Finalmente havia chegado o que eu mais esperava durante todo o ano: as férias. Eu gostava da escola, de aprender coisas novas e a professora era tão legal e muito boazinha, mas era tão bom poder brincar o dia inteiro, não precisar fazer lição de casa. Como eu adorava as férias!
Há dois dias havia sido o ano novo, fizemos uma grande festa em nossa casa com meus avós, tios, primos, amigos dos meus pais com seus filhos, tinha muita gente em nossa casa e muita criança também, cerca de umas 10 fora meu irmão e eu, brincamos até não aguentar mais. Adorava essas reuniões de família, eu sempre me divertia bastante, assim como meu irmão.
Era um dia de muita chuva, fizemos uma sessão de cinema em nossa casa, alugamos alguns filmes na locadora e ficamos vendo enquanto comíamos um pouco de pipoca.
- Vem com o papai. - Ele me disse.
Me pegou no colo e eu fiquei um pouco, mas era r**m de ver o filme, pois eu fiquei muito alta, e a TV estava um pouco mais baixa.
- Não quero. - Falei. - Assim fica r**m.
- Eu te ajeito.
Ele me ajeitou em seu colo de um modo mais confortável e eu fiquei. Papai colocou sua mão em minha perna e começou a acariciá-la, logo colocou minha pequena mão em sua perna, segundos depois ele pegou em minha mão e começou a acariciá-la com alguns dedos.
É, o inferno estava mais perto de começar do que eu poderia imaginar.
Eu recém havia dormido, sabe quando você está meio acordada e meio dormindo? Eu estava assim. Ouvi um barulho de porta abrindo, mas nem dei bola, agarrei a Titi, minha ursinha de pelúcia e me virei para o lado oposto ao da porta.
Escutei alguns barulhos de passos, mas nem dei bola. De repente senti alguém me tocar.
- Papai? - Perguntei bastante sonolenta.
- Volte a dormir, querida. - Ele me disse docemente.
Voltei a dormir, mas me acordei um pouco assustada. Escutei passos. Olhei para os lados e não vi ninguém. Apenas notei a porta de meu quarto aberta. A fechei com chave e me deitei novamente e abracei a Titi fortemente. Estava meio assustada, não sabia o que tinha acontecido, se tinha sido um sonho ou não, estava bastante confusa sobre o que eu havia sonhado, mas será que era só sonho? Pouco depois, acabei dormindo.
- Bom dia! - Falei ao pular no colo da mamãe.
- Bom dia, meu amor. - Ela disse. - Como você dormiu?
- Bem, ou quase… - Fiz uma leve pausa. - Tive pesadelo.
- É mesmo? O que você sonhou?
- Ah, nada demais. Já esqueci. - Falei ao descer do seu colo.
Na verdade o sonho estava meio confuso, não conseguia lembrar direito, só depois de algum tempo eu vi que não havia sido um sonho.
Nick e eu estávamos tomando cereais no café da manhã quando papai apareceu na cozinha.
- Bom dia. - Falou papai ao nos dar um beijo.
- Bom dia. - Respondemos.
Ele pegou um jornal e foi para seu quarto ler como fazia todas as manhãs, pois mamãe ficava vendo TV na sala e ele gostava de silêncio na hora de ler seu jornal. Assim que terminei meu café, fui até o quarto de meus pais.
- Oi meu amor. - Disse papai ao esboçar um enorme sorriso.
- Papi, por acaso o senhor esteve no meu quarto essa noite? - Perguntei.
- No seu quarto, querida? Não. Por quê?
- Tive um sonho muito f**o.
- Foi só um pesadelo, meu bem. - Ele disse ao me fazer um leve cafuné.
- Mas a porta do meu quarto estava aberta.
- Deve ter sido o vento. - Sorriu parecendo amigável.
- Verdade… - Falei. - Deve ter sido isso. - Sorri.
A partir desse dia eu passei a custar pra dormir, tinha medo de ter o tal pesadelo novamente, mas não tive.
Março de 2006
Mamãe e Nick haviam saído, eles haviam ido ao supermercado. Papai resolveu ficar em casa e pediu sem parar pra eu ficar lhe fazendo companhia. Acabei ficando, pois achei que poderia ser divertido termos um momento só de pai e filha, achei que a gente fosse brincar de alguma brincadeira legal ou ver um filme, algo assim. E até que brincamos bastante de boneca e de casinha. Porém, em determinado momento, papai cheirou suas axilas e fez careta, me fazendo rir.
- Tô precisando de um banho. - Ele falou. - Você vem comigo?
- Claro. - Falei ao dar um pulo de minha cama.
