seis

1736 Words
➳ Letícia Amorim, Leth. Tendo feito a minha parte ao ajudar aquela moça, agradeci o desaparecer do cara que a cercava e finalmente adentrei aquele imenso espaço, onde logo saí em busca dos meus colegas. Eles deviam estar se enturmando com algum outro grupo, mas era preciso saber em que lugar ali dentro. Eram muitas pessoas, e não estava fácil ficar andando de um lado para o outro. Encontrar Lucas seria o suficiente, poderia me aquietar depois disso. No mundo em que vivo, a sorte nunca esteve do meu lado, não é algo com o qual eu possa estar sempre contando. Tudo o que foi conquistado até aqui, ou veio de um presente do meu pai, ou precisei me esforçar para obter. E ficou claro no primeiro minuto que aqui dentro as coisas não seriam diferentes, não conseguiria me encontrar com meu primo se não desse duro por essa conquista. Mas logo percebi que podia me preocupar com isso depois, esse não era o momento. Havia vindo até aqui para me divertir, trolei os meus pais em busca de aventuras que não posso encontrar no centro da cidade. Lucas podia se virar sem me ter por perto por algumas horas, e eu faria o mesmo do lado que estava. O risco da fuga precisava ao menos valer a pena. Bebidas, eu precisava começar a beber o quanto antes. Não dá pra aproveitar uma boa festa se estiver sóbrio, e isso eu aprendi ainda na adolescência. Como nunca matei ninguém do coração não sei explicar, o que deve significar alguma coisa. Isso deve provar que meus pais estão tão saudáveis quanto eu, o que é uma boa notícia. - Uma vodka com energético, pode ser? - Me pendurando ao balcão muito bem montado, pedi ao rapaz do outro lado. Era uma boa opção para começar. - Tamanho? - Deixando a mostra os copos utilizados para o preparo da bebida, apontei para o do meio. Ele então assentiu e se focou no seu trabalho. O gelo era um clássico, não precisa o lembrar disso. A espera da entrega do que pedi, virei de costas para ele e olhei ao meu redor. Queria sondar o lugar, saber se hoje sairia no lucro de alguma forma, ou voltaria pra casa carregada sem ter feito nada além de beber. Porém, parei de observar a multidão no momento em que notei a presença de alguém em especial ao fim do balcão à minha direita. Era a moça que vi quando cheguei. - Aqui está. - Ganhando a minha atenção, o rapaz me entregou a bebida exibindo um sorriso travesso. E precisava confessar, ele era muito bonito. Porém, infelizmente não fazia o meu tipo. Se fosse o Lucas aqui, talvez ele tivesse mais sorte. Então me limitei a um sorriso de agradecimento, acenei para ele e direcionei meus passos até a moça. Saber quem era devia ser uma prioridade, pois até onde conseguia me lembrar, eu não a conhecia. Mas apesar de tudo isso, ela ativou a minha curiosidade no momento em que bati meus olhos sobre a sua pessoa, e pior, não sabia dizer porque raios isso aconteceu. Dividir uma conversa breve era o mínimo a se fazer. Restava saber se ela estaria afim de dialogar comigo, pois ter a ajudado entrar não significava que estava em dívida. Mas se pudesse usar isso como arma a meu favor, devia ser óbvio que eu o faria sem pensar duas vezes. - Se importa? - Tendo seu olhar sobre mim quando me aproximei, perguntei indicando o seu lado. Ela se limitou a assentir ao se virar para a multidão, mas sem arredar o pé daquele lugar. Parecia estar buscando por algo, mas o quê? - Sou Letícia, a desastrada do celular lá fora. - Claro, é você. - Me dedicando um pouco mais de atenção, ela sorriu divertida. - Obrigada pela ajuda, me chamo April. - April, é um prazer. - Nunca desviando meu olhar do seu, a vi baixar a cabeça por breves segundos. - Me desculpe por isso, mas se eu não estivesse acostumada com a situação, diria que você está tentando me ganhar na noite. - Com ela voltando a me encarar, fiz o possível para não ser pega no flagra. Certeza de que a tonalização das maçãs do meu rosto teriam me denunciado se estivéssemos a céu aberto durante a luz do dia. Mas quando foi que fiquei assim tão sem jeito? - Não é isso. - Tentei soar com alguma naturalidade, mas o meu tom a fez arquear uma sobrancelha. Estava indo para o lado errado. - Olha, você é muito bonita, e com certeza deve chamar a atenção de qualquer cara ou garota por aí, mas não foi isso que me fez vir até aqui. Quer dizer, talvez pudesse ser se não fosse a ocorrência de minutos atrás. - A essa altura ela já se segurava para não gargalhar alto. - Entendi. Eu me enrolei feio, não é? - Não porque precisava, mas foi sim. - Havia gostado dela, seu humor me ganhou com uma facilidade fora do meu comum. Não estava acostumada com isso. - Normalmente isso não costuma acontecer, ao menos não comigo. - Levando minha bebida a metade do