O primeiro despertar foi abrupto. Isadora abriu os olhos e a luz filtrada pelas cortinas translúcidas fez sua cabeça latejar. O quarto era diferente de tudo que ela conhecia: amplo, elegante, com móveis de madeira escura polida, tapetes espessos e uma cama grande, mas ainda assim… frio. Nada ali era convidativo; tudo parecia calculado para lembrá-la de que não pertencia àquele espaço.
Sentou-se lentamente, apoiando as mãos na beira da cama, sentindo a musculatura dolorida. A respiração vinha curta, o coração ainda disparado. O silêncio era absoluto, exceto por um zumbido distante, quase imperceptível. Mas ela sabia que estava sendo observada.
Cada detalhe parecia significativo: a porta pesada, trancada, sem maçaneta visível; uma câmera discreta no canto do teto, a lente refletindo a luz da janela; uma bandeja de prata com comida intacta ao lado da cama, como se a tivesse colocado ali apenas para lembrá-la de que a vida não lhe oferecia escolha.
Ela tentou se levantar, aproximou-se da porta, tocou a maçaneta fria. Nada. Trancada. O estômago embrulhou. Tentou abrir as janelas: fechadas. O ar era pesado, como se a própria liberdade tivesse sido arrancada dela.
— Ótimo. — murmurou para si mesma, os dentes cerrados. — Mais um lugar para me aprisionar.
Olhou para a bandeja. Um prato de frutas cortadas, pães e uma pequena garrafa de água. Tudo impecável. Tentou se aproximar, mas a sensação de estar vigiada era sufocante. Cada movimento era sentido antes mesmo de acontecer. Colocou a mão sobre a fruta, hesitou, e recuou. Como se tocar a comida fosse admitir derrota.
Sentou-se no chão, encostando as costas na cama. Tentou pensar. Estratégia. Fuga. Alguma saída. Mas quanto mais pensava, mais sentia o peso do quarto, do silêncio, da própria impotência.
O tempo passou sem qualquer referência. Ela olhou para o relógio de parede, mas ele marcava horas genéricas, como se a noção do tempo também estivesse sendo arrancada dela. Cada minuto se estendia como um fio de chumbo.
Fechou os olhos e respirou fundo, tentando organizar pensamentos que vinham e iam, como ondas quebrando violentamente. Lembrou-se do carro preto, da torre, da sensação de querer desaparecer, e da mão dele interrompendo sua queda. Ele estava sempre alguns passos à frente.
A primeira hora foi a pior. Sentiu vontade de gritar, mas não sabia se alguém ouviria. Talvez nem se importassem. Talvez fosse exatamente isso que esperavam: que ela desistisse mentalmente antes mesmo de tentar se mover.
Depois de algum tempo, começou a andar pelo quarto. Cada passo ecoava no tapete grosso, um som abafado, mas que ainda assim parecia gritante na quietude. Experimentou todas as portas, gavetas, prateleiras. Nada se mexeu, nada se abriu.
Sentou-se novamente, encostou a cabeça na parede e respirou fundo. Pensou em memórias de Winchcombe, do restaurante, dos rostos felizes que ela via todos os dias. Era quase doloroso lembrar. Uma vida simples, tranquila, segura… agora tão distante que parecia um sonho de outra pessoa.
— Eu não posso ficar aqui. — murmurou, a voz apenas um sussurro. — Não vou.
Mas como sair? Cada parede parecia sólida como ferro. Cada canto do quarto estava pensado para sufocá-la, para lembrá-la de que aquela era uma cela, não um quarto.
Sentou-se de novo na cama, observando a janela. A luz mudava lentamente, indicando que horas se passavam. Não podia se distrair, não podia perder o foco. Tentou planejar cada movimento: testar a porta, esperar um descuido, descobrir alguma fraqueza.
Enquanto isso, a comida permanecia intacta, a bandeja um lembrete silencioso de sua impotência. Tentou ignorar, mas o cheiro de pão fresco e frutas despertava algo em seu corpo que não queria admitir: fome. Precisava comer para ter força. Precisava sobreviver.
