi cinco, mesmo sem vontade, porque minha raiva era tamanha. Minutos depois, meu irmão e meu pai saíram do escritório, conversando e sorrindo, sem vestígio de briga ou de vozes alteradas. Achei que retornaríamos para a Sicília e que, em uma data pré-agendada, eu voltaria para a Calábria. Mas não foi o que ocorreu. Dois dias depois, meus pais embarcaram para a Sicília e eu fui trazida por um motorista da família Greco até a mansão. No meu primeiro dia, fiquei mais trancada no quarto do que qualquer outra coisa. Só desci para fazer as refeições, sempre acompanhada da senhora Larissa e da filha mais nova — uma menina baixinha, muito calma por sinal. — A senhora mora aqui? — perguntei durante o café da manhã. — Não, essa casa é do Don. Apenas ele vive aqui com Renzo. E é sobre isso que quero conversar com você. Meu filho é o próprio fogo, por isso não adicione gasolina. Congelei, sem saber o que dizer. — Seja calmaria. Seja o que Renzo precisa para ser um homem centrado. Balancei a cabeça. A senhora Greco estava depositando em mim a esperança de ser a corda para puxar Renzo do precipício. Então algo passou pela minha cabeça: vou viver aqui sozinha com eles? — Não, estaremos sempre aqui, durante esses quinze dias. É uma estadia para nos acostumarmos contigo. — Hã, entendi... Mentira. Não tinha entendido nada. Já estava tudo muito confuso, e eu também não fazia questão de compreender muita coisa. Só esperava que esses quinze dias passassem rápido, para que percebessem que eu não sou a noiva perfeita para Renzo e, assim, procurassem outra para ocupar o meu lugar. Está sendo bem difícil conviver nessa casa, sabendo que a qualquer momento posso esbarrar com Dante. Inconscientemente, meus olhos sempre o procuram. Meu coração aquece quando ouço sua voz. Mas também existe o lado r**m, que é o que provo agora, nesse exato momento. Estou olhando para Dante, que conversa com uma mulher muito bonita, com certa i********e. Isso me devasta por dentro. Mas não posso exigir nada. Porque, afinal, não é ele o meu noivo.
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