copo, notei alguém nos observando de longe. - A gente se conhece de algum lugar? - Isso não é uma cantada, é? - Não, garanto que não dessa vez. - Foi a minha vez de sorrir largo. Ela se divertia com a minha cara. - Então a minha resposta é não, eu me lembraria. - Era mesmo isso, eu também me lembraria. Com um humor tão divertido assim, seria impossível me esquecer. - Por algum motivo, eu tenho boas sensações sobre você, Letícia. - Por favor, me chame de Leth. Não precisamos de tanta formalidade. - Gostava do meu nome, mas ele me lembrava de todas as vezes em que minha mãe ficava irada comigo. Letícia Bitencourt Amorim, ela dizia pausadamente e em um tom levemente assustador sempre que estava perto de perder a compostura por culpa minha. Acredito que não exista ninguém nesse mundo que me cause mais espanto do que a senhora Cecília Bitencourt estressada por minha causa. - Pediria algo parecido, mas não tenho um apelido legal. - AJ, preciso dizer que é uma surpresa te ter aqui essa noite. - A pessoa que não deixava de nos mirar à distância se aproximou exibindo sorrisos. Mas isso não significava nada, tinha certeza. - Já disse para não me chamar assim. - O sorriso presente em sua feição segundos atrás desapareceu como poeira ao vento. Agradeci por não ter dito nada sobre o apelido ouvido. - O que faz aqui? - Deviam ter se esquecido de que existia mais alguém ali. No caso, eu. - Ouvi alguns colegas comentando sobre o "baile" do ano. Afinal, está aberto ao público da zona sul, não? - Gostei do tom de ironia, mas obviamente era a única. - Sabe o que penso sobre isso, não devia ter vindo. - Por isso disse para o p*u mandado do seu amigo me barrar na entrada? - Com essa questão, percebi que já estava na minha hora. - Onde pensa que está indo? - Sendo segura logo no primeiro passo, olhei para a mão que prendia o meu braço. O que isso deveria significar? - Não foi você quem se meteu no trabalho do sub dono do morro? - Eu o que? - Estava me sentindo um cego no meio de um tiroteio. - Para de cena Juliana, solta a garota. - Belo nome, mas um toque muito grosseiro. Seu aperto começava a me incomodar. - Não me chama assim, p***a! - Ela havia se irritado, e quem sofreu com isso foi o meu braço. Ao nosso redor, inúmeras pessoas pararam para nos observar. Pela primeira vez na vida não sabendo reagir diante a situação formada, pensei onde meus colegas e primo haviam se metido. Precisava de ajuda, mas claramente não tinha com quem contar. E senti que podia piorar ainda mais quando me vi sendo arrastada para o que parecia ser o banheiro feminino. April estava logo atrás, a todo instante pedindo para que a i****a de pouco mais de um metro e setenta largasse do meu braço. - Quando vai aprender que aqui dentro a minha palavra é lei, AJ? - Junto de sua pergunta, eu também recebi a minha liberdade. Uma pena ela ter se colocado na frente da saída. Quando eu poderia realmente aproveitar essa noite? - Eu não faço parte da sua comunidade, você vive me dizendo isso, Juliana. Esfrega na minha cara sempre que pode. - Estavam claramente se provocando. - Então que fique claro, você não manda em mim, e eu não tenho medo de quem você é. Dona do morro? Que piada. Mesmo que estivesse a todo momento desejando encontrar uma a******a para sair dali, me vi completamente perdida no instante em que April foi colocada contra a parede com um forte aperto em seu pescoço. Dona do morro? Com quem eu fui me meter? Se minha mãe soubesse, ela me mataria. Mas que se f**a. - Está me machucando, não consigo respirar. - Sua voz começava a ficar fraca, assim como suas mãos tentavam se libertar. O que havia acontecido com aquela louca? - Não se aproxima. - No que me mexi para tentar ajudar a de cabelos longos outra vez, recebi um nada sutil empurrão. Se não fizesse nada, ela iria acabar tirando a vida de April. Perdida em minhas ações, analisei todo o lugar e encontrei uma garrafa de cerveja ao canto do outro lado da parede. Era uma loucura, mas não pensei muito. Fui ágil em segurar a arma branca, e com a força para aquele momento quebrei o vidro na cabeça da dona do morro, que grogue quase desmaiando caiu de joelhos ao chão. Então, me livrei do que ainda sobrava da garrafa, apoiei April em meu ombro e sai do banheiro o mais rápido que consegui. Sentindo que a sorte estava do meu lado no momento mais oportuno, agradeci ao ser recebida pelo meu grupo em poucos segundos. Lucas parecia ter visto um fantasma quando bateu os olhos em mim. - O que aconteceu com você? - Ele me perguntou olhando apenas para a bela mulher pendurada nos meus ombros. - Foi por uma boa causa, mas acho que fiz a maior merda da minha vida.
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