As vezes eu tomava banho com papai, fazíamos isso desde que eu era muito pequena, as vezes também tomava com mamãe ou com o meu irmão, assim como ele também tomava com papai ou mamãe, meus pais gostavam disso pois falavam que assim economizavam água. Eu nunca me importei até então.
Papai e eu estávamos brincando no banho com alguns dos meus bichinhos infláveis.
- Quer ensaboar o papai? - Ele perguntou.
- Quero. - Falei sem pensar duas vezes.
Comecei a ensaboá-lo. Passei o sabonete em suas costas, nos braços, nas pernas, onde eu alcançava. De repente, ele colocou sua mão em cima da minha e ficou se ensaboando.
- Não quero mais. - Falei.
- Por que, pintinha?
Papai me chamava de ''pintinha'' desde que eu me entendia por gente e meu irmão ele chamava de ''tampinha''. Eu gostava do meu apelido, achava engraçado.
- Porque não. Não quero. - Falei.
- Ok, tudo bem. - Ele disse entre risos.
Fiquei meio cabisbaixa. Aquela situação havia me incomodado mesmo sem eu entender o porquê. Papai pegou com o indicador um pouco de espuma do sabonete e passou em meu rosto. Sorri e fiz o mesmo nele.
E então foi a vez dele me ensaboar, e o que era pra ser apenas um banho, virou o pior de todos os pesadelos.
- Luan, Luna, chegamos.
Era a voz da minha mãe. Senti um grande alívio ao ouvi-la, como se com mamãe em casa, papai não pudesse me machucar, mas eu estava errada, porque ele não ligava pra isso, nunca ligou pro fato de minha mãe estar vendo TV na sala ou do meu irmão estar dormindo no quarto ao lado. As vezes parecia que ele queria que mamãe descobrisse o que ele fazia comigo, e eu queria que ela descobrisse, já que eu nunca consegui contar, só que... Eu também tinha tanto medo que isso acontecesse, porque papai sempre dizia que se mamãe soubesse brigaria comigo e eu não queria isso, e nem conseguia entender o que eu fazia de errado pra ela ficar chateada, pois eu não queria nada daquilo, eu não pedi para papai fazer nada daquelas coisas, eu não queria, eu nunca quis, eu pedia pra ele parar, mas ele nunca parava.
- Estamos no banho, querida. - Gritou meu pai. - Já vamos sair. - Logo se dirigiu para mim. - Escuta, meu amor, você não pode contar nada disso que aconteceu, ninguém acreditaria mesmo e achariam que você está mentindo, e sua mamãe ficaria muito brava com você, meu bem. Você entendeu, filhinha?
Ainda muito assustada e sem conseguir entender o que havia acontecido, eu apenas acenei a cabeça positivamente.
Saímos do banho e papai me vestiu, pois eu ainda não sabia me vestir sozinha. A partir daquele dia pedia só pra mamãe me dar banho e me arrumar, também passei a pedir sem parar pra ela me ensinar a fazer essas coisas, assim papai não precisaria mais me ajudar, porém mamãe disse que eu ainda era muito pequena e precisaria de ajuda por mais um tempo.
Passei também a ter muito medo de papai fazer o mesmo com o meu irmãozinho, mas ele nunca fez, talvez por ele ser menino, na verdade, nunca entendi direito o porquê dele só fazer essas coisas comigo, mas eu ficava feliz por ele não machucar o Nicolá, pois ele era tão pequenininho, bom, eu também era, mas era um ano mais velha que ele, e era meu dever proteger, ou tentar proteger o meu irmãozinho, pena que ninguém me protegeu quando eu mais precisei. Pena que mamãe não estava lá quando eu passava noites em claro chorando e com medo de papai ir em meu quarto como ele passou a fazer quase todas as noites depois que Nick e mamãe dormiam.
Alguns dias haviam se passado. E em certa noite, papai me colocou para dormir, leu a história da Branca de Neve pra mim e logo trancou a porta do meu quarto, e se deitou do meu lado, o que fez eu começar a chorar, já prevendo o que aconteceria nos próximos minutos, queria estar errada. Papai ficou me olhando sem parar e eu passei a ficar nervosa, com a respiração ofegante de tanto medo, pois todo amor que um dia eu senti pelo meu pai havia se transformado em um enorme pavor, e também um pouco de raiva e nojo, pois eu achava tudo tão nojento.
- Eu te amo tanto. - Ele disse ao colocar alguns fios do meu cabelo atrás da minha orelha.
Nunca entendi que tipo de amor era esse, um amor doentio, que não era normal, pois se ele me amasse de verdade como um pai ama uma filha, ele jamais cometeria tais atos, pelo contrário, ele me cuidaria, me protegeria, seria o pai que eu tanto queria ter, o pai que todas as outras crianças tinham menos eu, e não era justo, por que isso tinha que acontecer comigo?