Durante todo o jantar no restaurante que Nathaniel adorava ir, Paulina não conseguia pensar em outra coisa que não fosse seu novo trabalho.
Normalmente, era o namorado, com sua animação, que monopolizava a conversa. Gostava de ouvir sobre o dia-a-dia dele, admirar o brilho empolgado das íris azuladas, observa-lo coçar a nuca quando se lembrava de algo engraçado ou vergonhoso, apreciando a bagunça que o gesto causava nos cachos loiros. Mas naquele dia, Paulina precisava desabafar.
— Não entendo por que Mirela fez isso comigo — reclamou, incomodada demais com tudo que acontecera, não notando o respiro entediado do namorado. — Todo mundo sabe que o senhor Simon me odeia.
— Simon não te odeia — Nathaniel garantiu cansado das reclamações.
Teve vontade de acrescentar que ela não necessitava trabalhar, se aceitasse, ele lhe sustentaria. Mas recordava o drama que a proposta causara quando a fizera na primeira vez. Era uma das poucas coisas – possivelmente a única – em que discordavam.
— E porque sempre me trata m*l? — ela murmurou de cabeça baixa, empurrando a comida que m*l tocara com o garfo.
— Ele é assim mesmo. Frio com as pessoas — respondeu com um sorriso benevolente. — Não é nada particular.
Cansada, Paulina deduziu que o ano seria muito difícil. Além de aturar Simon, ainda teria de ouvir de todos que exagerava ao se queixar. Nem mesmo Nathaniel parecia inclinado a ficar ao seu lado.
— De qualquer forma, tenho uma proposta — ele anunciou empolgado, os dedos mergulhando no bolso do paletó. — Se você aceitar, te ajudará a sair mais cedo desse emprego.
— Proposta?
A jovem o fitou com desconfiança, recordando da última vez em que falaram sobre sair do emprego. Dois anos antes, no lugar de comemorar o trabalho que ela conseguira, Nathaniel mostrara desagrado e prometera pagar suas contas se pedisse demissão. A decepção dele foi evidente quando deixara claro que só aceitaria tal oferta vinda do futuro marido.
Preparou-se para repetir seus argumentos, mas logo à desconfiança foi substituída por esperança, seu olhar atraído para a pequena caixinha preta que Nathaniel posicionou entre eles.
— Quer casar comigo, Lina? — ele pediu abrindo a caixinha, deixando Paulina ver seu conteúdo, um anel de diamante.
— Sim! Claro que sim! — respondeu a eufórica Perez estendendo a mão para que o Muller colocasse o anel em seu dedo anular. — É lindo! — admirou encantada com a beleza da joia e seu significado.
— Como você anjo — disse o Muller beijando o anel antes de se inclinar na mesa para beijar suavemente os lábios da noiva, selando o importante passo em suas vidas.
~*S2*~
De volta do jantar, antes de se aprontar para dormir, Paulina andou pelo apartamento de Simon decidida a dar o seu melhor até o dia de seu casamento.
Em estado de graça, sem se importar em quão desagradável seria conviver com o Salvatore, sua mente ocupava-se montado o cenário perfeito para seu casamento, as flores, o vestido, o salão de festas, a realização de seus sonhos.
Com a certeza de que no fim daquela provação teria seus esforços recompensados, minutos depois pousou a cabeça no travesseiro, caindo em sono profundo. Até ser despertada abruptamente pelo som de algo pesado caindo e vidro estilhaçando.
Assustada, levantou-se, ajeitou a longa camisola de algodão e abriu a porta de seu quarto. Escutou palavrões proferidos quase aos berros vindos do corredor que levava para a sala, identificou imediatamente a voz de Simon.
Caminhou insegura até a origem do barulho, parando na divisão entre a sala e o corredor para espreitar o ambiente. Com um misto de choque e resignação – e nenhum traço de surpresa -, na claridade da sala viu um desconhecido levantando com dificuldade Simon do chão.
— Me larga! — Simon esbravejava tentando levantar-se sem ajuda, mas fracassando miseravelmente.
— O que aconteceu? — perguntou preocupada ao aproximar-se do Salvatore, que a afastou ordenando com voz pastosa:
— Sai daqui! Você é a culpada de tudo...
O forte odor de álcool invadiu as narinas da Perez, anunciando o motivo do estado dele.
— Ele bebeu além da conta — comunicou o estranho forçando Simon a ficar de pé. — Precisa de uma boa noite de sono. Pode me levar ao quarto dele?
Paulina assentiu e guiou o homem até o dormitório do Salvatore, pedindo para segura-lo tempo suficiente para puxar os cobertores.
Simon foi colocado sobre a cama, Paulina retirou seus sapatos e o cobriu, ajeitando-o para que não passasse frio.
O homem, que observava tudo com atenção, sorriu quando se voltou para acompanha-lo a saída.
— Sou Hernando Gomez, segurança da SaaTore — apresentou-se, observando-a com indisfarçável curiosidade. — Você é... hum... namorada do Salvatore?
— Hã? Não, lógico que não. Sou a governanta, Paulina Perez, e tenho um noivo — corrigiu nervosamente mostrando o anel de noivado.
Hernando olhou a joia e assentiu complacente, levando Paulina a perceber que exagerara em sua resposta. Pela pergunta hesitante, o segurança já devia imaginar que não era namorada de Simon, no mínimo imaginava que era amante dele. Respirou fundo para se recompor enquanto o encaminhava para a saída.
— Agradeço por trazer o senhor Simon.
— Se eu não trouxesse ele acabaria dormindo no chão do bar... — ele confidenciou sorrindo, logo em seguida ficando sério ao pedir: — Assim que ele acordar diga para evitar a irmã do Gabriel, Tamara.
— Sim...
— Ah! Boa sorte com o Simon! Pelo que percebi você vai precisar.
Paulina não teve tempo de perguntar o que ele queria dizer com aquilo. Hernando desapareceu dentro do elevador.