o Dono do morro não divide

677 Words
Capítulo 4: (Narração de Muralha) O som do rádio ecoava pelo meu quarto enquanto eu olhava pela janela. A noite estava quente, o morro mais agitado do que o normal. Meus homens andavam de um lado pro outro, armas em punho, preparados pra qualquer coisa. Mas, na minha cabeça, a bagunça era outra. Era ela. Isabel. Eu tentei ignorar. Por dias, me forcei a pensar em qualquer outra coisa, mas quanto mais eu tentava, mais ela voltava. A cada vez que eu passava perto do posto de saúde, meu olhar procurava por ela, mesmo sem querer. E hoje, quando um dos meus vapores falou que viu ela conversando rindo com o tal do Joca, o pedreiro do morro, algo em mim queimou. — Joca? — perguntei, sem disfarçar o tom. — E o que ele queria com a doutora? O moleque deu de ombros. — Sei lá, chefe. Só sei que ele vive arrumando serviço por lá, sempre puxando papo com ela. Eu sabia quem era o Joca. Um cara trabalhador, mas com a mania irritante de se achar engraçado. Do tipo que tenta bancar o bom moço pra qualquer mulher bonita que aparece. E agora ele estava se aproximando de Isabel. Fiquei remoendo aquilo por horas. Isabel não era minha, e eu sabia disso. Mas, ao mesmo tempo, ela estava no meu morro. Isso significava que ela estava sob minha proteção, e, se fosse por mim, ninguém chegava perto dela sem a minha permissão. --- No Posto de Saúde Mais tarde, decidi passar no posto. Não dei aviso, como sempre. Só entrei, e lá estava ela, conversando com Beatriz enquanto organizava os medicamentos. Quando me viu, Isabel levantou os olhos e ficou séria. Não parecia assustada, só intrigada. — Muralha, aconteceu alguma coisa? Passei por ela sem responder de imediato. Meu olhar percorreu o lugar, como se estivesse verificando algo, mas a verdade é que eu só precisava de uma desculpa pra estar ali. — Ouvi dizer que você tá ficando bem popular por aqui — falei, parando perto dela. Ela me olhou, sem entender. — Popular? Não sei do que você está falando. — O Joca — soltei, direto. — Ele tem passado muito tempo aqui, não tem? Vi a surpresa no rosto dela, mas Isabel logo cruzou os braços, como sempre fazia quando queria se impor. — Ele é um dos pedreiros que está ajudando a consertar o teto do posto. Só isso. — Só isso? — perguntei, dando um passo à frente. Eu sabia que estava invadindo o espaço dela, mas não me importei. — Ele não parece achar que é só isso. Isabel suspirou, claramente irritada. — Se você veio aqui pra ditar com quem eu posso ou não conversar, pode voltar pro seu QG, Muralha. Eu trabalho aqui, e, até onde eu sei, você não é meu chefe. Aquela resposta me atingiu como um soco. Não por raiva, mas porque ela tinha razão. Eu não tinha o direito de controlar a vida dela. Mas, ao mesmo tempo, o pensamento de outro homem perto dela me fazia ferver. — Só tô dizendo pra tomar cuidado — disse, tentando disfarçar. — Nem todo mundo aqui é confiável. Ela riu, mas não era uma risada de diversão. Era uma risada sarcástica. — E você é confiável, Muralha? Não respondi. Em vez disso, apenas a encarei, deixando o silêncio responder por mim. A verdade é que nem eu sabia. Mas o que eu sabia era que ninguém — nem Joca, nem ninguém — ia chegar perto dela sem passar por mim primeiro. --- À Sós Quando saí do posto, minha cabeça estava uma bagunça. Eu odiava admitir, mas estava com ciúmes. Não era algo que eu sentia com frequência. Na verdade, era algo que eu nunca sentia. Mas Isabel estava me fazendo sentir coisas que eu não sabia como lidar. E isso me deixava vulnerável, o que era perigoso, não só pra mim, mas pra ela também. Porque, no meu mundo, sentimentos eram uma fraqueza. E, no Morro do g**o, fraqueza podia custar sua vida.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD