Era final de expediente e Emma arrumava suas coisas, iria sair com Anaïs, esperava que não fossem ficar até muito tarde, precisava começar a matéria sobre o advento natalino o quanto antes se quisesse que fosse publicado na edição de dezembro.
— Ei Em, terminou seu trabalho?
Ela assentiu com um leve sorriso de lábios fechados.
— Sim, vou sair com Anaïs.
— Será que posso ir com vocês.
— Lamento, mas é uma noite entre garotas, Adryan. Quem sabe na próxima.
Ele meneou a cabeça confirmando que havia entendido. Emma sentiu seu coração apertar, odiava sentir que estava partindo o coração do rapaz e magoando ele, mas, ao mesmo tempo, Adryan podia ser muito insistente e grudento tentando fazer com que ela gostasse dele.
— Está pronta, Em? — Anaïs chamou.
A ruiva terminou de guardar a agenda na bolsa, pegou o celular e acenou em despedida para Adryan.
— Você nunca me disse para onde iremos.
Emma comentou enquanto caminhava para fora do escritório com a amiga. Elas seguiam juntas para o elevador.
— Eu pensei em talvez compras e um jantar. O shopping é aqui do lado, depois na volta, eu te deixo em casa.
— Você deveria entrar comigo, nem que seja um pouquinho, sabe que meu pai te adora.
— Eu também o adoro. — ela considerou por um momento e concordou — Não posso ficar muito, estou cheia de coisas da faculdade, mas vou entrar um pouquinho.
O elevador chegou ao térreo e ambas saíram já caminhando pelo saguão para fora do prédio, o shopping era no final da avenida, há alguns outro prédios de distância, cinco minutos a pé.
— Eu vi Adryan na sua mesa, o que ele queria?
— Sair comigo.
— Finalmente dispensou o coitado?
— Eu disse que iria sair com você, noite das garotas.
— Fico feliz em ser sua desculpa sempre que quiser, mas duas coisas. Uma, isso vai custar um novo suéter para mim e vai sair do seu bolso. E dois, você deveria dizer de uma vez por todas que não gosta dele. Desse jeito você eternamente dá esperanças para ele, esmague de uma vez como um inseto e vai tirar ele da sua cola.
Emma bufou e cruzou os braços, Anaïs simplesmente revirou os olhos e continuou andando para o shopping.
— Não adianta bufar como se eu não tivesse razão. Mas a vida é sua e as escolhas também. — ela declarou — Agora vamos comprar meu novo suéter e depois jantar.
Entraram juntas no shopping e imediatamente Anaïs arrastou Emma para as escadas rolantes, elas precisavam subir para chegar na loja que vendia as roupas que a morena queria.
Anaïs continuava arrastando a amiga pelo shopping enquanto falava os detalhes do planejamento para a festa de Natal. A ideia era ser no mesmo salão de festas do ano anterior, era de fácil acesso e com um bom estacionamento.
— A decoração vai ser totalmente diferente, claro. Dessa vez quero fazer tudo em tons branco, como se o salão estivesse coberto de neve, algumas coisas em vermelho e dourado.
— Achei que o natal fosse mais pra verde e vermelho. — opinou Emma.
— E é por isso que eu sou a responsável pela festa e não você. — ela respondeu com um estalar de língua.
Muitos poderiam ficar ofendidos e muitos ficavam com a língua rápida e as respostas afiadas de Anaïs, muitos a consideravam grossa. Emma a entendia, aquele comentário não era uma ofensa, era uma constatação, enquanto a ruiva pensava no tradicional e que acontecia sempre em toda festa. A morena pensava em algo diferente e elegante.
— Então branco, vermelho, dourado. E o que mais?
— Ainda estou vendo. Eu pretendo fazer uma grande árvore para colocarmos os presentes de Natal do amigo oculto e caso alguém mais queira dar presentes fora da brincadeira. — ela comentava pensativa — Pode deixar que seu nome não vai estar disponível quando Adryan for pegar.
Emma quase suspirou de alívio, mas sua expressão a entregou mesmo que não quisesse. Ela indicou a loja na frente delas para a amiga e Anaïs entrou puxando a ruiva consigo.
— Papai me mandou fotos de um calendário de advento que está na minha família há gerações, ele disse que vai limpar e arrumar para me dar, eu achei completamente adorável a ideia.
— Quando ele entregar, posso vê-lo com você? Sabe que eu também adoro essas coisas, mas em casa não temos tantas tradições, além do grande jantar que você e seu pai participam conosco todo ano.
— O jantar de vocês sempre salva, papai até é bom para cozinhar no dia a dia, mas tirando o risoto que ele faz para o Natal, a última vez que ele tentou fazer nossa ceia, a comida tinha gosto de sola de sapato.
Anaïs deu uma risada e pegou o celular de Emma para ver as fotos do calendário.
— Ele é adorável, me chame para vê-lo. — exigiu.
— Pode deixar.
As jovens se separam na loja procurando por peças de roupas que gostassem mais. Anaïs era alta, magra, com um corpo definido, sua pele branca parecia sempre bronzeada e seus grandes olhos castanhos combinavam perfeitamente com o cabelo preto comprido e sedoso que caia pelas costas até a cintura.
Seu estilo eram roupas bonitas e elegantes, mas raramente comprava algo que fosse desconfortável para usar apenas por terem esse estilo, ela também prezava por roupas que fossem confortáveis de usar.
Já Emma tinha um estilo misto, ela adorava roupas clássicas e românticas, mas também tinha peças confortáveis e que fossem estilosas e até sérias. Para ela, era importante ter roupas para todas as ocasiões, mas que combinassem entre si também.
Naquele momento, ela procurava por um vestido elegante para a festa de Natal da empresa, ainda estava longe de acontecer, era verdade, mas ela não queria deixar para a última hora. Preto talvez, era uma cor básica, ficava bem com tudo. Pegou um vestido tubinho preto e colocou na frente do corpo diante do espelho.
— Nem pensar, você tem que parar de se esconder, principalmente em festas. Você deveria apostar em algo vermelho ou verde. — declarou Anaïs ao tirar o vestido das mãos de Emma.
***
Depois das compras, Anaïs e Emma com sacolas na mão voltaram o trecho a pé até a empresa e seguiram para o estacionamento. Guardaram as sacolas no porta-malas e entraram no carro. A morena deu a partida enquanto a ruiva procurava por uma estação de rádio com músicas que as agradassem.
— Coloca na estação de músicas de natal.
Emma assentiu e procurou a estação até encontrar. Recostou-se no assento e ficou observando a paisagem pela janela enquanto observava cantarolava a música tocada pelo rádio.
— “Santa, tell me if you're really there
Don't make me fall in love again
If he won't be here next year
Santa, tell me if he really cares
'Cause I can't give it all away
If he won't be here next year”
— Por que a maioria das músicas de Natal também são sobre amor? — Anaïs ponderou.
— Eu não tenho ideia, mas eu gosto.
— É claro que gosta, é uma romântica incurável.
— E você é uma cética de primeira. — retrucou Emma com uma risadinha.
Anaïs mostrou a língua para a amiga e voltou os olhos para a estrada. Dirigia dentro do limite de velocidade, mas prestando o dobro da atenção, por causa da neve que começava a cair, as estradas ficavam molhadas e tornava mais perigosa a direção.
As ruas eram cercadas por casas, lojas e empresas já fazendo suas decorações de natal, algumas árvores naturais com a neve que caia. Parecia que um cobertor branco havia caído pela cidade.
Não demorou tanto tempo para chegarem até a casa de Emma e assim que a ruiva abriu a porta, o cheiro de gengibre invadiu o nariz de ambas. Elas seguiram para a cozinha e se depararam com biscoitos recém assados.
— O cheiro está tão bom. — disse a morena.
— O gosto está melhor, eu garanto. — disse o pai de Emma ao entrar na cozinha — Podem pegar, é para vocês.
Elas não hesitaram em pegar nem por um momento, o cheiro estava divino, o gosto então era uma explosão no paladar de ambas. O toque levemente ardido do gengibre, com a canela, a noz moscada, o açúcar e o melado de cana juntos formavam um sabor tão incrível que fazia ambas as jovens suspirarem.
— Eu já limpei o calendário, amanhã vou ter o dia livre, vou montar e colocar no seu quarto. — o pai da jovem avisou.
— Papai, o que é o advento e o calendário? — ela questionou.
— Bem, eu vou explicar de forma resumida. A ideia do Natal primeiramente surgiu de Lutero, em dezembro eram comemoradas muitas festas pagãs, e ele pensou que talvez fosse bom fazer a data celebrar o nascimento de Cristo, que, na verdade, acontecia perto de outra festa judaica. Mas Lutero pensou que seria bom mudar o enfoque das festas pagãs, então eles começaram a fazer o advento que era uma preparação para a chegada dessa festa. Eles faziam guirlandas e acendiam velas para se preparar, cada semana tinha um significado que eu não me recordo com tanta clareza. Acontecia durante as quatro semanas antes do dia do Natal.
Emma tinha os olhos vidrados no pai enquanto anotava tudo o que ele contava, Anaïs por sua vez continuava a comer os biscoitos, ainda que gostasse de ouvir aquilo, ela não seguia muitos costumes cristãos ou de religião nenhuma, acreditava que um Deus existia, mas conhecimento era conhecimento e saber sobre a origem do Natal era interessante.
— Bem, e a partir daí as tradições foram mudando ao longo dos anos. Junto com a chegada da prensa, pouco tempo depois surgiu o calendário do advento, era uma preparação também para o Natal, mas com um enfoque menos cristão. Eles começaram a colocar atividades para se fazer em família como: escolher uma árvore, decorar a árvore, fazer uma doação e coisas assim. Inicialmente eram duas folhas, uma grudada na outra em que se abria os dias e tinha o que era para fazer. Com o tempo, passaram a fazer das mais diversas formas. Nosso calendário é de madeira esculpida, por exemplo. E é tudo o que me lembro.
— Já é bastante coisa, e muito interessante.
— Está querendo escrever um artigo sobre isso?
— Aham, tenho até quarta feira para entregar.
— Você vai dar conta. — ele respondeu ao afagar o cabelo da ruiva.
— Desculpe interromper o momento, mas lembrei de algo. Como em todos os anos, vocês estão convidados para a ceia de Natal em nossa casa.
Anaïs tirou dois convites para a ceia de Natal de seus pais e entregou para ambos. Ela adorava arrastar Emma desde que eram crianças, não suportava esnobes mimados que não faziam nada para ajudar o mundo e só esbanjavam dinheiro por aí.
— Pode confirmar que eu e Emma iremos. — ele afirmou.
— E, por favor, convença sua filha a parar de usar vestidos pretos para se esconder das pessoas nos eventos.
— Ela é um caso perdido. — ele comentou.
— Bem, eu realmente preciso ir agora, mas adorei os biscoitos, obrigado. E Emma, nos vemos amanhã, temos a primeira aula juntas, eu passo para te pegar.
— Eu te levo até a porta.
Caminhou com a amiga para a porta de casa e se despediu antes de voltar para a cozinha e ajudar o pai a limpar a bagunça dos biscoitos, uma das poucas coisas que ele realmente sabia cozinhar fora a comida regular.