O silêncio parecia um campo minado. Cada segundo em que Isadora não respondia era como se uma bomba prestes a explodir fosse armada entre eles. Jean não a apressava. Observava. Sempre observava.
Isadora umedeceu os lábios, mas não saiu som. A mente dela girava em espiral: fugir? ficar? Qualquer decisão parecia uma sentença de morte.
— Eu… — a voz saiu baixa, quase infantil. — Eu não sei o que escolher.
Jean inclinou levemente a cabeça, como se a analisasse sob uma lupa.
— Não sabe? — repetiu, a entonação fria, calculada. — Isso significa que ainda não entendeu.
— Eu entendi! — retrucou de repente, a emoção explodindo. — Eu entendi que, não importa o que eu faça, eu já perdi! Você me odeia porque acha que matei seu pai de forma encomendada, mas eu não matei! Eu só queria me salvar e vingar a minha mãe, foi autodefesa, mas ninguém acredita em mim!
As palavras saíam trêmulas, mas intensas. As lágrimas escorriam, manchando-lhe o rosto.
Jean não piscou. Não moveu um músculo.
— Emoção não é prova. — respondeu, seco. — Gritos não são evidências.
Ela sentiu como se tivesse levado uma bofetada invisível.
— Então o que você quer de mim? — perguntou, entre soluços. — O que mais eu posso fazer?
Ele apoiou os cotovelos nos joelhos e entrelaçou as mãos, curvando-se levemente para frente.
— No momento, você pode continuar onde os meus olhos alcançam, para responder possíveis questionamentos que eu possa ter sobre a noite do incêndio ou sobre a sua mãe. Até porque, talvez algumas pessoas estejam atrás de você não para se vingar, mas porque você possa ser a pessoa que ameaça algum esquema deles. Eu preciso ter certeza dessas coisas.
Isadora estremeceu.
— Eu não quero ficar aqui.
— Você não tem escolha. — respondeu.
Ela baixou a cabeça, derrotada. O peito subia e descia em ritmo acelerado.
— E se eu errar? Se eu der uma informação errada? — perguntou.
Jean deu um meio sorriso.
— Então eu saberei que está mentindo.
Os minutos seguintes foram um turbilhão. Ele a obrigava a voltar àquela noite em detalhes. Perguntava sobre os corredores, as vozes, até o ranger de portas. Isadora tentava responder, mas cada lembrança vinha acompanhada de um aperto sufocante no peito.
— Você se escondeu na sala das câmeras. — ele retomou, firme. — Quem mais você viu além de Takahashi e de meu pai?
Isadora fechou os olhos, tentando puxar as imagens.
— Havia… homens de preto. Uniformizados. Não sei se eram seguranças ou… carcereiros. Eles tocavam e invadiam a minha mãe de formas completamente nojentas e sem dignidade, mesmo depois que ela estava aparentemente sem vida.
Jean a observava com atenção, mas sem compaixão.
— E você nada fez.
— Eu era uma criança! — gritou, com raiva súbita. — O que você queria que eu fizesse? Eu só tinha quinze anos! Eu fiz a única coisa que eu poderia fazer, queimei aquela m***a de mansão.
O silêncio dele foi mais c***l que qualquer resposta.
Ela engoliu em seco, o corpo tremendo.
— Eu m*l consegui despistar aquelas pessoas e fugir para a sala de câmeras. Provavelmente eu deveria ter tido um fim igual ou pior o da minha mãe. — murmurou. — Tentei puxar fios, tentei criar o incêndio. Foi a única coisa que consegui.
Jean se inclinou para trás, os olhos semicerrados.
— E conseguiu m***r meu pai.
— Sim! — o grito saiu como um soluço. — Eu não sei qual o envolvimento do seu pai com isso tudo, mas ele era umas das pessoas que estava a caminho daquela sala, então para mim ele pode queimar no inferno que será pouco.
Por um instante, as palavras dela ecoaram no quarto, mas Jean não se moveu. Então ele segurou ela pelo queixo e encarou os seus olhos enquanto ela ofegava cheia de ódio. Ele então soltou com um movimento brusco fazendo com que seu rosto virasse e respondeu:
— A verdade ainda precisa ser provada. — fez uma pausa — Até o momento, você é uma assassina, enquanto não há provas concretas de que ele assassinou uma mulher inocente.
Horas se passaram. O interrogatório parecia não ter fim. A cada detalhe, Jean escrevia mentalmente um mapa da mansão, cruzando memórias com informações que já possuía. Isadora, por outro lado, estava exausta, a voz rouca, os olhos vermelhos.
Quando o relógio marcou quase madrugada, Jean se levantou.
— Basta por hoje.
Ela ergueu os olhos, suplicantes.
— E agora? — perguntou. — Vai decidir o que fazer comigo?
Ele caminhou até a janela, cruzando os braços.
— Quem vai decidir é você. — respondeu. — Mas saiba que minha raiva não desapareceu. Ela foi cultivada por anos, regada a cada lembrança do corpo do meu pai sendo devorado pelo fogo. — virou o rosto, encarando-a de soslaio. — Você acha que uma noite de lágrimas vai apagar isso?
Isadora engoliu em seco.
— Então… não confia em mim.
— Não. — disse, sem hesitar. — Não confio. E talvez nunca confie.
Ela se encolheu, como se o peso daquelas palavras fosse insuportável.
Mas então, Jean deu um passo em direção à cama.
— Mas… — a palavra ecoou no ar. — Estou disposto a refazer os passos. A reabrir cada ferida. Porque se eu estiver enganado, se minha vingança tiver sido construída sobre areia… então preciso saber.
Isadora o olhou, confusa, lágrimas escorrendo.
— E… se for isso? — perguntou. — Se tudo for mentira?
Ele parou diante dela, tão próximo que ela podia sentir o calor do corpo dele.
— Então você vai viver. — respondeu, frio. — Mas se não for… você vai morrer.
O ar ficou denso. Isadora tentou falar, mas não havia palavras.
Jean se endireitou, a sombra dele projetando-se sobre ela.
— Escolha, Isadora. — disse, cada sílaba carregada de veneno. — Ficar comigo, sob meu controle, enquanto reconstituímos cada passo… ou sair por aquela porta e ser caçada por monstros muito piores que eu.
Ela hesitou, os lábios tremendo.
— Sinceramente Moretti, se você acredita que eu e minha mãe fomos mandadas para destruir sua família, você está enganado. Se é nisso que você acredita e se é nessa verdade que você se prende, você é apenas poderoso, tem recursos, mas é um grande i****a. É muito óbvio que o seu pai e esses homens que andavam com ele abusavam de pessoas sem família como a minha mãe e eu. Pessoas que não tem nada, nem ninguém, desamparadas e sensíveis. Mas quem faz isso tem um nome, são chamados de covardes, inescrupulosos, porque não tem coragem de fazer nada contra alguém do tamanho deles ou mais forte - ela fez uma pausa para respirar enquanto continuava a cuspir - as únicas pessoas que eles conseguem ameaçar são pessoas mais fracas. E você está se mostrando ser uma cópia legitima desse covarde.