Capítulo 13 Júlia

1220 Words
Júlia Narrando Quando seus lábios tocaram os meus, o mundo não só parou – ele desmoronou. Foi como se toda a eletricidade estática da atmosfera, todo o calor que vinha tensionando o ar desde que eu o vi descendo as escadas, tivesse encontrado um ponto de ignição e explodido dentro de mim. Borboletas? Não. Foi um furacão no estômago, uma onda de fogo que subiu da barriga até a nuca, arrepiando cada centímetro da minha pele no caminho. Já beijei outros homens. Alguns bons, outros nem tanto. Nada, absolutamente nada, se compara a isso. O beijo do Fernando não foi uma pergunta. Foi uma afirmação. Uma posse. Foi quente, firme, e tem o gosto do café que ele deve ter tomado e algo mais, algo intrinsecamente dele – masculino, seguro, proibido. Meu corpo reagiu antes do meu cérebro. Meus lábios se moveram contra os dele, respondendo com uma urgência que me assustou. Minhas mãos, que estavam apoiadas nos ombros dele, se fecharam, sentindo os músculos duros sob a pele. Um gemido baixo, quase inaudível, engasgou na minha garganta. E foi esse som, vindo de mim, que me trouxe de volta à superfície, à razão. Ele é o irmão da sua melhor amiga. Você está na casa dele. A família pode chegar a qualquer segundo. Com um grande esforço, empurrei o peito dele. Foi um movimento fraco, mais um gesto de desespero do que de força real. Nosso beijo se quebrou, mas nossos rostos permaneceram a centímetros de distância, nossas respirações misturadas e ofegantes. Ele não se afastou. Em vez disso, deu um selinho final, suave, quase torturante, nos meus lábios. — Não vou mentir — ele sussurrou, sua voz um rosnado áspero que fez meus joelhos fraquejarem. — Sempre quis saber qual era o gosto dessa boca. A frase foi um soco no meu plexo solar. Doce, perigosa, inaceitavelmente honesta. Eu respirei fundo, tentando recuperar o oxigênio e a sanidade. Encerei ele, seus olhos castanhos escuros agora eram poços de pura intensidade, fixos em mim como se pudessem ver todas as minhas contradições. Balancei a cabeça. Negando. Negando o beijo, negando a atração, negando o turbilhão dentro de mim. — Não… — foi tudo que consegui dizer, antes de dar um passo trêmulo para trás. Foi um erro. O movimento foi como um gatilho para ele. Seu braço, rápido como um raio, envolveu minha cintura e me puxou de volta contra ele, desta vez com muito mais força. Nosso corpo se colou novamente, e eu senti tudo – a diferença de altura, a largura de seus ombros, a dureza de seu abdômen contra minha barriga. Ele inclinou a cabeça, seus lábios quase tocando meu ouvido, e o sussurro que ele soltou foi a minha sentença: — Vem aqui. Eu sei que você sentiu o mesmo que eu. Era verdade. Meu corpo era uma traidor em alto e bom som. Cada célula vibrava, cada nervo estava em alerta máximo. Um calor úmido e constrangedor começou a se acumular entre minhas pernas. Eu senti. Como nunca tinha sentido antes. Era uma atração pura, primitiva, que ignorava anos de amizade e fronteiras familiares. Ele voltou a me beijar, e dessa vez não houve resistência. Meus braços subiram e se enrolaram atrás de seu pescoço, meus dedos se enterrando nos cabelos curtos e ainda úmidos na nuca dele. Meu corpo se curvou contra o dele, buscando mais contato, mais fricção, mais ele. Era como se algo tivesse despertado e estivesse faminto, exigindo. E eu percebi, com um choque íntimo e excitante, que ele estava igual. Através do tecido fino do meu vestido e do shorts dele, senti a pressão firme e inconfundível de sua ereção contra minha coxa. A confirmação física de que isso não era só minha loucura, era dele também, me deixou tonta. Foi esse pensamento, essa consciência do seu corpo reagindo ao meu, que nos manteve naquele limbo por mais alguns segundos infinitos. Até que um som nos arrancou da bolha. Click. Clack. O ruído metálico da chave na fechadura da porta da frente. Nós nos separamos como se tivéssemos levado um choque. Eu dei um salto para trás, minhas mãos voando instintivamente para a boca, para os lábios que eu sabia que estavam inchados e avermelhados. Meu coração batia tão forte que doía. A porta se abriu. — Alô, família! Mãe tá em casa! A voz animada e alta da Giovana ecoou no hall. Ela entrou, arrastando uma mala, seu rosto cansado mas iluminado por um sorriso. Quando seus olhos me encontraram, no meio da sala, congelou. O sorriso se transformou em um “o” de surpresa genuína. — JÚLIA?! — ela gritou, soltando a alça da mala, que caiu no chão com um baque. — MEU DEUS! Ela então correu os olhos rapidamente, do meu rosto provavelmente afogueado, para o Fernando, que agora estava parado a alguns metros de mim, as mãos nos bolsos do shorts, tentando parecer casual. Algo na cena fez o sorriso dela esmaecer um pouco, substituído por uma expressão de perplexidade. — Tá… tudo bem? — ela perguntou, a pergunta pairando no ar, carregada de suspeita. Foi o que eu precisava para sair do transe. Respirei fundo, engoliando o gosto dele que ainda estava na minha boca, e corri em direção a ela. — GI! — gritei, abraçando-a com uma força que era metade saudade, metade desespero para dissipar o clima que pairávamos. — Que saudade, porca! Ela riu, o abraço apertado, familiar, mas quando nos soltamos, seus olhos ainda vasculhavam o meu rosto. — Não tem presente de Natal melhor do que isso — ela disse, segurando meus ombros. — Saber que você está aqui me esperando. — Quando minha mãe falou que a gente ia passar o Natal aqui, não pensei em outra coisa — respondi, e era a verdade, só que a verdade tinha ganhado uma camada completamente nova e proibida nos últimos minutos. — Amor! — ela exclamou, e então olhou para o irmão. — E você, Fernandão? Não tá com saudade da irmã? Não vem me abraçar? Fernando finalmente se moveu, saindo da sua pose congelada. — Desculpa aí, pirralha. Tava com saudade de tu sim — disse, com um sorriso que parecia forçado para mim, mas que a Gi aceitou. Ele a abraçou, um abraço de irmão, e eu vi como ela desaparecia dentro dele. Quando se soltaram, a Gi olhou direto para ele, e depois para mim, com aquele olhar afiado de quem sempre desconfiou de tudo. — E aí, o que vocês dois tavam aprontando? — perguntou, metade brincando, metade séria. Meu sangue gelou. Olhei para ela e balancei a cabeça, negando freneticamente. — Não tava aprontando nada, uai — Fernando respondeu, a voz tranquila, o mestre da dissimulação. — Ela veio antes pra te fazer uma surpresa. Ficou meio tensa porque não sabia que eu tava aqui. Acho que queria um momento só de vocês duas. Não contava com a minha presença. A Gi balançou a cabeça, aquela cara de quem não estava totalmente convencida, mas deixou pra lá. Deu um beijo no rosto do irmão e depois virou-se para mim. — Vem, Ju. Me ajuda a subir com minhas coisas. Tô morrendo de cansaço. — Sobe que daqui a pouco eu levo sua mala — Fernando ofereceu, pegando a mala maior do chão. Continua...
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