Olhou para a água e pegou a garrafa. O líquido estava gelado, trazendo uma pontada de alívio. Engoliu em grandes goles, sentindo a garganta arder. Um lembrete de que ainda estava viva. Mas o simples ato de beber trouxe de volta o medo de ser observada, de que cada respiração, cada movimento, estava registrado.
Tentou fechar os olhos, pensar em qualquer coisa que não fosse o quarto, o silêncio ou ele. Pensou na mãe, nas ruas de paralelepípedos de Winchcombe, nas cores das flores nas janelas. Mas o pensamento mais persistente era o dele. O homem do café, com o olhar que perfurava até a alma.
E se aparecesse agora? O simples pensamento a fez estremecer. A sensação de que ele poderia estar na porta, ou observando pela câmera, ou prestes a entrar sem aviso… era sufocante. Ela respirou fundo, tentando manter a calma. Mas a ansiedade era um nó em sua garganta.
Passaram-se horas. Ela não sabia exatamente quantas, mas cada minuto parecia eterno. O corpo cansado pedia descanso, mas a mente se recusava. Ela não podia se render. Não agora.
Finalmente, ouviu o som discreto de passos no corredor. O coração disparou. Tentou controlar a respiração. O som se aproximava, cadenciado, pesado. Ele entrou. Nem uma palavra. Apenas a observou. Silencioso, imponente.
Isadora se levantou rapidamente, tentando parecer firme, mas a presença dele era esmagadora. O ar parecia ter se tornado mais denso, mais difícil de respirar. Ele parou a poucos metros dela. Não falou. Apenas olhou. Pesou. Avaliou.
— Então é assim que você passa seu tempo. — murmurou ela, quebrando o silêncio, tentando provar coragem. — Sentada, pensando em fugir.
Ele não respondeu. O silêncio dele era mais c***l do que qualquer palavra. Ela percebeu que cada olhar carregava julgamento, interesse e algo que ela não conseguia definir.
— Eu não vou ceder. — disse finalmente, firme. — Posso estar presa, mas não vou me dobrar.
Ele apenas inclinou a cabeça, como quem apreciava o espírito dela. A proximidade dele era desconcertante, cada movimento controlado, cada gesto calculado. Ela sentiu medo, raiva e, de forma irritante, algo mais difícil de nomear.
Ele se afastou lentamente, caminhando até a janela e olhando para fora, sem tirar os olhos dela. A postura dele dizia mais do que palavras poderiam: "Você está sob meu controle, e sabe disso."
Isadora respirou fundo, tentando recobrar o próprio espaço. Sentou-se na cama, encostando-se na cabeceira. O silêncio voltou, mas agora pesado com a presença dele. Ele estava ali, e não precisava falar para que ela sentisse que não havia escapatória.
Ela fechou os olhos, respirou fundo e tentou pensar: uma hora ou outra, ele terá que sair. Uma hora ou outra, vou encontrar um jeito. Mas naquele momento, só restava esperar, observando os detalhes do quarto, as sombras nos cantos, cada objeto que poderia ser usado em sua fuga.
E enquanto o silêncio se prolongava, ela percebeu que aquela prisão não era apenas física. Era mental. Ele a deixara sozinha por horas apenas para que sentisse isso. O medo, a ansiedade, a sensação de impotência — tudo fazia parte do jogo.
Ela passou a noite acordada, em claro, os olhos fixos na porta, esperando qualquer movimento, qualquer som. Cada ranger do piso, cada eco de passos distantes fazia o coração disparar. A cama era dura, o corpo cansado, mas a mente insone. Ela não podia dormir. Não podia relaxar. Cada minuto de silêncio era um lembrete de que estava sob observação.
E no fim, quando o cansaço começou a vencer, ela percebeu algo mais profundo: o que sentia por ele era uma mistura confusa de medo, ódio e… fascínio. Um sentimento que a aterrorizava tanto quanto o próprio c*******o.
Ela se encolheu na cama, tentando controlar a respiração. E, mesmo sem vê-lo, mesmo sem uma palavra, sabia que ele ainda estava ali, observando. Pesando cada movimento, cada pensamento. E isso, mais do que qualquer ato de violência, era o que realmente a deixava presa.