Quando eu vi aquele que eu amava, ensanguentado no chão, o pouco que ainda restava em mim se foi. Eu com 20 anos, já tinha perdido meu pai, minha mãe, meu bebê e estava prestes a perder o meu namorado. Ainda bem, que ainda tinha meu irmão, que me dava a maior força.
Eu sempre fui aquela menina, que queria ser mulher, aquela criança, que era ansiosa para crescer logo. Mas não era assim. "Calma Gabriela, um passo de cada vez" eu pensava comigo mesma, mas nunca era um passo de cada vez, era sempre um tiro atrás do outro, bem no meu coração.
Quando eu cheguei do hospital, eu simplesmente me tranquei no quarto e decidi não ser mais forte e chorei, eu chorei muito, muito mesmo. Eu me tranquei, tranquei as janelas e queria ficar no escuro, porque era assim que eu estava me sentindo, no escuro. Eu chorava e pedia uma só coisa para Deus: me leva daqui logo, eu não aguento mais. E aquela pressa toda, que eu tinha de crescer, eu tive para morrer.
E então começou um novo estágio na minha vida...
Meu irmão, estava 100% focado nos negócios do morro e detalhe, a tal da Larissa engravidou dele, mas isso é história para o próximo capítulo. Ele não estava tendo tempo para mim. E foi a semana mais difícil, pois até a Amanda, resolveu fazer faculdade. Ou seja, todos tinham algo para fazer, mas eu não. E aquilo foi me consumindo. Eu não tinha notícias do Natan, ele estava entubado, meu irmão ocupado, Amanda focada nos estudos, meus pais morreram e meu bebê também. Eu entrei em depressão ...
Eu fui pedindo socorro, mas ninguém me ouvia, isso era dentro de mim e eu não conseguia falar. Eu não comia, não tinha vontade de sair, sabe o que é tomar banho ? Pois é, eu não sabia mais, eu não tinha vontade de absolutamente nada e não era frescura. Eu pedia socorro e não tinha ninguém para me ajudar.
No décimo dia que o Natan estava internado, eu liguei para dona Leda: oi dona Leda, tudo bem ?
Dona Leda: tudo minha fia e tu estás como ?
Gabi: estou indo né ? - dei uma risada sem graça. E o Natan ?
Dona Leda: o caso dele é grave, mas cada dia que passa tem uma mudança, graças a Deus, vamos continuar orando né minha fia.
Gabi: aí que bom, eu liguei para saber como ele estava mesmo, já que ele está na UTI e não pode receber visitas.
Dona Leda: eu entendo minha fia. Fique com Deus tá ? tchau
Gabi: tchau dona Leda, fica com Deus também.
Saber que ele está indo bem, me dá uma força a mais para levantar dessa cama.
Quando uma depressão ou ansiedade te pega, parece que todos não fazem mais questão de você, estou há 10 dias trancada no quarto, e meu irmão só passa aqui pela manhã me dá bom dia e some... "calma Gabi, isso é coisa da sua cabeça".
11 dias...
12 dias...
13 dias...
- toc toc - posso entrar ? - Amanda disse
- oi amiga ? entra.
- nossa que escuridão Gabi - ela já chegou abrindo as janelas - levanta vai, tá um cheiro de catinga aqui - deu risada
- não amiga, quero fica aqui deitadinha
- levanta tenho uma ótima notícia, já que você não olha mais o celular.
- huuum ?
- adivinha ?
- não quero adivinhar.
- O seu amor .... - ela sentou do meu lado na cama e falou me dando cosquinhas e rindo - saiu do hospital !!!
- que ? mentira ? - falei com um ar de riso - ele tá bem ?
- só pergunta de você o tempo todo ! Levanta neguinha.
Saber que ele estava bem me deu um ânimo tão grande para me levantar, corri e fui no banheiro tomar banho. E no banheiro do meu quarto, tem um espelho bem grande e quando me olhei, comecei chorar tanto, eu estava magra, muito magra. Tomei banho chorando, me sequei chorando e quando fui pro quarto, fui me trocar chorando, eu não sei se eu estava me sentindo f**a, desanimada, magra ou o que, mas eu estava h******l, pelo menos na minha cabeça.
A Amanda arrumou meu cabelo, passou maquiagem em mim, pegou uma roupa linda e falou: aí como você está linda, os olhinhos do Natan vão brilhar quando te ver. - e eu dei risada.
Fomos até a casa dele, cheguei lá, tava os cara tudo que trampava na favela, mas na hora que eu cheguei foi saindo um por um e ficou só eu e ele. Me doeu muito vê-lo naquela situação, ele ainda estava com uma sonda ligada no oxigênio e cheio de curativos. Ele ainda não estava conseguindo falar, mas na hora que ele me viu, eu pude ver as lágrimas escorrendo nos cantos dos olhos, eu corri e abracei bem forte pra ele.
- aí desculpa amor - eu abracei e me afastei rápido - amor não né ? Natan ! - sorri - eu estou tão feliz por que você está bem, que medo eu tive de te perder.
E eu conseguiu falar bem baixinho "minha gata", eu chorei demais, e dessa vez foi de felicidade.
Estava sendo um pouco complicado todos os dias ter que ficar indo até lá ajudar ele em tudo, ele estava usando fraldas, mas foi se recuperando rápido. Ao total foram 23 dias e eu cuidando dele, eu e a mãe dele. Passei a dormir lá. E sabe aquela depressão, eu lutei contra ela, ela veio pra acabar comigo, mas com um pontinho só de chance de eu vence ela, eu venci...
O Natan começou se recuperar, e ele já estava sem os curativos, sem a sonda, andava normal, falava normal. E ele todo dia começou dizer para mim que me amava e que eu era importante pra ele. Quem diria né ? Um cara de 27 anos, que me viu crescer, viu toda minha vida, hoje confessou que me amava e eu também sempre amei ele...