PLANO DE FUGA

1130 Words
A manhã seguinte à tentativa de ataque trouxe consigo um silêncio desconfortável. O sol surgia tímido sobre Trabzon, iluminando as ruas ainda marcadas pelo confronto da noite anterior. Laura observava pela janela, sentindo o coração pesado. Lá fora, os vizinhos comentavam em sussurros, alguns ainda assustados com os tiros. A casa, apesar de protegida, já não parecia mais um lar. Era uma trincheira. Emir entrou na sala, trazendo uma xícara de café para ela. Seus olhos denunciavam a noite m*l dormida, mas havia firmeza em seu semblante. — Eles não vão parar, Laura. Eduardo sabe onde estamos agora. A cada dia que passa, o risco aumenta. Laura apertou a caneca nas mãos, tentando se aquecer mais com o gesto do que com a bebida. — Eu sei. — Sua voz saiu embargada. — Mas sair daqui… é como se estivéssemos sempre fugindo. Quando isso vai acabar, Emir? Ele se aproximou, segurando o rosto dela com delicadeza. — Vai acabar quando Eduardo perder o poder de nos atingir. E para isso, precisamos agir, não apenas esperar. Malu entrou correndo na sala, segurando o desenho que havia feito: ela, a mãe e Emir de mãos dadas diante de um lago. — Olhem! É a gente, mas num lugar diferente. Eu sonhei com isso ontem. Tinha flores, tinha montanhas… e ninguém corria atrás da gente. Laura a abraçou, emocionada, e trocou um olhar longo com Emir. Talvez aquela fosse a resposta. A Reunião Horas depois, todos estavam reunidos: Selim, Fatma, Ayla, Emir e Laura. O clima era de tensão, mas também de decisão. Selim abriu o encontro com objetividade: — Não podemos mais tratar isso como pequenas investidas. Eduardo tem olhos e ouvidos por toda parte. O último ataque mostrou que eles sabiam cada movimento da rotina de vocês. Fatma assentiu, franzindo a testa. — A única forma de manter vocês vivos é mudar o tabuleiro. Se ele já conhece esta cidade, precisamos desaparecer dela. Laura respirou fundo, sentindo o peso daquelas palavras. — Fugir de novo… Mas e a escola da Malu? E o pouco de paz que construímos aqui? Ayla tomou a palavra, sua voz suave mas firme: — Laura, às vezes o sacrifício de hoje garante a liberdade de amanhã. Sua filha precisa de você viva. Precisa crescer longe do medo. O silêncio tomou conta da sala por alguns segundos. Então Emir falou, olhando para todos: — Eu proponho que saíamos de Trabzon ainda esta semana. Tenho contatos em Izmir. É uma cidade grande, movimentada, mais fácil de se misturar. De lá, podemos decidir os próximos passos. Selim completou: — Eu e Fatma podemos garantir a saída. Temos rotas seguras, pessoas de confiança. Mas será arriscado. Eduardo vai perceber. Laura olhou para Malu, que brincava distraída no canto da sala, alheia ao peso daquela reunião. As lágrimas surgiram nos olhos, mas ela piscou, firme. — Então vamos. Não importa o que custe. Preparativos Os dias seguintes foram de correria silenciosa. Laura e Emir empacotavam apenas o essencial: roupas, documentos, lembranças pequenas que não pesariam na mala. Malu ajudava com entusiasmo, como se fosse uma aventura, sem entender totalmente a gravidade. — Mamãe, posso levar meus lápis de cor? — perguntou, segurando a caixinha. — Claro que sim, meu amor. Eles vão te acompanhar para desenhar novos lugares. Selim organizava a rota de fuga com precisão militar. — Sairemos de madrugada. Carro até Samsun, depois barco até Izmir. É longo, mas menos visível. Fatma providenciava identidades falsas, documentos, e até roupas diferentes para despistar. — Laura, você terá que mudar o visual por um tempo. Cabelos mais curtos, talvez escuros. Laura se olhou no espelho, acariciando os longos fios castanhos que tanto amava. Mas suspirou e assentiu. — Se for para salvar minha filha, corto até minha alma. O Último Passeio Na véspera da fuga, Emir surpreendeu Laura e Malu. — Hoje não vamos treinar, nem planejar. Vamos passear. Um último momento aqui, sem medo. Levou-as até o lago onde haviam estado antes. O céu refletia nas águas tranquilas, e as árvores dançavam ao vento. Malu correu pela grama, rindo alto, como se nada pudesse atingi-la. Laura observava a cena, emocionada. — Parece até que o mundo esqueceu de ser c***l. Emir se aproximou, segurando sua mão. — Não é o mundo, Laura. É você. Onde você está, existe paz. Ela sorriu, apesar da dor. E ali, à beira do lago, trocaram um beijo cheio de ternura e promessa. A Fuga A madrugada chegou. O carro estava pronto. Malu dormia nos braços de Laura quando saíram em silêncio, acompanhados por Selim e Fatma. O coração de Laura batia descompassado, cada esquina parecia um perigo. Selim dirigia firme, os olhos atentos aos retrovisores. — Estamos sendo seguidos? — perguntou Emir. — Ainda não. Mas não vamos relaxar. — respondeu Selim. Durante horas, cruzaram estradas desertas, até chegar ao ponto do barco. O mar se estendia diante deles, escuro e infinito. — É agora. — disse Fatma. — Depois que zarparmos, eles não terão como nos alcançar facilmente. Laura apertou Malu contra o peito. — Estamos perto de recomeçar, minha filha. Mas, naquele instante, os faróis de um carro surgiram na estrada distante. Selim estreitou os olhos. — Eles vieram. O clima se transformou em segundos. Emir ajudou Laura e Malu a embarcarem, enquanto Selim e Fatma preparavam-se para ganhar tempo. — Vão! — gritou Selim. — A gente segura aqui! Laura chorava, mas Emir a empurrou gentilmente para dentro do barco. — Confie neles. Confie em mim. O motor roncou, e o barco começou a se afastar da margem. Laura olhou para trás, vendo Selim e Fatma de pé, como sentinelas, enquanto os faróis inimigos se aproximavam. Malu, sonolenta, perguntou baixinho: — Mamãe, estamos indo para o lugar do meu desenho? Laura a abraçou, as lágrimas caindo sem controle. — Sim, meu amor. Estamos indo exatamente para lá. Na Prisão Horas depois, Eduardo recebeu a notícia: — Eles escaparam. O barco partiu de Samsun. Não conseguimos interceptar. Ele cerrou os dentes, o ódio transbordando. — Fugitivos não permanecem escondidos para sempre. Onde quer que se escondam, vou encontrá-los. E no olhar dele havia uma promessa de guerra. No Barco Enquanto as primeiras luzes do amanhecer surgiam, Laura sentiu o vento no rosto. O mar se abria diante deles, trazendo medo, mas também esperança. Emir a abraçou por trás, olhando para o horizonte. — Estamos começando de novo. E dessa vez, Laura, ninguém vai nos deter. Ela se virou para ele, enxugando as lágrimas. — Não importa onde estejamos, Emir. Enquanto estivermos juntos, teremos forças. Malu, desperta agora, apontou para o céu rosado. — Olhem! Parece que o sol está sorrindo para a gente! Laura sorriu, emocionada. Talvez fosse isso mesmo. Depois de tantas batalhas, havia finalmente uma centelha de luz no caminho.
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